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Labeurb disponibiliza Fundo Michel Pêcheux
01/11/2006

O Laboratório de Estudos Urbanos da Unicamp tem no seu Centro de Documentação Urbana (CEDU), entre os documentos de que dispõe, o Fundo Michel Pêcheux. Ele está em fase final de organização, mas já está à disposição dos pesquisadores interessados.

A Coordenadora do Laboratório de Estudos Urbanos, Profª. Drª. Eni Orlandi, idealizadora do CEDU e do Fundo Michel Pêcheux, concedeu a este espaço uma entrevista em que coloca pontos fundamentais para aqueles que procuram saber algo mais a respeito do Fundo Michel Pêcheux.

Pergunta 1 : Qual a importância para os pesquisadores da Análise de Discurso terem à disposição um acervo com obras Michel Pêcheux e sobre ele reunidas na forma de um Fundo?

Profª. Eni : Como Fundo, ele tem duas funções importantes: uma é relativa ao fato de que Pêcheux é o fundador de uma forma de Análise de Discurso que, para mim, é a forma mais interessante e que realmente tem se mostrado mais significativa, porque consegue arregimentar dentro da história da lingüística conhecimentos que já estavam estabilizados. Ela arregimenta esses conhecimentos mas ao mesmo tempo desestabiliza, propondo outras coisas que são novas e produz uma certa ruptura nesta história, mas uma ruptura que não é uma ruptura cega, ou seja, é uma ruptura que não deixa de levar em conta aquilo que foi produzido e discute com isso que foi produzido. Então é uma forma interessante de Análise de Discurso essa que ele faz. E por que eu digo que ele é o fundador dessa A.D., e por que, ainda, eu vejo importância nisso? É que anteriormente não houve nenhuma teoria lingüística que se preocupasse com a teoria do político e da ideologia, e Pêcheux faz isso, quer dizer, ele introduz claramente isso. O corte que ele faz, em relação às teorias existentes, é introduzir, no confronto do simbólico com o político, e isso é muito importante, o tratamento da questão da ideologia. Esta forma de trabalhar a linguagem é fundamental para tratar a questão do espaço urbano, como um espaço social que significa justamente no confronto do simbólico com o político. Então, na verdade, trata-se da importância de se ter um Fundo como este, em sua função teórica e enquanto homenagem a esse autor que faz um trabalho tão importante dentro da História das Idéias Lingüísticas. O segundo ponto, e aqui trata-se de uma importância prática, é justamente tornar disponível num único lugar, e organizado de uma determinada maneira, toda uma obra que é tão significativa como acabei de dizer. Fica à disposição dos pesquisadores em geral e é isso que a gente está organizando. Por outro lado, por que a importância do Fundo? Porque é um Fundo que reúne as obras de Pêcheux e trabalhos que são feitos dentro da área, sobre ele e também sobre a A.D. Então, é uma questão que nós chamamos de arquivo que estará preparado em um outro arquivo, que os pesquisadores podem consultar e se mobilizar bem dentro dele, da maneira que quiserem. Ainda fará parte desse Fundo, mas isso futuramente, textos inéditos de Pêcheux que me foram dados pela esposa dele e que ainda não disponibilizei. Estou aguardando que ela me dê o sinal verde para que eu os coloque à disposição das pessoas. Na verdade, esses inéditos não são exatamente textos, são anotações de trabalho feitas por ele, em papéis esparsos etc, e que podem ser interessantes para quem quiser trabalhar na gênesis dessa discursividade da ciência que ele vai estabelecer, elaborar.

Pergunta 2 : Dentre as obras de Pêcheux, que fazem parte do acervo do CEDU, quais as que você destacaria como sendo fundamentais para os interessados na Análise de Discurso?

