Introdução – Primeiras palavras
O politicamente correto vem sendo usado como um instrumento que ora promove debates sobre tópicos sensíveis como racismo, LGBTQIA+fobia, capacitismo, machismo, entre outros; ora esses mesmos tópicos sensíveis são vistos por uma outra parcela da sociedade como tópicos que não precisavam de tanto cuidado ao ser elaborado, uma vez que partem do pressuposto que não se deve construir cuidado para falar do outro uma vez que “somos todos iguais”.
Nessa tensão, o primeiro grupo promove que os sujeitos tenham cuidado no discurso para que não promovam/marquem/chancelem preconceitos que estão em voga na sociedade, enquanto o segundo grupo acredita que está havendo uma censura do discurso, algo presente nos dizeres: “Hoje em dia não se pode falar mais nada, não se pode brincar, fazer piada” são falas frequentes por quem é chamado a atenção por não ter esse cuidado no discurso. Orlandi (2017, p. 209) coloca que: “Tratamos, em discurso, da língua funcionando no mundo por e para sujeitos. Acontecimento do significante no ser, nos sujeitos. No processo de significação não tratamos do sentido em si, mas dos efeitos de sentidos produzidos entre sujeitos no mundo.” Desse modo, há os preconceitos, que podem ir através dos discursos, operacionalizados pela língua, e há os sujeitos dos discursos que são atravessados pela língua e por sua historicidade. Importante destacar que esse tipo de movimento não ocorre só no Brasil, mas em diversos lugares do mundo, como: Reino Unido, Canadá, Austrália, alguns países da Europa, Uruguai, Colômbia, entre outros2.
A questão é: monitorar o discurso é uma ferramenta eficaz no processo de reflexão? Seguindo a linha de perguntas que podem orientar a análise deste trabalho: o preconceito deixaria de existir se todo mundo adotasse o modo de falar do politicamente correto? A promoção da reflexão, colocando aquilo que pode ou não ser dito, é a melhor estratégia? E quando aquilo que é dito dói no outro? E quando a pessoa que enuncia é taxada como preconceituosa? São inúmeras questões, sem a menor pretensão de serem respondidas, mas que servem de molas propulsoras para uma reflexão que, a meu ver, é pertinente e mexe com os ânimos dos sujeitos na sociedade.
Para que pudesse fazer uma reflexão sobre essa tensão, elegi algumas entradas do “Glossário Às Avessas: Desvendando conceitos e desconstruindo padrões”3 de autoria de vários coletivos como: Mulheres Negras do Conselho de Desenvolvimento Econômico Sustentável, do Grupo de Pesquisa Ativista Audre Lorde e o Coletivo de Pesquisa Ativista em Psicanálise, Educação e Cultura. Esse instrumento linguístico, como coloca Auroux (2014), é base de análise dessa discussão sobre o politicamente correto, trazendo a linguagem como processo elementar dessa reflexão.
Ao longo deste trabalho, vou elencar aquilo que demonstra, na forma da expressão da violência, os índices dos preconceitos na sociedade brasileira, depois focarei na análise de trechos e verbetes do Glossário, refletirei sobre a síndrome de Policarpo Quaresma (personagem principal do livro “Triste fim de Policarpo Quaresma” de Lima Barreto) - em que há certa ilusão de que ao eliminar termos/expressões da língua portuguesa, chegaríamos a uma língua nossa e que vocalizasse de forma plena e sem preconceito o discurso na nossa língua materna -; e na conclusão agrego um pouco do que foi refletido e convido os sujeitos que lerem este trabalho a pensar sobre esses mecanismos do politicamente correto: é o modo mais eficaz? A totalidade da adesão findaria os preconceitos?
Somos todos preconceituosos?
A delicadeza de discutir sobre o politicamente correto é que podem ter uma leitura binária, e bastante equivocada, de que quem é contra seja preconceituoso ou de que quem é a favor, seja aliado das vítimas de preconceito. E quando refletimos sobre linguagem/discurso, as interpretações não são binárias, além de apresentar nuances e perspectivas que são difíceis de estancar em polos tão distantes como ser contra ou a favor.
