A palavra praça sofreu nas últimas décadas os efeitos das transformações urbanas. Deixando de significar de modo predominante um lugar de passeio, de encontro, de contemplação, tal como ocorria com muitas das praças brasileiras, elas se tornaram lugar de “circulação” em meio ao crescimento urbano. As duas primeiras acepções do dicionário Aulete Digital parecem indicar isso. Na primeira, temos a tradicional praça que evoca uma memória de formação das cidades e de períodos de auge da convivência e contemplação no espaço público: “Espaço público, ger. com assentos, coretos, plantas ornamentais etc., destinado ao lazer e ao descanso; jardim público”. Na segunda acepção, desaparecem os atrativos de natureza, sociabilidade e lazer e surge uma praça esvaziada, apenas rodeada de edifícios: “Espaço público cercado de edifícios”. A praça se tornou mais recentemente um espaço de “circulação”, de “pedestres”, em oposição ao espaço dos “veículos”.
Com movimento nas ruas e abertura de avenidas, o acesso às praças ficou mais restrito. Criaram-se praças em balões, em entroncamentos, em canteiros de avenidas, espaços instáveis entre lugar de passeio e lugar de circulação, ou somente uma paisagem urbana em meio ao trânsito.
Além disso, os acontecimentos de praça se ampliaram. A praça está sujeita à correria do dia a dia, à indiferença, a acontecimentos inusitados. Encontram-se reuniões momentâneas, rodas de conversa, propagandas, discursos, pregações, performances. A falta do Estado e a violência urbana marcam outras práticas: desempregados, pedintes, furtos, moradores de rua, camelôs, trabalho informal, etc. O policiamento é visto ora como ausente ora como ostentatório.
Além da praça contemplativa e da praça de circulação, há hoje em dia uma série de tipos de praça, dentre as quais podemos mencionar: a praça seca, que se assemelha ao antigo largo (um espaço amplo, aberto, calçado, sem jardins, de transeuntes e aglomerações), porém com características contemporâneas e que por vezes abrigam multidões; as praças históricas, com informações turísticas e culturais; as praças adotadas em parceria entre público e privado; as praças comunitárias que constroem identidades sociais; as praças de alimentação nos shopping centers.
Com a fragmentação espacial, as praças se apresentam de diversos modos no tecido urbano. As referências cívicas deixararm de ser onipresentes e se desgastaram. Enquanto isso, configurou-se uma ampla diversidade social, comunitária, associativa. E entre essas duas tendências, encontram-se os sinais dos excluídos, dos nômades, dos trecheiros, dos moradores de rua, dos pichadores, na tensão dentre a organização e a ordem da cidade.
Bibliografia
NUNES, J. H. Praças Públicas na contemporaneidade: história, multidão e identidade. Cadernos de Estudos Linguísticos, Campinas, 53(2): 157-168, Jul./Dez. 2011.
AULETE DIGITAL – O DICIONÁRIO DA LÍNGUA PORTUGUESA. Disponível em: http://www.aulete.com.br/ru%C3%A3o#ixzz3UbUoZwXK. Acesso em 17 de março de 2015.