Pesquisa e Documentação
Estudo sobre as línguas africanas
Dois trabalhos – um do século XVII e outro do século XVIII – registram dados importantes sobre a sobrevivência de línguas africanas no Brasil:
I- A Arte da lingua de Angola, oferecida a Virgem Senhora N. do Rosário, Mãy e Senhora dos mesmos Pretos, pelo P. Pedro Dias da Companhia de Jesus, publicada em Lisboa em 1697, de 48 páginas, é a gramática da língua quimbundo – a primeira sobre essa língua – elaborada a partir da observação da língua utilizada em Salvador pelos escravos oriundos de Angola. Acredita-se que esses seriam numerosos, pois o Padre Vieira afirmava que, nos anos 1960, havia 23.000 escravos africanos catequizados na língua de Angola. Esta gramática destinava-se a facilitar o trabalho dos jesuítas que lidavam com os negros, com o objetivo de facilitar-lhes o aprendizado dessa língua, visto que não havia ainda nenhuma gramática sobre o quimbundo.
II- Lingoa gªl de Minna, traduzida ao nosso Idioma, por Antonio da Costa Peixoto, Curiozo nesta Siencia, e graduado na mesma faculdade: E.º - é o título que aparece no frontispício do manuscrito Obra Nova da Língua Geral da Mina, redigido em Ouro Preto, em 1731/1741, por Antonio da Costa Peixoto. Esse documento retrata uma situação lingüística particular, resultante da concentração, no quadrilátero mineiro de “Vila Rica - Vila do Carmo - Sabará - Rio dos Montes”, de 100 000 escravos, originários da costa do Benim (designada “Mina” e situada, grosso modo, entre Gana e Nigéria). Essa situação deu origem a um falar veicular tipologicamente próximo das línguas africanas dessa mesma costa. Atualmente, as línguas faladas na região de origem dos escravos estão classificadas no subgrupo “gbe”, do grupo “kwa”, da família Níger-Congo. Nesse subgrupo há uns 50 falares, dos quais os mais conhecidos são o ewe, o fon, o gen, o adja, o gun e o mahi. O manuscrito de Antonio da Costa Peixoto foi redigido com a intenção de facilitar aos senhores de escravos o aprendizado da língua utilizada nas minas. O século XIX não nos oferece uma documentação especificamente lingüística como a dos séculos precedentes, mas confirma dois fatos: a existência de um plurilingüismo africano, sobretudo em Salvador. Nina Rodrigues coletou uma lista de 122 palavras de cinco línguas africanas diferentes, faladas na época em Salvador: “grunce” (gurunsi), “jeje (mahi)” (ewe-fon), “haussá”, “kanúri” e “tapa” (nupe). A respeito do “nagô ou yoruba” afirma ser a língua mais falada na Bahia “tanto pelos velhos africanos, de todas as origens, quanto por um grande número de crioulos e de mestiços” (1977: 132). Destaca o fato de que o nagô é a língua religiosa do culto “jeje-yoruba” (candomblé) e reproduz três cânticos com tradução (Bonvini e Petter, 1998: 76).
Maria Onice Payer