Revista Rua


Segregação e invenção na cidade: uma entrevista com Barba nos jardins do Museu de Arte Moderna - MAM/ RJ
Segregation and inventiveness in the the city: an interview with Barba at the gardens of The Museum of Modern Art - MAM/ Rio de Janeiro

Adriana Fernandes

B: Comportadinho, né? Ninguém é perfeito também. Eu bebia mais pouquinha coisa que hoje, gostava de beber, comprava na hora do almoço, gostava de beber na hora da janta e aí passei a beber já no meio do caminho. É aquele negócio, tá na roda, tira-gosto. Era só o pessoal necessitado. Brigava lá com a mulher. Pra não brigar com a mulher, o pessoal dizia: fica aí, dá um tempo, quando melhorar você sobe, volta pra casa. O outro perdeu a mulher, este foi triste, ele mandou a mulher pra Minas, morreu a mulher e as três crianças num acidente. O cara despirocou da cabeça, não esqueço nunca mais, virou catador oficial de [inaudível], pra comer... Vou falar pra senhora.
A: Ah, ele pega as comidas?
B: Tanto que ele parou na roda do 474, ali na altura da sede do Flamengo. Ele pertinho de passar por baixo, foi atravessar pela pista. Foi tempo de pá. Aí então a gente ficava naquela boa ali, mas o que ocorre agora é que o problema já é outro, estamos em outra era: antes era uma brizolinha, uma maconhazinha, o crack nem existia, ópio só pra quem tem mesmo... Agora não, agora o negócio tá feio. Em primeiro lugar: estourou essa bomba de milícia; em segundo lugar, a PM não gostou, a PM está jogando mais pesado ainda. O que aconteceu: o inimigo que era um, é dois. Antes era só bandido.Não sei se a senhora conhece esses ambientes de morro, eu já vivi em cima sei como é que é. Seu Jorge ali, por exemplo, é o chefe da bagunça. Tá eu, a senhora, somos do bloco, na hora que seu Jorge sair, a gente vai ter que sair também. Eles não vão acreditar que eu vou ficar lá só olhando, não, vão pensar que eu tô tramando. O cara vai pra onde?, ele mora 15 anos no morro, vai pra onde, vai viver do quê? Vem pro asfalto? De repente eles descobrem que tem mais liberdade, que tem mais liberdade no asfalto do que morro. Lá não tem esse negócio de ficar mandando o outro tomar naquele lugar, se falar o cara mete bala mesmo, lá o negócio é sério. Esse negócio de brigar marido e mulher, o negócio resolve – 'por que tá brigando?'. Lei Maria da Penha lá é microondas. Se bater na mulher lá, o negócio fica feio. 'Por que você tá batendo nela?'. 'Não gostou, separa'.
A: Todo mundo se mete, né?
B: O cara não quer bagunça lá não.
A: Não quer chamar atenção.
B: Ele quer é se adiantar no negócio dele.
A: Você acha então que muita gente tem saído pro asfalto pra poder...
B: Aumentou muito. A senhora quer ver o quadro do pessoal de rua? A senhora vai segunda-feira ali no café. Não tem ali o Castelinho? Segunda-feira o café é ali, quinta-feira [na Glória]. Quando for no sábado e domingo, a senhora dá uma passadinha ali na Catedral, como quem vai rezar, pra senhora ver a fila.
A: De manhã também?
B: De manhã, na Catedral, tem o café da manhã. Ou, se não quiser ter todo esse trabalho, dá uma passadinha na Presidente Vargas de noite, Nossa Senhora! É muita coisa, muita coisa mesmo.