Revista Rua


Da parede ao corpo social: a carne que não satisfaz
From the Wall to the Social Body: the Meat Doesn't Satisfy

Gesualda dos Santos Rasia

gozar da carne, ausência essa que transcende os limites da satisfação física, e alcança o social.
Carne, crime, fome, foda. Designações que transitam pelo grande e ininterrupto tecido urbano, em textualidades que, pelo esgarçamento dos furos, fazem irromper vozes inesperadas, desautorizadas, até. Ao se entrecruzarem, essas vozes/posições denunciam a distribuição desigual de renda e da própria linguagem, denúncia que irrompe pela ordem do interdito, do inaceitável na ordem da escrita. Denunciam também que questões de saúde, de alimentação, de ambiente, de ocupação dos espaços de produção, de métodos de produção estão muito mais relacionadas do que se possa imaginar. A expressão é foda, o ponto que faz cruzar os interesses dos diferentes segmentos, evidencia que há excluídos dos processos que sedimentam o urbano tal como ele se coloca hoje. Em outras palavras, de que importa a transgressão, o crime, se há famintos jogados pelas calçadas? Eis o crime:
Fotografia: Ednei Leal
            Editoração: Simone Tristão
 
Na foto, flagrante de uma cena do cotidiano também curitibano, os sentidos escorrem, do verbal para o não-verbal, recolocando a aliança e a divergência, jungidas. A fome se mostra como forma de violência, nem tão simbólica, mas de fato, razão pela qual o enunciado carne é crime pode deslizar da esfera da denúncia para o não-sentido, desde que conceber o consumo de determinado alimento como crime torna-se irrelevante, deixa de fazer sentido diante de afronta maior que é a fome.
O funcionamento discursivo dos enunciados aponta para isso. Não de modo estanque, conforme mostraram as análises. Nas bordas do enunciável, os limites tensos do social: uma coisa é opor-se a um dos modos de funcionamento da economia de