Revista Rua


A máquina corretiva, ou como restituir aos moradores de rua à estrutura: dois modelos de transformação
The corrective machine, or how to restore the homeless people to the structure: two models of transformation

Carlos José Suárez G.

interpretações uma degeneração de seu significado original, tergiversado pelos clérigos dos séculos XVI e XVII, dentro do moralismo cristão dessa época, numa forma que assombra pela semelhança com o fenômeno que estamos assistindo hoje. Obviamente não podemos cair na armadilha de dizer que esses comportamentos têm acontecido sempre, naturalizando o fato da morte por causas morais. Isto, além de pernicioso, vai de encontro a uma visão mais abrangente e menos totalitária da humanidade. Não é possível dizer isso no caso da nossa análise dos moradores de rua. Quisera terminar com uma provocação, ligada à inspiração de Tlazolteotl, deusa da imundicie; como todos os seres ctónicos e atávicos, Tlazolteotl representa o arquétipo que Erich Neumann chamou a Grande Mãe:
 
it seen figuratively as the evil mother, whether as the bloodstained goddess of death, plague, famine, flood, and the force of instinct, or as the sweetness that lures the destruction. But, as the good mother, she is fullness and abundance; the dispenser of life and happiness, the nutrient earth, the cornucopia of the fruitful womb (1970, p.40).
 
A Grande Mãe, que deve ser destruída para que nasça a verdadeira consciência do Ego, segundo a genealogia que este autor esclarece. Assim, os moradores de rua são o puro signo de uma etapa primitiva que precisa ser aniquilada; ou, como também podem ser interpretados, aqueles que poderiam sobreviver caso aconteça uma catástrofe; os únicos com os conhecimentos de um possível mundo pós-apocalíptico.
 
CAOS E ORDEM
Temos assim, “nós, os normais”, uma devoção oculta pela limpeza, que nos leva ao extermínio daquilo incompreensível para essa lógica. Nossa perversa obsessão pela higiene tem mudado a face de cidades inteiras há séculos, em uma representação da sujeira e do lixo como algo que não pode existir. Queremos viver como seres imaculados, quase como anjos. Mas isso tem custos, neste caso, a vida daqueles que representam essa imundice que desejamos extirpar de nossa visão. O olhar moderno deve ser sempre limpo, o panorama despejado de impureza, a moral sem mancha. Que lugar tem a merda? Nenhum. A nova lógica não aceita o caos nem a entropia que é a dejeção do sistema, o resíduo necessário para o seu funcionamento. Apesar de a física ter demonstrado que sistemas extremadamente ordenados, como nossa própria humanidade, expulsam uma inacreditável quantidade de calor (ou seja, de entropia), esse tipo de fenômeno não é estudado a partir de seu reflexo dentro das culturas. É coincidência que neguemos esse produto de nosso sistema ocidental visando ter cada