Nessa conjuntura, temos como memoráveis nomes de estados brasileiros que fazem divisa com Mato Grosso, como Goiás, Amazonas; estados nordestinos, como Bahia, Sergipe, Pernambuco e Ceará; estados do sudeste, como São Paulo e Minas Gerais, estados sulistas, como Paraná e Rio Grande do Sul, e o próprio estado de Mato Grosso. Esses nomes homenageiam os estados dos migrantes que se instalaram no município de Pontes e Lacerda e no ponto de vista semântico esses nomes constituem uma dispersão de sentidos nas enunciações em que são ditos.
Segundo relatos de moradores antigos de Pontes e Lacerda, anteriormente à chegada da CODEMAT que, para urbanizar o espaço buscou identificar as vias e nomeou-as com nomes de estados brasileiros, as localizações eram feitas por referências às famílias que ali residiam, na maioria das vezes, predicadas pelo gentílico que identificava o Estado de onde vieram como Rua dos Mineiros. Não temos registro formal que comprove que tal nome existiu, mas se considerarmos as informações a partir do discurso cotidiano de moradores antigos da cidade, nos parece um fato curioso a se observar: O nome Rua dos Mineiros, por exemplo, constituído de sintagma preposicionado, se dá a partir de enunciação descritiva, ou seja, aponta que há uma rua onde os emigrantes mineiros se instalaram na cidade de Pontes e Lacerda, rememorando a origem desses brasileiros. O nome, ao produzir efeito descritivo, funciona a partir de categorias de ‘brasilidade’ (mineiros, goianos). No entanto, o que temos materializado e funcionando como nomes de ruas e avenidas são os nomes de estados brasileiros.
Diante disto, percebemos que embora os nomes dados pelo discurso administrativo se apresentem esvaziados do efeito descritivo, recortam como memoráveis os estados brasileiros. É interessante notar aí que, mesmo com a passagem de estrutura morfossintática dos nomes, permanece a memória do movimento de migração. Isto aponta indícios para o funcionamento de um sítio de significação que afeta o modo como o sujeito (se) identifica o/no espaço urbano de Pontes e Lacerda. A noção de cena enunciativa possibilitará dar mais visibilidade a essa questão.
Quando falamos em cena de enunciação estamos tratando do acontecimento de linguagem e seu agenciamento. Nas palavras de Guimarães (2005, p. 23), “uma cena enunciativa se caracteriza por constituir modos específicos de acesso à palavra dadas as relações entre as figuras da enunciação e as formas linguísticas”. O autor define figuras de enunciação como configuração do agenciamento enunciativo. “Sãolugares constituídos pelos dizeres e não pessoas donas de seu dizer”(idem, p.23).