Modos de ser, formas de habitar: práticas discursivas da publicidade imobiliária no Recife


resumo resumo

Marcela Barbosa Lins
Cristina Teixeira Vieira de Melo



1. Habitar a cidade e ser sujeito

Espaços de conflitos e mudanças, as cidades são únicas em suas materializações espaciais. Lugar do possível, do plural e da coexistência de distintas formas de vida, a cidade é a manifestação material dos processos históricos. A cidade é também espaço onde o poder se inscreve, se exerce, se evidencia. Em seus estudos sobre o poder, Foucault (1979, 2008a, 2008b) mostra como a conformação das cidades modernas resulta de uma preocupação do Estado com a gestão e circulação das coisas e das pessoas. Até então, cidades consistiam em espaços difusos, absolutamente heterogêneos, governados por um conjunto de poderes senhoriais.

Ao discorrer sobre o processo de urbanização da França do século XVIII, o pensador argumenta que o aparecimento de uma população operária pobre aumenta as tensões políticas na cidade. Os afrontamentos entre plebe e burguesia passam a se manifestar através de agitações e sublevações cada vez mais numerosas e frequentes. Revoltas de subsistências que culminarão nas grandes revoltas contemporâneas da Revolução Francesa (FOUCAULT, 1979). Foucault afirma que nessa época nasce o que ele chama de “medo urbano”, pequenos pânicos que atravessam a vida urbana:

 

[...] medo das oficinas e fábricas que estão se construindo, do amontoamento da população, das casas altas demais, da população numerosa demais; medo, também, das epidemias urbanas, dos cemitérios que se tornam cada vez mais numerosos e invadem pouco a pouco a cidade; medo dos esgotos, das caves sobre as quais são construídas as casas que estão sempre correndo o perigo de desmoronar.” (FOUCAULT, 1979, p.87)

 

Diante de tantos medos e de uma cidade que crescia, emerge um poder político que busca gerir e esquadrinhar sua população. O modo de governo que tomou como alvo a população foi a economia política, um tipo de saber e prática que deriva de um aparato policial (estado de polícia) constante e ilimitado que teria como objetivo fazer crescer de dentro as forças do Estado. Um aparato que surge numa tentativa molecular de gerir a vida dos sujeitos.

[...] por ter havido urna polícia, isto é, porque se regulamentou a maneira como os homens podiam e deviam, primeiro, se reunir e, segundo, se comunicar, no senso lato do termo "comunicar", isto é, coabitar e intercambiar, coexistir e circular, coabitar e falar, coabitar e vender e comprar, foi por ter havido urna polícia regulamentando essa coabitação, essa circulação e esse intercâmbio que as cidades puderam existir. A polícia como condição de existência da urbanidade (FOUCAULT, 2008a, p. 453).

Essa razão de Estado de poderes ilimitados é confrontada pelo pensamento liberal clássico. Para o Liberalismo, o Estado já não pode encontrar em si mesmo a justificativa de sua existência, ele deve existir para servir a outra coisa que não ele mesmo. Essa outra coisa é a sociedade civil e o mercado. Essa nova arte de governar tem por função “não tanto assegurar o crescimento do Estado em força, riqueza e poder, o crescimento indefinido do Estado, mas sim limitar do interior o exercício do poder de governar.” (FOUCAULT, 2008b, p. 39).

Segundo o Liberalismo Clássico, os indivíduos seriam naturalmente materialistas e individualistas, sendo capazes de se auto-organizarem. Nesse contexto, caberia ao Estado apenas observar e reconhecer as leis que emanariam naturalmente daquele espaço de concorrência e abster-se de intervir para não atrapalhar seu natural desenvolvimento. Contudo, a História mostrou que a ação descontrolada das atividades econômicas individuais não levou a um funcionamento harmônico da sociedade civil. O Neoliberalismo nasce justo com a intenção de fazer com que o Estado intervenha sobre a sociedade civil para garantir a moldura mercado; para garantir que o mercado aja como regulador ou conformador da sociedade.

Bourdieu também se refere ao espaço como local de poder. Em “Efeitos do espaço” (1997), ele sustenta que em uma sociedade hierarquizada, não há espaço que também não o seja. Assim, se o espaço é o lugar por onde se exprimem as diferenças – e isso é demarcado na conformação da cidade e de sua paisagem –, a casa é também símbolo do espaço social, que exprime distâncias e demarca posições privilegiadas de uns em relação a outros. Uma desigualdade que se materializa tanto em uma geografia simbólica da cidade, quanto nas distintas tipologias arquitetônicas destinadas à moradia.