Acho que cabe nesse primeiro momento mostrar os vestígios de como somos preconceituosos em nível de sociedade. O primeiro ponto é a questão do racismo, uma vez que o arquivo que analisaremos aqui coloca verbetes sobre questões majoritariamente raciais, esse preconceito que se traduz em números significativos no Brasil de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública4, em que os índices de injúria racial e racismo aumentaram de 2023 para 2024; injúria racial teve 12.813 e passou a 18.200; racismo 14.919 passou em 2024 para 18.9235. Importante salientar sobre os assassinatos por conta de incursão policial em territórios marginalizados nas grandes cidades brasileiras, como Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo, cujas vítimas, em sua maioria, são pessoas negras. O genocídio do negro no Brasil é algo que atravessa a nossa história, Abdias do Nascimento (falecido em 2011) tem um livro chamado “O Genocídio do negro brasileiro – Processo de um racismo mascarado” de 1980, em que o autor vai desmantelar o argumento de democracia racial e apontar como o negro tem sido vítima ao longo da história do Brasil, além de mostrar que o argumento que os negros prosperam e são respeitados no Brasil é uma falácia.
O segundo momento é importante para pensarmos sobre a violência de gênero, em que coloco destaque ao feminicídio. Segundo o Anuário, de 2023 para 2024 o número teve um crescimento de 1.475 para 1.492 casos. Em casos de lesão corporal dolosa, de 2023 para 2024, passou de 256.584 para 257. 659; números ainda muito altos.
Já o terceiro e último momento, pode-se pensar sobre a questão de sexualidade e gênero. O Supremo Tribunal Federal já tinha reconhecido homofobia e transfobia como crimes de racismo em 2019; em 2023, o STF fez a equivalência com injúria racial, ou seja, identificou em nível individual os crimes, não precisando passar pela ideia de coletividade. Essa diferença foi colocada pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos que argumentou a necessidade de equiparação para a proteção do indivíduo. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança, o Racismo por homofobia ou transfobia passou de 1.633 (2023) para 2.480 (2024); na parte de Registro de crimes contra pessoas LGBTQIAPN+6 foi de 4.836 para 4.929. Ainda nessa perspectiva, mas destacando a questão de gênero, segundo um dossiê da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), o Brasil no ano de 2025 ficou pela 16ª vez seguida como o país que mais mata pessoas transexuais e travestis7.
Todos os dados expostos nessa parte do trabalho apontam para alguns preconceitos que estão em circulação na sociedade brasileira, mas é importante deixar registrado que tais números devem ser ainda maiores, uma vez que as subnotificações são significativas. Muitas vítimas decidem não abrir ocorrência em uma delegacia ou no modo online por vergonha, ou por não acreditarem que a justiça conseguirá resolver seus problemas.
Entre os preconceitos não colocados aqui, há: o capacitismo, o etarismo e o classismo. Enquanto o racismo, a homofobia, a transfobia, o capacitismo, o etarismo são marcados por palavras, o classismo não é marcado por palavras que tenham uma ressonância dentro do politicamente correto, é marcado pela estrutura social que funda a sociedade de classes. Como nos ensina Pêcheux (2009, p. 82), “(...) a ‘indiferença’ da língua em relação à luta de classes caracteriza a autonomia relativa do sistema linguístico”. Por exemplo, o uso de “morador de rua” e de “pessoas em situação de rua” pode mostrar uma ação do politicamente correto, mas serve para estabelecer uma diferença entre pessoas que não têm onde morar e pessoas que ficam na rua, mas têm onde morar8.
Tudo isso para apontar os preconceitos que constituem a sociedade brasileira e estabelecer um caráter de análise em que se pense naquilo que está marcado na língua e o que não está marcado, ou seja, silenciado. E tentar responder às perguntas: se todos falassem na perspectiva do politicamente correto, o preconceito cessaria? Ao adotar o politicamente correto, estamos fazendo as pessoas refletirem sobre os preconceitos na sociedade? Essa é a melhor estratégia?
Na próxima seção, vou abordar o Glossário, que é o instrumento linguístico para pensar o politicamente correto brasileiro e pensar no conceito de verbetização para dar conta desse instrumento linguístico que é colocado como “às avessas”.
