A cidade brasileira tornou-se em grande medida o que se tem chamado de “cidade para o automóvel”, visto que seu espaço se organizou predominantemente para abrigar o transporte rodoviário, especialmente os carros. Com isso, os pontos de encontro e de convivência foram preteridos ou delimitados diante da “circulação de veículos e pedestres”.
O sinaleiro (também chamado de sinaleira ou semáforo) é um local afetado por essa conjuntura urbanística. Além de sinal de trânsito, o sinaleiro se transformou em um espaço de contato entre os motoristas, incluídos nessa concepção de cidade do automóvel, e os que estão excluídos dela, a saber, os transeuntes, os vendedores ambulantes, os artistas de rua (palhaços, malabares, acrobatas, etc.), os pedintes, os desempregados, os trabalhadores informais, os moradores de rua, etc. É um contato rápido mas frequente, que faz parte do cotidiano dos sujeitos urbanos.
No dicionário Aulete Digital, o sentido de sinaleiro se limita a sua existência técnica e sua função de organização do trânsito: “Aparelho de sinalização instalado nas ruas, rodovias ou ferrovias para orientar o tráfego“ (AULETE DIGITAL, 2015). O verbo “instalado”, assim como o sintagma “orientar o tráfego” marcam a posição do urbanista que instala nas vias públicas os dispositivos de controle do trânsito. E o verbete pára por aí, não são considerados os acontecimentoo sociais que indicam o modo de os sujeitos utilizarem aquele espaço na atualidade. Também não se apresentam os sentidos que daí resultam, como diversão, curiosidade, passa-tempo, mas também ansiedade, apreensão, medo, já que em certas condições esses lugares são tidos como perigosos, sujeitos a abordagens tensas ou violentas, com ameças e furtos.
Há desse modo um batimento entre um contato que se torna familiar em sua informalidade, ou que suscita incômodo da parte dos motoristas. Assim como o viaduto e outros espaços que não foram projetados para acollher os sujeitos que ali se encontram, é um jogo entre a organização e a ordem da cidade, entre o imaginário das intervenções urbanas e o real da cidade que se manifesta de modo imprevisível. No discurso capitalista, a aceitação ou não dos sujeitos nesses locais se direciona para o sentido de um serviço prestado (“trabalho” e não “pedido de esmola”, “estou trabalhando e não roubando”, etc).
Bibliografia
AULETE DIGITAL – O DICIONÁRIO DA LÍNGUA PORTUGUESA. Disponível em: http://www.aulete.com.br. Acesso em 17 de março de 2015.