No que diz respeito à associação entre consumo e produção de distinção, Bourdieu (2011) aponta que, como nas sociedades modernas a nobreza de sangue não é amplamente reconhecida, o consumo é tido como o lugar privilegiado da manifestação das diferenças. Na esteira do autor, Maria Eduarda da Mota Rocha (2010) afirma que a ideia de “estilo de vida” consiste em um conjunto de preferências distintivas pelo qual as classes mais altas marcam sua posição perante as demais. E, nesse “sistema”, os meios de comunicação, sobretudo a publicidade, difundem os códigos para que consumidores possam “ler” a posição social do consumidor através do produto consumido. Assim, podemos inferir que morar é se distinguir e revelar padrões de comportamento e esquemas cognitivos identificados a uma determinada classe social (LOUREIRO & AMORIM, 2005a). Em outros termos, é subjetivar-se e afirmar uma posição.

Por sua vez, numa perspectiva foucaultiana, José Aidar Prado (2013) defende que os meios comunicacionais são dispositivos de convocação biopolítica. Ou seja, são responsáveis por projetar imagens e evocar afetos, ao passo que agenciam (trazem adiante, convidam e produzem) determinadas formas de existência a partir do repertório possível da sociedade. Ciente disso, o marketing imobiliário atua justamente objetivando atender aos desejos e demandas de moradia de cada perfil consumidor. Um olhar atento aos agenciamentos da publicidade imobiliária é capaz de revelar algumas maneiras como experienciamos o urbano e construímo-nos enquanto sujeitos da/na cidade.

Com essa Introdução, desejamos apontar que cidade é espaço privilegiado de gestão de corpos e exercício de poder. Se na cidade nos constituímos enquanto sujeitos, e se o “lar” é a forma privilegiada da afirmação de um lugar no tecido social, nesse artigo buscamos lançar luz sobre um campo discursivo que diz respeito a tais questões: a publicidade de imóveis. Investigamos de que maneira a publicidade imobiliária pode ser lida enquanto prática cultural que revela e agencia formas de ser e estar na cidade. Consiste, portanto, em um campo discursivo que vende não somente diferentes tipos de moradia e maneiras de habitar a cidade, mas que produz formas de vida. Assim, lançamos especificamente um olhar para os anúncios de imóveis destinados às classes alta e média alta veiculados entre os anos 1970 e 2006 no jornal Diario de Pernambuco, veículo que durante décadas foi conhecido por seu robusto setor de anunciantes.

O recorte de classe social do corpus, isto é, a escolha por trabalhar com a publicidade imobiliária direcionada à elite, se sustenta em função do nosso interesse em investigar o discurso corrente através do qual a  família e a propriedade privada aparecem protegidas por muros, ou seja, uma forma de vivenciar a cidade marcada pelas interdições. Mesmo sabendo que hoje essa existência murada não é uma exclusividade das elites[1], pressupomos que é nesta classe social que ela se manifesta de forma mais contundente. Justificado o recorte de classe, vamos agora defender o período temporal da coleta do corpus.

2. Os edifícios verticais fabricando desejos e sujeitos

O edifício vertical, apesar de ser uma estrutura arquitetônica recente, dialoga com tipologias que o antecederam: os sobrados altos e magros, que inauguram a verticalidade do Recife. Consistiam em moradias qualificadas, destinadas à emergente burguesia comercial e erguidas nos escassos terrenos de terra firme existentes; em oposição às numerosas e extensas regiões alagadiças onde se assentavam os mocambos, as precárias moradias das classes pobres.

O edifício vertical tal como o conhecemos hoje e cujo a priori histórico é a modernização, aparece no tecido urbano recifense no início do século XX, no âmbito das reformas que buscavam instituir uma agenda modernizante à paisagem da cidade; a exemplo da remodulação da região portuária de 1909, que culminou na destruição de dois terços das edificações da região, como a Igreja do Corpo Santo, e a construção da Avenida 10 de Novembro (atual Guararapes) em 1937, onde foram erguidos uma série de edifícios comerciais, como o Sulamérica Capitalização (1941), o da Caixa Econômica Federal (1942), o Trianon (1941) e o Cine Art Palácio (1937).

Contudo, é na segunda metade do século XX, sobretudo na década de 1970, que a moradia vertical melhor se sedimenta na capital pernambucana. Nesse momento, em decorrência da metropolização, as atividades de tipo urbano superam a antiga base econômica rural (MELO, 1979) e Recife ultrapassa a marca de um milhão de habitantes, figurando em terceiro lugar entre as metrópoles mais povoadas do país, atrás de Rio de Janeiro e São Paulo.

Também nos anos 1970, estavam em pleno exercício um banco público especializado em financiamento habitacional, o Banco Nacional de Habitação (BNH), e as sociedades de crédito e letras imobiliárias, que compunham o Sistema Financeiro de Habitação (SFH) – mecanismos existentes sob a égide do nacional desenvolvimentismo do governo militar, que buscavam estimular e facilitar a aquisição da propriedade privada através do recurso ao crédito. De início, esses sistemas tinham por finalidade prover a construção e financiamento de casas para famílias de baixa renda, mas, posteriormente, tornaram-se a principal fonte de financiamento para a classe média[2], influenciando fortemente o espraiamento dos edifícios de apartamento ao longo do tecido urbano das grandes metrópoles brasileiras (RONILK, 2015).

