Revista Rua


A deriva de sentidos de "Terra da luz" no pós-governo mudancista: Uma análise do vídeo Ceará, terra da luz
The drifting of meanings of "Terra da Luz" in the post-changing government: an analysis of the video Ceará, Terra da Luz

Aline Maria Freitas Bussons

sertão, articulada à fome e à morte, como na música “Aguapé” (1980)[8]: “aqui os mortos são bons/ pois não atrapalham em nada/ pois não comem o pão dos vivos/ e não ocupam lugar na estrada”. Já em 1991, na transição entre os primeiros governos das mudanças, início da gestão Ciro Ferreira Gomes; Fagner aparece pela primeira vez na capa de um LP (“Pedras que cantam”) sentado em uma jangada (antes Fagner aparecia com um chapéu de couro, muitas vezes, ao lado de Luiz Gonzaga). No mesmo ano, lança um disco em espanhol, mas para compreendermos os significados desse disco, é interessante dizer que o projeto turístico de Ciro Gomes, no Ceará, tem como modelo os projetos turísticos de Cancun e Barcelona (Belmino, 2012). Assim, há um Fagner que canta o sertão e o litoral, antes de 1987, e outro Fagner que canta os mesmos espaços, depois de 1887, ou seja, em outra formação discursiva, a dos governos das mudanças que, por sua vez, constrói uma imagem positiva do estado do Ceará centrada na valorização do litoral.
Além disso, o cantor se faz presente em inúmeros shows promovidos pelo governo do estado desde 1991. Inclusive, em 2000, no segundo mandato de Tasso Jereissati, o governo do estado promove, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, em Fortaleza, um show comemorativo de “50 anos de Fagner”. No atual governo Cid Gomes, em 2011, Fagner também recebe homenagem com a inauguração de um edifício dentro do estádio do “castelão”, nomeado “Fagner Candido Lopes”. Na ocasião, o cantor aparece lado a lado com o mentor do projeto mudancista, Tasso Jereissati, e os seus predecessores, os irmãos Ciro e Cid Gomes.
Desta forma, a posição sujeito, “cantor-cearense-ídolo das massas” de Raimundo Fagner, deslocada para outra FD, na pós-instituição dos “governos das mudanças”, é determinante dos sentidos dos versos que analisamos, pois, de acordo com Pêcheux (2009, p.146-147):
...as palavras, expressões, proposições etc., mudam de sentido segundo as posições sustentadas por aqueles que as empregam, o que quer dizer que elas adquirem seu sentido em referência a essas posições, isto é, em referência às formações ideológicas (...) nas quais essas posições se inscrevem. [grifos do autor]
 
Assim, quando é Fagner que canta “é porque sou cearense/sou brasileiro/ estou apaixonado esse é o meu lugar/ eu trago no peito um amor verdadeiro/ eu sou da terra da luz, eu sou do Ceará” há uma determinação dos sentidos. A enunciação, em primeira pessoa, feita por um cantor cearense de renome nacional, referenda sentidos de


[8] Música de Belchior, epígrafe de Castro Alves (Poema “A cruz da estrada”).