Revista Rua


A máquina corretiva, ou como restituir aos moradores de rua à estrutura: dois modelos de transformação
The corrective machine, or how to restore the homeless people to the structure: two models of transformation

Carlos José Suárez G.

[The communitas] can generate and store a plurality of alternative models for living, from utopias to programs, which are capable of influence de behavior of those in mainstream social and political roles in the direction of radical change, just as much as they can serve as instruments of political control (Turner, 1982, p.33).
 
Vejamos dois exemplos de autores que têm trabalhado sobre moradores de rua e vendedores de entorpecentes. Philippe Bourgois, que viveu num bairro de vendedores de crack e cocaína em New York (1998 e 2003), afirma que a rua constitui-se num fórum alternativo, onde as pessoas podem encontrar uma “dignidade autônoma” frente à exclusão da sociedade e como reação à submissão. A cultura de rua é um universo de oposições políticas não coerentes, é uma série de práticas rebeldes com um estilo antagônico e beligerante. Joanne Passaro (1996) estudou os locais de venda de entorpecentes em New York, assim como as gangs e os moradores de rua. A autora conclui que eles desafiam a naturalização política das idéias tradicionais sobre o gênero e a classe, que assumem a família nuclear como paradigma da estabilidade e o bom funcionamento social. Como Bourgois, Passaro afirma que há associações da vida na rua com a vagabundagem e a doença mental. E esquecem que se trata de uma opção tomada livre, ativa e racionalmente: os homens, na sua maioria tentam assim fugir dos imperativos do pai provedor e da masculinidade bem sucedida.
O estudo das relações entre a estrutura e a communitas pode nos ajudar a estabelecer os limites de cada uma. A lingüista búlgara Julia Kristeva pretende ir além ao tentar entender o que estas pessoas representam:
 
no es por lo tanto la ausencia de limpieza o de salud lo que vuelve abyecto, sino aquello que perturba una identidad, un sistema, un orden […]. En la modernidad occidental, y en razón de la crisis del cristianismo, la abyección encuentra resonancias más arcaicas, culturalmente anteriores al pecado, para alcanzar su estatuto bíblico e incluso el de la impureza de las sociedades primitivas (KRISTEVA, 1989, p.11 e 27).
 
As reflexões de Julia Kristeva sobre o que ela chama de abjeção geram uma idéia do sagrado relativa aos moradores de rua, idéia sub-reptícia em Turner e amplamente apresentada por Mary Douglas (1973). Este trabalho mostra a diferença fundamental entre a pureza e a imundície como forma que dá ordem ao mundo e à experiência, criando, ao mesmo tempo, uma sensação de unidade entre a maioria dos membros da cultura que compartilham tais significados de sujeira, daquilo que está “fora de lugar”. A noção de imundície que tem cada sociedade está inserida numa rede