Nesse momento, os jornais começam a anunciar uma profusão de edifícios à venda. Sobre isso, Loureiro & Amorim (2005a) mostram que as publicidades foram essenciais para a aceitação do condomínio vertical como forma ideal de habitação para as classes média e alta, exercendo um importante protagonismo em instituir e produzir uma determinada forma de vida e ocupação na cidade.

 

Proteção coletiva, alcançada por meio de estruturas de condomínio organizadas, substituiu a casa isolada individual como o símbolo de proteção e segurança, valores estes compartilhados e desejados por típicas famílias modernas. De fato, o apartamento alcançou o status da moradia contemporânea ideal, segura e prática, e o marketing habitacional parece saber isso (2005a, s/p).

 

Nos anos 2000, o edifício vertical já havia se consolidado como opção de moradia das classes média e alta, ocupando parte considerável da paisagem recifense. De acordo com um levantamento realizado pela Emporis em 2018, empresa alemã especializada em mineração de dados sobre imóveis, Recife está em 37º no ranking mundial entre as cidades com skyline de maior impacto visual e em 2º lugar em âmbito nacional, atrás apenas de São Paulo[3]. O horizonte denso da cidade já é marca de um imaginário que a recobre. Filmes, músicas, pinturas e fotografias comumente a retratam como urbe de concreto, dos enclaves.

Apesar do crescimento dos edifícios verticais na paisagem urbana de Recife, os anúncios imobiliários nos jornais, suporte midiático escolhido como fonte de nossa pesquisa, encolheram drasticamente a partir de 2000. Este decréscimo coincide com a diminuição da venda/leitura dos jornais. Uma pesquisa realizada pela Meta Pesquisas de Opinião para a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (SECOM) mostrou que em 2010, 70,4% da população nordestina não tinha o hábito de ler jornal. Já de acordo com a Pesquisa Brasileira de Mídia de 2015[4], realizada pelo IBOPE Inteligência apontou que apenas 7% da população brasileira tinha nessa época o hábito de ler jornal diariamente. Tal cenário se distingue dos hábitos de consumo do brasileiro no final do século XX. Por exemplo, em 1985 53% da população brasileira entre 15 e 65 anos tinha o hábito de consumir jornal (BAHIA, 2009).

Em paralelo a essas mudanças nos hábitos de leitura de jornais, a internet vai ganhando força como espaço privilegiado de informação, comunicação e venda de produtos e serviços. Segundo a pesquisa Brasileira de Mídia de 2015, a internet figura em segundo lugar como espaço de maior visibilidade de anúncios, seguido somente da TV. Entre o público que declara acessar a internet, aproximadamente sete a cada dez usuários diz se deparar sempre e/ou às vezes com anúncios publicitários. De acordo com a Pesquisa Global de Entretenimento e Mídia[5], realizada pela consultoria PwC em 2019, o investimento da publicidade digital representa 30% da verba total do setor, um aumento de 33% em relação ao ano de 2014. Tudo isso fez com que o gênero “anúncio publicitário”, pertencente originalmente à mídia impressa, fosse perdendo força gradativamente. Daí, a opção de limitar o recorte temporal dessa pesquisa aos anos 2000.

 

3. Abrir mão das descontinuidades e acolher as continuidades

Levando em consideração o recorte temporal expandido para seleção do corpus (1970-2006), limitamos a coleta a duas edições anuais do jornal, com uma edição veiculada no primeiro semestre e outra no segundo. As edições sempre correspondiam aos exemplares que circularam aos domingos, dia em que os anúncios são mais numerosos. Tal procedimento rendeu um montante de aproximadamente 4.000 peças publicitárias, o que ainda corresponde a um extenso corpus a investigar.

O objetivo de trabalhar com uma temporalidade alargada (mais de três décadas) foi tentar, na trilha de Foucault, identificar possíveis mudanças, inflexões, irrupções e descontinuidades no discurso da moradia destinada a uma elite, o que seria inviável caso me detivesse exclusivamente em um período histórico curto.

No entanto, no lugar de possíveis grandes descontinuidades ou rupturas no discurso, identificamos uma tendência não só à manutenção, mas à intensificação de certas “matrizes discursivas” nos anúncios imobiliários ao longo de toda temporalidade estudada. Tais matrizes são as seguintes: distinção, valorização da propriedade privada, isolamento/enclausuramento.

Como ficará mais claro adiante, defendemos que isso ocorreu especialmente em função da expansão e solidificação de uma governamentalidade neoliberal no país. Expliquemos: com o passar dos anos, a moradia em edifícios foi gradativamente configurada como um bem de consumo que pode abrigar em si mesma uma série de itens de lazer que, por sua vez, permite ao sujeito viver uma “liberdade” e uma “felicidade” entre muros. Ou seja, trata-se de uma liberdade e de uma felicidade que abdicam do espaço público, do bem comum, para usufruir de espaços e bens privados.

