Revista Rua


Da parede ao corpo social: a carne que não satisfaz
From the Wall to the Social Body: the Meat Doesn't Satisfy

Gesualda dos Santos Rasia

E2, embora afronte os saberes implicados no E1, pode constituir, sob uma determinada perspectiva, e a partir de um determinado modo de constituição dos sentidos, relação de convergência, de aliança em relação ao E1. Essa constatação traz à tona o fato de que à heterogeneidade da FD pode corresponder a também heterogeneidade da posição-sujeito, aspecto esse explicitado por Cazarin (2005). A autora defende que um discurso se estabelece como efeito de unidade discursiva, ao apagar os efeitos de contradição inerente às diferentes posições que o mesmo abriga. Contradição essa que é inerente também ao interior das diferentes posições, na medida em que se estabelecem, em cada uma delas, interlocuções com seus pares e com aqueles que lhes são divergentes no interior de uma mesma FD. Ora, os enunciados em pauta põem em diálogo/dissenso as diferentes causas em jogo.
Os pontos de encontro entre as diferenças podem ser simbolizados nos nós que dão amarras à teia discursiva. Pensemos, por exemplo, nos discursos acerca da fome, cuja questão de fundo não é distinta das questões ambientais, por exemplo. Os danos causados ao solo pela pecuária extensiva impedem esse mesmo solo de produzir os grãos que poderiam alimentar os famintos. Sem falar nas conseqüências em série, para a agricultura, dos prejuízos à camada de ozônio, também decorrentes, em parte, da prática da pecuária. E, com relação à ordem econômica, há que se lembrar a relação já apontada, entre grãos e produção de carne. Nesta perspectiva, o E2 pode produzir efeito de aliança com o E1, haja vista que as questões de ordem ambiental estão diretamente relacionadas às de distribuição de renda e de acesso a alimentos.
Os pontos de encontro e de desencontro de E1 e E2  chamam o olhar do transeunte, perdido entre a multiplicidade de sentidos, ao efeito de organização referencial, na medida em que o cruzamento dos dois enunciados encaminha para discursividades que ora se aproximam, ora se distanciam. Esse efeito diz respeito ao funcionamento da língua como trabalho, resultado das injunções histórico-sociais implicadas no âmbito da escrita e da leitura.
 
TAMBÉM UMA QUESTÃO DE LÍNGUA (MAS NÃO SÓ)

 
Os dois enunciados, imaginariamente encerrados nos limites da estrutura sintática de cada um; separados também imaginariamente pela porta do estabelecimento, cerrada entre eles, constituem sínteses de domínios de saber cujo acesso passa, necessariamente, pela re-construção dos processos discursivos que lhes