Profª. Eni : São várias. Quando eu vejo a relação do que nós temos organizado deve ser lembrado que existem mais textos que estamos procurando conseguir, e que já temos alguns que estão em processo de organização. Sendo assim, eu não citaria um nome específico de sua obra, porque ele era um autor, vamos dizer, em processo, sabia que a ciência não se produz de uma única vez, em cada texto ele retoma coisas, mas também acrescenta, portanto é difícil você encontrar um texto que já tenha tudo e seja esse o mais importante. Acredito que exista um percurso que Pêcheux faz que é interessante e que eu começaria dizendo que se inicia com a crítica à psicologia social. Existem textos, por exemplo, como “A Psicologia Social: uma utopia em crise”, que eu vejo como fundamental. É um texto pouco lido porque circula pouco no Brasil, mas que também está disponível no Fundo. É por isso que eu acho que há interesse para o Fundo ter textos desse tipo, e esse é um dos que eu acho importantes, porque Pêcheux começou justamente a reflexão dele questionando a noção de sujeito, como ela era tratada na psicologia e pensando a psicologia social. Esse é um desses discursos de origem, vamos dizer, da reflexão, se é que se pode dizer da origem da reflexão, é um dos textos originais e que têm muita importância. Outra coisa são textos que vão tratar dos fatores sócio-econômicos e a relação que eles têm ou deixam de ter com a questão da linguagem, com a questão discursiva. É outro tipo de trabalho que também é muito bem feito por ele, porque não se passa diretamente, isso seria uma caricatura, da questão econômica para a questão discursiva, como se o discurso fosse um reflexo direto das questões econômicas. O que dizemos tem a ver com a questão destes fatores sócio-econômicos, mas isso de uma maneira muito indireta porque é a relação simbólica que a gente tem com isso. Sendo assim, eu citaria um trabalho dele com a Claudine Haroche chamado “Fatores sócio-econômicos e resolução de problemas”. Na mesma direção, pensando a questão do simbólico e a questão política, social e econômica, há um outro texto que nós temos e que também é de pouca circulação chamado “Posição sindical e tomada de partido nas ciências humanas e sociais”. Esse é muito interessante. Por quê? Porque ele vai mostrar essa relação que não é tão direta e aí pensando o político, que é a posição sindical. E por quê eu acho interessante as pessoas lerem isso? Porque são textos que não são teóricos e científicos e que são políticos sem ser militantes. Portanto, ele não coloca aí uma questão de militância, mas faz um trabalho crítico em relação a essa questão. Podemos agora entrar diretamente nos discursivos, por exemplo, “Efeitos discursivos ligados ao funcionamento das relativas em francês”, que é um texto que trata a questão lingüística e o discurso de uma maneira mais direta ligada à questão da língua, mas passa por questões que estão sendo hoje muito trabalhadas dentro da História das Idéias Lingüísticas, o que ele já fazia, por exemplo, no livro dele com a F. Gadet chamado “La langue introuvable” que nós temos aqui, traduzido para o português e que se chama “A língua inatingível”. É um livro que é todo sobre estas questões das H.I.L.. É importante lembrar que existe um outro texto sobre isso, que é menos conhecido e que nós temos no Fundo e por isso sua importância, ter não só aqueles que são mais conhecidos, mas outros, como também “Pesquisa sobre o discurso iluminista no século XVIII” que Pêcheux escreveu com G. Gayot. É interessante porque é uma abordagem discursiva feita sobre esse tipo de problema. Finalmente é preciso lembrar que ele atinge desde o nível da relação com a língua, da relação com questões econômicas, da relação com o problema político, da relação ideológica, o tratamento ideológico destas questões e discursivamente até as questões da H.I.L. e acima disso questões epistemológicas, como por exemplo, seu trabalho inicial “Reflexões sobre a situação teórica das ciências sociais especialmente da psicologia social”. Esses são estudos epistemológicos, mas há também um livro com M. Fichant, sobre questões de epistemologia e que trata sobre a filosofia da ciência. É um amplo espectro que está abrangido dentro do nosso Fundo, onde dispomos de exemplares de todas essas variedades de textos.

Pergunta três : Qual o papel que o CEDU exerce na Universidade ao criar um fundo como o Fundo M. Pêcheux?

Profa. Eni : Na verdade, é a valorização dos Centros e Núcleos ao lado dos Institutos. Sabemos que os Institutos têm suas bibliotecas e seus centros de documentação. No entanto não era o caso dos Núcleos. Agora este aspecto importante da organização da pesquisa estende-se também para eles. E aí não posso deixar de citar o Centro de Memória da Unicamp (CMU). A importância do CEDU é que nele existe um Fundo especializado, como esse do Pêcheux, que é o criador de uma disciplina que não existia antes e que nós temos um Fundo que dá acesso aos pesquisadores da própria Universidade a textos que têm a ver justamente com a institucionalização, que só se dá quando existem instituições como a Unicamp trabalhando com projetos criativos e originais em relação à maneira como se faz ciência no mundo todo. Na Unicamp temos um lugar específico que são os Centros e Núcleos para cuidar desses assuntos. Sendo assim, você ter à disposição num Centro, um fundo de textos que serve como um fundo de pesquisa, para servir não só a Unicamp mas também a outras Universidades, sem dúvida é um exemplo a ser seguido. Para dizer isso de uma maneira mais clara é que, ao criarmos um Fundo como esse, criamos dentro da Universidade um olhar para esse lugar. Um lugar que mostra não só que produzimos coisas mais imediatas em relação à questão das cidades, estamos no Laboratório de Estudos Urbanos, mas que no nosso Centro de Documentação temos também um fundo que documenta e serve de arquivo para estudos sobre isso que estou dizendo, ou seja, uma disciplina que é uma disciplina diferente criada no século XX e que trouxe um olhar renovador para dentro da lingüística, uma ciência já bem estabelecida. Michel Pêcheux traz elementos para podermos desenvolver novas reflexões sobre a questão das ciências da linguagem. Termos um fundo desses é um privilégio que está disponível não só para a Unicamp como também para qualquer pesquisador que queira consultar o Fundo.


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