A seguir, comentamos detalhadamente cada uma das matrizes discursivas identificadas. Vale registrar que muitas vezes um anúncio apresenta mais de uma matriz, no entanto, para fins de classificação e exemplificação da matriz, na hora da análise realizamos algumas generalizações.

O recorte de classe social do corpus se sustenta em função da seguinte hipótese de trabalho: são os anúncios imobiliários destinados à elite que prioritariamente propagam uma forma de existência em que a família e a propriedade privada aparecem protegidas por muros[6] e, paralelamente, configuram uma de cidade demarcada por diferenças e interdições. Como são essas as formas de vida e de desenho de cidade que nos interessa estudar, excluímos da análise anúncios referentes às habitações populares.

 

4. Distinção

Como vimos anteriormente, adquirir um imóvel não significa simplesmente suprir a necessidade de se ter um lugar para morar, para se abrigar. A moradia é um importante signo de distinção. A matriz discursiva que estamos nomeando de “Distinção” é uma categoria ampla que costuma se materializar a partir da discursivização de diferentes características do imóvel. Hoje, por exemplo, os anúncios dirigidos à elite, no intuito de tornar os imóveis desejáveis em ao seu público, falam em Espaço Grill, Espaço Fitness, Varanda Gourmet. Antes eles exaltavam itens como esquadrias de alumínio, circuito interno de TV, interfone ou se valiam de um léxico marcadamente aristocrático: “more na Casa Grande da Rosa e Silva”, “more no bairro mais aristocrático da cidade”, “desfrute o privilégio de ter bons vizinhos” são alguns exemplos.

Tanto no passado quanto no presente, é recorrente a menção a certos aspectos materiais da edificação como à metragem do apartamento e ao número/tipos de cômodos (quarto, banheiro, sala, cozinha, varanda, dependência de empregada, área de serviço, garagem, etc.), bem como a especificação de certos materiais utilizados na construção que são considerados “um diferencial”. Nesse contexto, é comum os anúncios utilizarem modalizadores linguísticos, especialmente adjetivos e advérbios, para qualificar positivamente o imóvel e/ou seus ambientes

Outro importante elemento de distinção é a localização do edifício. No geral, a localização é valorada em função de sua proximidade aos seguintes espaços: frentes d’água (praia, rio, lago, lagoa, etc.), áreas verdes (parques, praças, bosques, reservas florestais, etc.) e centros urbanos repletos de serviços de natureza variada (bancos, escolas, supermercados, shoppings, etc.). Nos dois primeiros casos, os anúncios costumam ressaltar o aspecto idílico de se morar perto do mar ou de uma área arborizada; no último, a facilidade de se ter diferentes serviços no entorno da morada surge enquanto um artifício que atribui valor simbólico à mercadoria em questão. Percebe-se isto no anúncio do Edifício Leme, que evoca o idílio da região praieira e a urbanidade da proximidade relativa ao centro e a serviços, como “colégios, bons clubes e futuro shopping center”.

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Fonte: Diario de Pernambuco, 28 de janeiro de 1979

 
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Sobre a questão da localidade, é importante ressaltar que, nos anos 1970, adquirir um apartamento no centro urbano era valorizado, posto que tratava-se do centro comercial e administrativo da cidade. Ao longo dos anos 1980, com o crescimento urbano e gradual degradação da região histórica, esse apelo de venda se retrai. Já as referências à proximidade com os serviços, às frentes d’água e às zonas verdes permanecem.

Outro ponto que também diz respeito à localidade é a economia simbólica dos bairros. Em “A Utopia Urbana” (1975), um estudo sobre Copacabana, no Rio de Janeiro, Gilberto Velho defende que o bairro de moradia é um importante demarcador da estratificação entre ricos e pobres. E, neste sentido, os símbolos atrelados ao local de moradia têm um valor estratégico na vida das pessoas, e a distribuição espacial é fundamental à definição do status social dos indivíduos.

No anúncio do Edifício Vivenda de Casa Forte, o sintagma “No melhor trecho do bairro mais nobre do Recife”, veiculado em 1982, deixa evidente a economia simbólica da cidade:

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Fonte: Diario de Pernambuco, 5 de setembro de 1982

 
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A importância simbólica da localização se revela não só na ênfase dada aos bairros nobres onde estão situados imóveis à venda, mas no gesto de renomear bairros menos valorizados e/ou estigmatizados tomando como parâmetro os bairros nobres. Um exemplo desse tipo é o do anúncio de um apartamento situado no bairro da Macaxeira, região de antigas vilas operárias de Recife, que é nomeado como “Nova Apipucos”, zona de antigos engenhos e onde hoje se localizam imponentes residências.