Glossário às avessas – verbetizando o inverbetizável
O Glossário Às Avessas: Desvendando conceitos e desconstruindo padrões foi um Glossário escrito por vários grupos que trouxeram a perspectiva de um discurso que não causasse “dor, vergonha, discriminação e preconceito”. Segundo o grupo, o glossário foi feito:
com intenção de provocar incômodo e desconforto que levem a mudança. Não é natural causar dor. Não é natural que a comunicação e a língua materna classifiquem pessoas em superiores e inferiores, de acordo com a cor da sua pele. Não é natural banalizar preconceito. Nossa perspectiva se opõe à ideia de uma suposta neutralidade na linguagem, pois reconhecemos que ela é o campo primordial onde se travam batalhas pela construção de práticas hegemônicas. Contudo, é crucial salientar que a linguagem não apenas pode, mas também deve ser um espaço de possíveis resistências. (2024, p. 13. Grifos meus)
Interessante e importante que o grupo de autores já parta da perspectiva da oposição de ideia sobre a “suposta neutralidade na linguagem” destacando que a linguagem é um “campo primordial onde se travam batalhas pela construção de práticas hegemônicas”, no entanto, o grupo reconhece que esse espaço também pode apresentar “possíveis resistências”. Dessa forma, o instrumento linguístico se alinha ao que é postulado pela Análise de Discurso Materialista, que não há neutralidade nos discursos, todos somos interpelados pela ideologia (Pêcheux, 2009).
Paralelamente, o grupo de autoria elabora a partir de uma visão que a língua, logo os sujeitos, age de maneira intencional – “com o intuito de provocar incômodo” –, perdendo de vista a contradição, o inconsciente e que “o sistema da língua é, de fato, o mesmo para o materialista e para o idealista, para o revolucionário e para o reacionário, para aquele que dispõe de um conhecimento dado e para aquele que não dispõe desse conhecimento” (Pêcheux, 2009; p. 81). Essa sequência aponta como a língua precisa de uma historicidade para fazer sentido e essa historicidade não promove apenas um lado da história, porque, como os autores colocam, a linguagem possui “resistências”. O Glossário é importante, pois levanta o debate, coloca a temática em jogo, produz a reflexão e atinge o “objetivo primordial com este Glossário às Avessas (que) é promover um debate”.
Ponto importante nessa discussão é que o Glossário, como um instrumento linguístico, como nos ensina Auroux (2014), ou seja, como uma ferramenta que gramatiza a língua e promove reflexão sobre termos que não devem ser usados, uma vez que rememoram um passado em que esses termos eram usados, a priori de forma consciente, como expressões racistas. Nesse sentido, o Glossário adotaria a mesma lógica de um dicionário, mas vendo o seu sentido do preconceito latente, além de abarcar expressões e não apenas palavras.
Entretanto, acredito que cabe aqui um termo que formulei em vários trabalhos meus (Moura 2018, 2020 e 2021) que é verbetização. A verbetização é um conceito que se distingue da dicionarização, primeiro porque a dicionarização está num âmbito de chancela institucional e de legitimar uma palavra na língua, além, claro, de ter um cuidado lexicográfico com a formulação do verbete e elencar os sentidos correntes na sociedade. Já a verbetização tem um processo mais fluido, ainda que não menos instrumental, em que essa elaboração metalinguística serve para registrar um termo, uma expressão, uma palavra, sem a necessidade do cuidado de um lexicógrafo, um especialista em lexicografia. Por isso, mesmo não tendo um lexicógrafo entre os autores, os verbetes do Glossário às avessas funcionam como elementos de verbetização ao invés de funcionarem como a dicionarização, uma vez que traçam essa fluidez conceitual e marcam as necessidades do debate que o instrumento linguístico pretende promover.
Focado nesse debate, na reflexão proposta pelo glossário e sem desconsiderar as mazelas preconceituosas que assolam os sujeitos na sociedade, venho colocar que talvez essas tentativas de cercear o discurso ou as expressões verbetizadas no Glossário sejam apenas cosméticas. Isso não significa que seja tudo cosmética, há verbetes que, de fato, refletem expressões que não devem ser mais usadas, porém, há outros itens lexicais que não sejam pertinentes a proibição do uso, levando em consideração a historicidade da língua e as resistências que os grupos minorizados fazem para vencer os preconceitos diários.
