Revista Rua


A deriva de sentidos de "Terra da luz" no pós-governo mudancista: Uma análise do vídeo Ceará, terra da luz
The drifting of meanings of "Terra da Luz" in the post-changing government: an analysis of the video Ceará, Terra da Luz

Aline Maria Freitas Bussons

Você não faria a menor falta/
Num dia de domingo no Beach Park
Falcão, “Um bodegueiro na FIEC”.
Introdução
Em 1987, assume o governo do estado do Ceará, Tasso Ribeiro Jereissati. Apoiado pelo Centro Industrial do Ceará (CIC), o novo governador, munido da imagem de jovem bem sucedido empresário, com “amor à causa pública”, inaugura uma reforma político-administrativa com bases neoliberais, especialmente, no tocante à preocupação com uma austeridade financeira e fiscal; ao estreitamento da relação estado-economia e à afirmação do setor público como indutor de investimento. Estas são as diretrizes essenciais dos autodenominados “governos das mudanças”, iniciados na eleição de Tasso Jereissati, em 1986, e prolongados quatro anos mais tarde com a eleição de Ciro Ferreira Gomes, liderança que – a despeito de algumas singularidades – também, erigia seu carisma sob a égide de discursos que exaltavam juventude, modernidade e eficiência.
Uma das ações mais contundentes dos governos mudancistas é o investimento na indústria turística como propulsora de desenvolvimento econômico. Sendo o investimento no setor compreendido enquanto política pública de desenvolvimento, o estado deveria ser o grande incentivador do turismo, gerando empregos e, supostamente, diminuindo a pobreza. A propaganda turística do Ceará, neste contexto (justificada para atrair fluxos e recursos), aparece de maneira marcante, em escala nacional e internacional. O estado adota uma política de marketing que denomina Fortaleza “A cidade do sol”. Aliás, na referida política, o sol, associado ao mar, passa a constituir um dos maiores atrativos do estado. Se, tradicionalmente (desde os finais do século XIX), o sol foi um tirano que castigava o cearense, durante os períodos de seca, após a era Jereissati, ao contrário, se tornara simpático, acolhedor, além de sorrir e usar óculos escuros[1].
As investidas publicitárias dos “governos das mudanças” modificam, definitivamente, a imagem do Ceará para o Brasil e para o próprio Ceará. O chão rachado, o sol que castiga, a falta d’água das oligarquias algodoeiras dão lugar às dunas brilhantes e ao sol iluminador dos jovens empresários[2]. A questão é que a imagem do


[1] Logotipo do parque aquático Beach Park.
[2] Ainda em 1967, Luiz Gonzaga canta, para o Brasil, a “Súplica cearense”: “Meu Deus, perdoe eu encher os meus olhos de água/ E ter-lhe pedido cheinho de mágoa/ Pro sol inclemente se arretirar”. E mais adiante: “Desculpe eu pedir pra acabar com o inferno/ Que sempre queimou o meu Ceará”. Já em 1994 (para se ter uma percepção mais clara do marketing mudancista), a Rede Globo exibe a novela “Tropicaliente”, com cenário no Ceará. Dunas, passeios de bugre e um sol brilhante são exibidos diariamente na novela das sete. A propósito, o governo do estado apoiou a realização da telenovela sob a condição de que se fosse mostrada a infraestrutura turística do estado (Gondim, 2007: 418) . Tratava-se, portanto, de uma novela-propaganda.