Também não é raro os anunciantes informarem de maneira inapropriada o endereço de um prédio localizado em área menos nobre, identificando-o como estando situado na área referente a um bairro vizinho reconhecido como mais distinto. Loureiro e Amorim (2005b) mostram como é recorrente imóveis localizados em Casa Amarela, um bairro tradicionalmente de classe operária e novos ricos, serem anunciados como se estivessem localizados em Casa Forte, região tradicionalmente ocupada pela antiga aristocracia recifense.

Particularmente nos anúncios veiculados na década de 1970, o aspecto distintivo se manifesta através do emprego de um léxico associado à ideia de aristocracia e ao passado colonial da cidade, como no anúncio do Edifício Senzala, veiculado no DP em 1978.

Texto, Carta

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Fonte: Diario de Pernambuco, 28 de maio de 1978

 
  Texto, Carta

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Apesar de uma maior profusão nos anúncios dos anos 1970, essa racionalidade de valoração de uma estrutura colonial reverbera até os dias atuais. Isso se evidencia de maneiras plurais: na nomeação dos edifícios que ora deixam a mostra um passado colonial escravocrata (Edifício Engenho Casa Forte, Edifício Casa Grande das Ubaias, Edifício Senzala do Megahype, etc.), no uso de estrangeirismos para angariar valor simbólico (Edifício Evolution Shopping Park, Edifício Beach Class Residence, Edifício Golden Life, etc.), e na própria conformação do espaço da cidade. Com relação a este último aspecto, lembremos que a cidade do Recife foi conformada a partir de uma razão moderna aclimatada nos trópicos. Ou, em outros termos, trata-se de um processo traumático que invisibiliza e põe à margem outras formas de existência. Enfim, a colonialidade segue estruturando nossa experiência de cidade (SANTOS, 2009).

Uma outra forma de valorar o empreendimento é associá-los à construtora, à imobiliária ou à incorporadora, valendo-se do prestígio das marcas. A título de exemplo, percebemos no corpus uma série de anúncios que faziam menção direta à distinção implícita no gesto de comprar um imóvel de determinadas empresas do ramo, como “More em Boa Viagem, num Queiroz Galvão”, “Qualidade Moura Dubeux”., “Escolha logo o seu Golden [edifício], pontualidade Dallas”, etc. 

 

5. Valorização da propriedade privada

Essa matriz discursiva põe em cena a seguinte cadeia argumentativa: para se sentir plenamente realizado nessa vida, é imperativo que o indivíduo consiga ter um imóvel próprio e, para que o indivíduo possa realizar essa aquisição, o mercado põe ao seu dispor “condições de financiamento” variadas que possibilitam e facilitam a compra.

Em Cidade de Muros (2000), Teresa Caldeira mostra que, em muitas das propagandas veiculadas em São Paulo, a saída do aluguel e a aquisição da casa própria emergem como a realização de um sonho. O sintagma “o sonho da casa própria” atravessa gerações e se constitui como uma “verdade” incontestável. Em algumas publicidades do nosso corpus há também uma referência direta entre aquisição da propriedade privada e a ideia de liberdade e felicidade.

Na publicidade abaixo, a “oportunidade” de adquirir um imóvel próprio é vendida como sendo uma excelente ideia, pois significa estar livre do aluguel. E isso seria conseguido com um investimento não tão grande, afinal, o comprador precisa desembolsar “apenas” 30 mil de sinal, mais algumas parcelas facilitadas pelo sistema de financiamento de 15 mil. Assim, pode-se adquirir a “liberdade”. Certeza acentuada pelo nome do edifício chamado “Liberdade”.

Texto preto sobre fundo branco

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Fonte: DP, 8 de março de 1982

 
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Vale questionar de onde vem o “sonho da casa própria”. Como se constitui essa verdade e de que forma ela se estabelece como um dos principais objetos de desejo da maior parte da população?

Conforme aponta Rocha (2010), o período que abrange a ditadura militar é marcado por um premente uso político da defesa da aquisição da propriedade privada. Isso vai se evidenciar nos mecanismos financeiros para a aquisição da casa própria – como a concessão de crédito via os já citados BNH e SFH – e nas publicidades que anunciam os imóveis. Como aponta a autora, o setor publicitário foi um importante instrumento mobilizador de questões como a defesa da família e da propriedade.

