Revista Rua


Segregação e invenção na cidade: uma entrevista com Barba nos jardins do Museu de Arte Moderna - MAM/ RJ
Segregation and inventiveness in the the city: an interview with Barba at the gardens of The Museum of Modern Art - MAM/ Rio de Janeiro

Adriana Fernandes

tal de nego matar o outro com faca. Tinha a feira do roubo, você comprava o roubo aqui, lá na frente o cara segurava a senhora, nem polícia era, se dizia que era polícia. São Cristovão foi muito bom ali, a gente ia. O domingo o programa era o seguinte, ia pra Quinta da Boa Vista, jogava uma pelada, Mangueira contra Tuiuti, era dois times certos. E a gente era a turma do, chamavam a gente a turma do asfalto, ‘ê do asfalto, como é que é, vai dar?’, ‘vai ter sim, quando for sexta-feira a gente combina’, ‘cê vai lá no samba do São Carlos?', ‘eu vou’, ‘então eu vou mandar um cara lá pra conversar contigo’. Comprava duas caixas de cerveja, já deixava no esquema.
A: Já preparado.
B: Quando não, arrumava um mocotó, rachava aquele dinheiro. Jogava bola ninguém se machucava, quando o cara começava a dar o pé: 'Ô, ô, vai sentar pra acalmar lá, tomar uma geladinha, senta lá, cê tá machucando o cara, pra quê?'. Aí o que acontece, no sábado era isso, domingo a gente ia pro samba, dormia, chegava em casa, cinco, seis da manhã, quando era uma da tarde. Seu Antonio, dono da pensão falava: 'ih aí moçada?'... Seu Antonio era fanático: 'Agora acabou a festa', ligava o rádio alto, pra escutar o jogo do Vasco dele e o comentarista... Aquele que tem o nome... [tenta lembrar o nome de um comentarista].
A: Você é Vasco, Barba?
B: Sou Botafogo. Tinha aquele cara comentarista: “Errou, errou!'. Tinha o Saldanha também e tinha uma moçada boa aí. Ficava de papo, tomava um banho. Tinha flamenguista, fluminense, botafoguense, tudo junto. Comia na barraca da Chiquita, quando a Chiquita era uma criancinha ainda, agora tá uma mulherona.
A: Isso tudo lá em São Cristóvão?
B: Atravessava a Quinta com um litrão de bebida, dois litrão de batida e ia embora. E comprava dois pão de mortadela por um real.
A: Hoje em dia a mortadela tá mais cara...
B: Era uma brincadeira, a gente brincava um com o outro. Não tinha cachorro-quente, nem existia isso. O cara botava um tabuleiro grande de pão com mortadela. Sabe aquele saquinho de padaria que bota pãozinho? Já vinha tudo embaladinho: 'Vai, dinheiro não posso pegar'. Ninguém fazia palhaçada, sabia que a madeira comia. Vou te falar uma coisa: era muito divertido. Ia e voltava, pedia pra ir pra geral, encarnava no outro. Arrumava um jeito de beber, para não beber na frente da PM.
A: A PM era mais tranqüila que hoje, o que você acha?
B: Não tem esses problemas que tem hoje.
A: Hoje ficar na rua é mais difícil?
B: Hoje ficar na rua não é ter medo de bandido, é ter medo do cara que tá drogado. A senhora entende que eu tô falando? [pausa]. O que acontece: eu cato minhas latinhas e esses playboy – só tem playboy! – falam um montão de besteira, eu só fico olhando, o cara falando pá-pá-pá. O cara é filho de... O que é que vou ganhar batendo num cara desses? Qual o resultado que vai dar? Tá arriscado eu ir pra DP: 'Nessa idade, batendo num moleque!', vai chamar atenção. A senhora sabe como é que é, o cara drogado fica possesso.
A: Você tá vendo muita coisa de droga na rua agora?