Segundo o grupo de autores, “Certas palavras carregam contextos intrínsecos” (2024; p. 14) e como tais marcas linguísticas, que estabelecem alta circulação, têm essa “essencialidade” particular? Depois que ganham sentidos outros e popularizam, dessa maneira, nos discursos dos sujeitos, ainda continuam remetendo a esse “intrínseco”? E ao ganhar novos sentidos, perdem essa “mensagem original” ganhando novos sentidos (idem). Parece que há aí um movimento por parte das autoras/dos autores que já dão uma resposta ao uso de palavras/expressões que estão no Glossário. Mais adiante, continuam:
A língua do colonizador até mesmo altera os significados de expressões afetivas entre famílias negras: enquanto as avós, matriarcas em suas famílias, usam o termo “neguinha” afetuosamente para suas netas, os descendentes da colonização usam esse mesmo termo como um insulto para humilhar ou desqualificar mulheres negras. (2024; p. 14)
Mais uma vez, a resposta é dada ao que toca em quem enuncia e quais as condições em que se enuncia. A questão não é o “sentido em si” da palavra, é quem enuncia e eu acrescentaria que depende da Formação Discursiva e das Condições de Produção em que a palavra é proferida. Logo:
uma palavra, uma expressão ou uma proposição não tem um sentido que lhe seria ‘próprio’, vinculado a sua literalidade. Ao contrário, seu sentido se constitui em cada formação discursiva, nas relações que tais palavras, expressões ou proposições mantêm com outras palavras, expressões ou proposições da mesma formação discursiva. (Pêcheux, 2009; 147-148).
A ideia de um Glossário “às avessas” é proporcionar uma reflexão que não ocorra ao final de nenhum texto com a listagem (glossário) de palavras que possivelmente o leitor não conheça, mas já abra com as definições e com a discussão de palavras que os leitores já conhecem e, assim, possa não falar mais tais palavras/expressões. Neste sentido, o grupo de autores coloca que: “O Glossário às avessas é exatamente o contrário: são termos amplamente conhecidos e utilizados que necessitam deixar de sê-los”. A ideia posta no Glossário é que, com aquelas palavras e expressões, os leitores consigam “compreender a dor causada por palavras aparentemente inocentes que, na realidade, carregam consigo a dor da exclusão e a marca da diferença como estigma”.
O primeiro verbete a ser analisado é algo que provavelmente é dito por pessoas não negras e que coloca a questão de ter amigos negros que tiraria ela da pecha de racista. Veja abaixo:
Até tenho amigos que são negros
Trata-se de expressão utilizada por indivíduos que, para afastar a alcunha de racistas, alegam que o simples fato de possuir amigos negros invalidaria qualquer possibilidade de ser racista. O problema em si não está no uso da expressão “negros” – que não tem sentido pejorativo na frase –, mas no contexto em que a frase é usada, como pretexto para tentar eximir a responsabilidade de alguém por um comportamento racista. Recomenda-se a abolição do uso da expressão. (2024; p. 23)
A maneira como o verbete é formulado coloca algumas questões interessantes a serem destacadas. Primeiro pela isenção do termo “negro” como uso problemático, uma vez que não o seja de fato, o problema é uso em determinadas condições ao ser taxado como racista e usar possíveis amizades com pessoas negras para “tentar” se eximir de atitudes e ações racistas. Segundo ponto importante é “contexto” e “pretexto” apontando que o sentido não está na frase, mas sim na formação discursiva de quem a enuncia e nas condições de produção em que ocorre, dessa forma, há as condições ligadas ao “contexto” e com a finalidade de se eximir do preconceito “tenho amigos negros, logo não posso ser preconceituoso” operando com o “pretexto”. O terceiro é o termo “Até”, a preposição funciona como um limitador físico, no caso do enunciado, opera como um validador moral de limite que não o coloque no balaio racista. Isso dá a entender, nas fissuras do discurso, que é aí que ocorre a legitimação do ato racista.
Outro ponto a ser destacado é colocar esse enunciado proferido por pessoas negras, sabe-se que no Brasil a identificação enquanto negro é vasta e passa pelo crivo de características fenotípicas que vão da tonalidade da pele, tipo de cabelo e traços no rosto. Há, assim, um espectro de cor em que pessoas negras mais claras9 (ou pardos), às vezes, e a depender do lugar onde vivem, não se identificam como negras e podem reproduzir atos e falas racistas, ainda que elas também sejam alvo de um sistema que as marginalizam.