Mas, se é verdade que ao adquirir uma casa própria o sujeito comum se livra do aluguel, é bom lembrar que, antes disso, na maior parte das vezes, ele passa um bom tempo pagando o financiamento do imóvel. Em “O Governo do Homem Endividado”, Maurizio Lazzarato (2017) argumenta que o endividamento manifesta uma nova técnica de poder. É, portanto, de uma prática constitutiva das sociedades contemporâneas ocidentais, sobretudo após os anos 1970, com a ascensão e enraizamento das políticas neoliberais e uma gradual substituição dos direitos sociais pelo acesso ao direito ao crédito (ou seja: ao direito de contrair dívidas). O endividamento consiste, assim, em um importante mecanismo de produção de subjetivações do capitalismo: um endividamento que se coloca, muito comumente, como necessário à vida contemporânea. Nessa mesma linha, Dardot e Laval (2016) mostram a correlação entre liberdade, felicidade e aquisição da propriedade, uma normatividade das sociedades capitalistas, que se impôs como uma normatização subjetiva. Assim, as políticas da distinção pautadas na aquisição da propriedade privada unem-se a uma lógica governamental segundo a qual cabe ao indivíduo a conquista do sonho próprio. Pode-se ainda inferir desse argumento o fenômeno da intensificação da dívida como importante mecanismo de subjetivação no contemporâneo (LAZZARATO, 2017).

Fortemente vinculado à ideia de ter uma casa própria, as condições de financiamento remetem às possibilidades de pagamento do bem imobiliário. No Brasil, a aquisição de um imóvel próprio implica um grande valor monetário para as famílias, o que justifica as referências bastante frequentes às condições de pagamento e financiamento dos imóveis nas publicidades que os anunciam.

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Fonte: DP, 16 de maio de 1993

 
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Ao longo da temporalidade dos anúncios aqui estudados, há uma variação deste artifício. A partir de meados da década de 1980 e ao longo de toda a década de 1990, há uma grande profusão de anúncios cujo protagonismo são as condições de financiamento do imóvel – até então, o protagonismo de tal recurso pouco aparecia. A crise inflacionária e extinção, em 1984, do Banco Nacional de Habitação (BNH) contribuíram para tal fenômeno. Durante a década de 1980, o setor imobiliário enfrentou um grande retraimento. O consumidor tinha menos recursos financeiros para pagar pela casa própria. Em consequência, as condições de compra são enfatizadas na publicidade imobiliária. Assim, sintagmas como “garanta seu futuro com a compra de um imóvel” dão lugar a estruturas retóricas como realize o sonho da casa própria, uma vez que há mecanismos de crédito e parcelamentos possíveis”. O anúncio do Parque Residencial dos Guararapes sintetiza a importância das facilidades de compra nos anúncios.

 

 

6. Isolamento/enclausuramento e segurança

Essa matriz discursiva diz respeito ao desejo de se demarcar uma separação muito nítida entre o espaço privado e o espaço público, imaginado, por sua vez, como lugar cada vez mais caótico e perigoso. Neste sentido, os edifícios se isolam cada vez mais por trás de muros e de sofisticadas tecnologias de segurança.

Sobre este aspecto, Leitão (2014) afirma que desde a Casa Grande existia uma cultura do morar assentada em um caráter insular. Autônoma e indiferente ao seu entorno, este tipo de habitação contribuiu à fixação de uma tendência que tende a negar seus arredores. Hoje, os edifícios murados de Recife parecem ressoar o desprezo das habitações dos ricos em relação àquilo que os cerca, e configuram-se como uma espécie de espectro moderno dos antigos engenhos.

Além desse aspecto, a própria ideia de “propriedade privada” contribui para o afastamento do sujeito daquilo que é comum, do que forma comunidade. Apesar de o condomínio empreender uma forma de vida coletiva, o caso do condomínio brasileiro tem contornos muito singulares: os valores referentes à comunidade raramente (ou nunca) são articulados no discurso imobiliário, de modo distinto das gated communities norte-americanas, que fabulam e, muito frequentemente, vendem uma ideia de vida comunal entre iguais. No Brasil, como argumentam Christian Dunker (2015) e Caldeira (2000), o condomínio é predominantemente vinculado a uma vida de caráter insular.

Intimamente relacionada à questão do isolamento/enclausuramento está a da segurança. Como já dito, a vontade de se isolar e de se apartar do entorno nutre a ideia de que aquilo que está fora dos muros é perigoso. E, em uma cidade hoje marcada pelo imaginário da violência, a associação do edifício enquanto espaço seguro é algo que vai recorrer nos anúncios imobiliários.

Para Caldeira (2011), o medo contemporâneo da cidade representa um ataque às noções de abertura, indeterminação, fluidez e coexistência das diferenças das cidades modernas. Um medo que assinala mudanças fundamentais no espaço público e democrático. A autora afirma ainda que o tipo de cidade neoliberal em que vivemos valoriza espaços privados, fechados e estigmatiza o público – e que, portanto, a noção de medo que reverbera é, em grande medida, uma questão de sociabilidade: trata-se, dessa forma, de uma linguagem que estrutura as interdições experienciadas no espaço urbano. Neste sentido, consiste numa questão de como o espaço urbano é significado e um mecanismo ideológico de combate e afastamento das diferenças sociais. Uma razão que gera políticas de exclusão de grupos populacionais.

