Revista Rua


A máquina corretiva, ou como restituir aos moradores de rua à estrutura: dois modelos de transformação
The corrective machine, or how to restore the homeless people to the structure: two models of transformation

Carlos José Suárez G.

mediante mecanismos que conservam as fronteiras sociais, e que assumem a forma de policiais ou militares, explícitos ou secretos. Este processo “dialético” reforça os limites da estrutura, embora nas grandes sociedades exista uma tendência à destruição desta polaridade (TURNER, 2008b, p.250). Dentro da communitas revela-se, segundo Turner, o “verdadeiro estado das coisas”, onde se faz menos fácil vestir as máscaras, ou como diria Goffman, manter o “trabalho de fachada”. A importância do trabalho com a margem foi ressaltada por Van Gennep um século atrás, insistindo que se deve analisar o ritual como um processo, e não cada uma de suas etapas isoladamente. Os rituais não só podem ser observados dentro das iniciações, mas também em várias fases da vida; é por isso que Van Gennep insiste na necessidade de perceber como se desenvolvem os ritos de passagem, ainda que suas partes não estejam igualmente desenvolvidas ou que sua seqüência não seja fixa dentro de um período determinado. A pessoa que entra na anti-estrutura fica em suspenso, ainda que ela tenha suas próprias regras; nas sociedades primitivas estudadas por Van Gennep, o momento da margem prepara a pessoa para sua reintegração à sociedade, com um novo papel e responsabilidades sociais que são aprendidos durante a etapa liminar socialmente institucionalizada, uma troca de status da pessoa e das coisas, do sagrado ao profano, previsto pela sociedade.
 
ENTRADA E DINÂMICA DA COMMUNITAS
 
O termo communitas usado por Turner é originado a partir da análise de Arnold Van Gennep (1978) sobre os ritos de passagem. Este autor escreveu, nos primórdios do século XX, que todo ritual estava dividido três fases: separação, margem ou liminaridade e integração. Dentro do “momento liminar” o sujeito não está cá nem lá, betwixt and between, descrito por Van Gennep essencialmente como o neófito, o iniciado ou o noviço, aqueles que vão mudar seu status social através da passagem, onde a pessoa encontrará ou aprenderá os mistérios de sua cultura. Mas Turner acrescenta que dentro do estado liminar também está o outsider (Turner, 1971), aquele que fica permanentemente afastado da estrutura, mas que permanece com atributos de divindade; são eles os adivinhos, os xamãs, os vagabundos, os médiuns. O caso que vou analisar é de outro tipo de “seres liminares”, os marginais, que ao contrário dos “outsiders sagrados”, procuram sua entrada no sistema, ainda que sem nenhuma garantia de resolução final de seu estado de ambigüidade. A diferença dos