De acordo com Caldeira (2011), ainda, os mecanismos de exclusão são uma resposta aos novos contornos da esfera pública dados com a redemocratização, quando aqueles antes excluídos da esfera da cidadania vislumbram a possibilidade de se envolver na constituição da paisagem da cidade, de seu futuro. Neste sentido, a intensificação de um processo segregatório pode ser compreendido por um processo demofóbico, que estigmatiza, controla e exclui atores políticos que acabaram de forçar seu reconhecimento como cidadãos. Não à toa, a década de 1990 é também a década de profunda estigmatização daqueles que não têm participação ativa na esfera do consumo e daqueles que habitam regiões periféricas (ROLNIK, 2016).

No que diz respeito aos anúncios, é por volta da década de 1980 que percebemos uma importante intensificação do “recurso ao medo do espaço público”. Evidentemente, a moradia vertical, ao se discursivizar como distinta, já evocava noções de distanciamento social. Contudo, nas décadas mais recentes, começamos a perceber menções mais explícitas à questão da segurança. Em estudo sobre os anúncios imobiliários e o imaginário do medo, Monteiro et. al (2013) apontam que durante 1970, as enchentes das marés e estuários de rios eram as grandes responsáveis por articular o sentimento de medo – o que colaborou para a valorização de algumas regiões em detrimento de outras. De acordo com os autores, é somente a partir dos anos 1980 que percebemos a gradual incorporação de uma série de tecnologias de vigilância, assim como menções mais diretas ao medo do crime. No nosso corpus, a primeira menção deste tipo foi identificada em um anúncio veiculado em 1981.

Texto

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Fonte: DP, 13 de setembro de 1981

 

 

Importante demarcar que até então inexistiam menções mais explícitas à segurança e os edifícios, muitos aderidos à arquitetura modernista, eram muitas vezes abertos às ruas, com poucas tecnologias mais sofisticadas de segurança e/ou vigilância, de modo que a distinção não era demarcada numa separação literal.

No caso Recife, é sobretudo a partir da década de 1990 que começamos a observar a profusão de tecnologias mais robustas, como guaritas vigiadas e câmeras de segurança. É também quando passa a recorrer o modelo de edifício multifamiliar como algo “livre dos perigos”, em um momento associado às crescentes facilidades de aquisição do automóvel e à substituição da lógica de rua pela lógica dos shopping centers (MONTEIRO et. al, 2013) – fatores que culminaram na consolidação de um estilo de vida que prioriza o encastelamento e o isolamento. É também neste contexto que se percebe uma profusão dos denominados enclaves fortificados: espaços apartados, justificados ideologicamente no medo do crime violento e que, como aponta Caldeira, ilustram temores mais amplos da elite de que “os pobres não possam ser mantidos em seus lugares” (CALDEIRA, 2000, p. 327).

Associada à matriz discursiva do isolamento/enclausuramento e segurança está a exaltação de espaços de lazer internos à edificação, uma vez que o desejo de se isolar, de se enclausurar só vinga se o espaço interior das edificações oferecer ao morador condições de bem-estar, diversão e prazer capazes de suprir aquilo que ele está abdicando de procurar no espaço público.

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Fonte: DP, 8 de maio de 1994

 
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Vale frisar que os tipos de lazer disponíveis aos moradores dos edifícios se diversificaram imensamente nos últimos anos. Se antes bastava uma piscina para satisfazer os desejos de diversão do morador, atualmente, essa lista comporta uma infinidade de espaços: academia, quadras de esporte, pistas de corrida, playground, churrasqueira, brinquedoteca, salão de jogos, espaços para relaxamento e meditação, sauna, praças e jardins, entre outros itens. Abaixo, um anúncio veiculado em 8 de maio de 1994 exemplifica a matriz.

 

7. Considerações finais

 O fato de, durante mais de três décadas, a publicidade imobiliária dirigida às classes média e alta não ter sofrido mudanças significativas em seu discurso mostra a raridade dos enunciados apontada por Foucault (2012). No lugar de possíveis transformações, antigas matrizes discursivas se intensificaram e ramificaram. Diante desse fato, nos resta indagar: Como foi possível essa continuidade e não uma outra coisa em seu lugar? Para responder essa pergunta, buscamos desconstruir evidências a fim de refletir sobre o regime de verdade que permitiu instituir como verdadeira ou mesmo indispensável determinada forma de vida e ocupação urbana. Mais especificamente, objetivamos compreender como se deu a consolidação do edifício vertical como forma de moradia qualificada, adequada e desejada pelas maiores rendas da cidade.

Vimos que nos anos 1970 e 1980, o edifício ainda consistia em uma novidade e o mercado imobiliário precisou suplantar qualquer associação pejorativa que uma habitação coletiva poderia evocar às elites. Neste sentido, os edifícios eram discursivizados em termos de sofisticação, e isso era feito através de uma robusta retórica. Os anúncios reverberavam uma geografia simbólica da cidade e suas políticas da distinção. Havia um forte apelo a valores coloniais, a urbanidade, a propriedade, e ao idílio. A partir de 1980, a essas matrizes discursivas vêm se somar em especial a ideia de enclausuramento e segurança.

Mas, é importante ressaltar: mesmo quando o edifício ainda se configurava como novidade, as estratégias que mobilizavam sua venda já diziam respeito a uma vida apartada[7], ensimesmada. Isso parece sobretudo nos argumentos que mobilizam o aristocrático e o idílico. O primeiro empreende a venda do imóvel a partir da criação de um mundo simbólico sofisticado, diferenciado, exclusivo; o segundo aponta no caráter antiurbano da vida no edifício, um oásis em meio ao caos e indefinição da urbe. Neste sentido, o enclave fortificado pode ser compreendido enquanto intensificação de um processo de demarcação das diferenças sociais, resultado de uma maior reverberação de uma sociabilidade do medo.

Hoje, a cidade do enclave, do ensimesmamento e das práticas de interdição triunfou enquanto a cidade possível. Lazzarato lembra que o capitalismo é definido como um controle absoluto sobre o que é possível e impossível. Inclusive, circula a máxima de que “não há alternativa” para além daquelas determinadas pela acumulação, pelas finanças e pelo mercado. Porém, o mesmo autor sustenta que “o desejo é sempre reconhecível pelo impossível que ele levantou e pelos novos possíveis que ele criou” (LAZZARATO, 2017, p. 21).

Se a cidade que habitamos atualmente nega outros possíveis, ela também abriga em seu interior outras cidades que são conjuradas, secretadas, desejadas a partir daquilo que se coloca como hegemônico. Enfim, as cidades são constituídas por disputas. Disputas morais que reivindicam outras urbanidades possíveis. Se a cidade que habitamos hoje não se alinha aquela que desejamos, mais democrática e menos desigual, ela deve ser transformada, mudada. Não à toa, durante muitos anos espacialidades utópicas têm sido associadas ao espaço urbano (HARVEY, 2012). De Platão a Thomas More, de Campanella aos utopistas do século XVIII, o exercício imaginativo de evocar paisagens possíveis é recorrente. Tal associação evidencia o quanto a cidade é, por excelência, a materialidade que incorpora o desejo do possível. Espaço que materializa o que somos, deixamos de ser e aquilo que estamos em via de nos transformar.

 

Referências

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AMORIM, Luiz. & Loureiro, Cláudia. Dize-me teu nome, tua altura e onde moras e te direi quem és: estratégias de marketing e a criação da casa ideal (parte 2). Vitruvius, 2005b. Disponível em <https://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/05.058/490 >. Acesso em 1 de maio de 2019

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FOUCAULT, Michel. A Arqueologia do Saber. Rio de Janeiro, RJ: Forense Universitária, 2012

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LAZARATTO, Maurizio. O Governo do Homem Endividado. São Paulo: Editora n-1, 2017

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VELHO, Gilberto. A Utopia Urbana. Rio de Janeiro: Zahar, 1975

 

Data de Recebimento: 22/04/2020
Data de Aprovação: 13/10/2020

 

 

 

 

[1] Caldeira (2000) mostra que desde os anos 1990 a gramática da vigilância vem se inscrevendo em todo o tecido urbano, passando a ser considerada como “indispensável”. “Um código que incorpora a segurança em um discurso sobreo gosto, que a transforma em símbolos de status e que vem se espraiando também em famílias de baixa renda.” (CALDEIRA, 2000, p. 297)

[2] O BNH e o SFH consistiam em instrumentos que subsidiavam empréstimos mais acessíveis, mas que mantinham à margem as camadas trabalhadoras, uma vez que estas raramente atingiam as exigências para um pedido de empréstimo. Como aponta Caldeira (2000), apenas 6,4% dos recursos fornecidos pelo SFH entre 1965 e 1985 seguiram para famílias com menos de 3,5 salários-mínimos.

 

[3] Disponível em https://www.emporis.com/statistics/skyline-ranking. Acessado em 16/06/2019.

[4] Disponível em http://www.secom.gov.br/atuacao/pesquisa/lista-de-pesquisas-quantitativas-e-qualitativas-de contratos-atuais/pesquisa-brasileira-de-midia-pbm-2016.pdf/view. Acesso em 7/6/2020.

[6] As existências muradas não são uma exclusividade das elites. Como bem observou Caldeira, a gramática da vigilância vem se inscrevendo em todo o tecido urbano, no que a autora chama “estética da segurança”. “Um código que incorpora a segurança em um discurso sobreo gosto, que a transforma em símbolos de status e que vem se espraiando também em famílias de baixa renda – uma tendência que se acentua sobretudo a partir dos anos 1990, quando tais investimentos são comumente discursivizados como “indispensáveis” (CALDEIRA, 2000, p. 297)

[7] Leitão (2014), inclusive, defende que o edifício atualiza a estrutura dos engenhos, cuja gramática fundamental é a negação daquilo que os cerca.