O outro verbete é sobre um estigma que pessoas com os cabelos crespos sofrem por conta da textura. Segue o verbete abaixo
Cabelo bombril
A expressão tem sido causa de muito sofrimento, sobretudo entre as meninas negras, que têm no cabelo, como qualquer criança, uma parte crucial na construção de sua identidade e autoestima. Refere-se à textura do cabelo crespo das pessoas negras. Devido à violência da assertiva que apresenta, não deve ser substituída por nenhuma outra; ao contrário, evidencia a necessidade de um curso de letramento racial que contribua para o processo de conscientização das pessoas sobre o povoamento mestiçado brasileiro. (2024; p. 28)
O verbete em destaque coloca algo que fere a autoestima, principalmente de meninas negras, por trazer um elemento que faz parte do utensílio de limpeza, que é a palha de aço. A marca “Bombril” funciona de forma metonímica nesse processo, uma vez que é uma das marcas de palha de aço mais famosas do Brasil. Quando é usado o termo “Bombril” como um modificador para o significante cabelo, há um rebaixamento, porque opera a ideia de limpeza, de doméstico, de um elemento que é tão duro que dá para fazer limpezas pesadas em panelas e utensílios de cozinha. Há também, isso não de maneira imediata, esse campo semântico de que pessoas negras devem ficar retidas apenas em afazeres de serviço geral e da casa, não operando de forma intelectual.
Preciso chamar atenção, porque, para além da comparação desnecessária e que opera nos sentidos citados, há uma memória do povo negro no que se relaciona ao cabelo. O cabelo é uma ferramenta de resistência10, mas apresenta também uma gama de memórias, principalmente, entre gerações de uma família. Em um de seus estudos, Schucman (2018) aborda o relato de Mariana, uma moça que vinha de uma família inter-racial, onde aborda que os primos brancos e o irmão preto faziam uma roda e zombavam dela por conta do cabelo:
Eles faziam uma roda e eles puxavam porque a minha mãe não tinha paciência para cuidar do meu cabelo, o meu cabelo era armado, ela amarrava, ela estava com preguiça de arrumar e botava touca. Às vezes, estava um calor insuportável eu tinha que ficar com aquela touca para esconder o cabelo, e eu estou falando dos meus 4 anos, 5 anos; eu me lembro que eles faziam uma roda e puxavam a touca e o meu cabelo aparecia enorme, e eles ficavam me empurrando de um lado para outro nessa roda e rindo do meu cabelo; ‘olha que cabelo ruim’, ‘olha que cabelo de bombril’ e ninguém me defendia; nem os adultos quando viam. (Schucman, 2018; p. 105-106)
A memória do sofrimento causado por outras pessoas é algo que constitui os sujeitos negros, e como se pode observar, até por outras negras próximas (no caso o irmão e, possivelmente, o pai também preto) causava esse sofrimento.
Há mulheres negras que fazem alisamento por uma imposição estética, seja por conta da sociedade, seja por conta da própria família com os pensamentos racistas que circulam na sociedade. E há, também, mulheres negras, mais velhas ou mais jovens, que continuam fazendo alisamento porque querem fazer. E isso não deslegitima o orgulho da raça e nem as faz menos negras. O que não pode é uma estrutura em que se usa “Cabelo Bombril” ser uma estratégia discursiva de diminuir o sujeito negro, aqui em específico as mulheres negras, como uma forma de hierarquizar quem é mais ou quem é menos pautado pelo tipo de cabelo. O termo “Bombril” por si só não é racista, mas é nesse movimento de adjungir à palavra “cabelo” e ser usado nas condições de zombar, rir e desqualificar que funciona num racismo contra mulheres/meninas negras.
Os próximos dois verbetes serão analisados juntos, pois operam quase da mesma forma e foram revistos na mesma época. Seguem os dois abaixo:
Escravo
Este termo desumaniza os africanos, retratando-os como meros objetos desprovidos de agência e subjetividade. As pessoas escravizadas que foram trazidas ao Brasil eram indivíduos com histórias, realeza, dignidade, camponeses, homens e mulheres subjugados contra sua própria vontade. Substituir “escravos” por “pessoas escravizadas” e “escravidão” por “escravização” é mais adequado, reconhecendo a violência e a desumanização implícitas no sistema opressivo. (2024, p. 33)
Índio
A palavra “índio” é um termo que foi historicamente utilizado de forma equivocada para se referir aos povos indígenas das Américas. Chamar os povos indígenas de “índios” é considerado pejorativo porque é uma forma de categorização errônea e desrespeitosa. Essa expressão não reconhece a diversidade cultural, histórica e linguística das populações originárias, perpetuando estereótipos e simplificações prejudiciais. Atualmente, é preferível especificar o nome da etnia ou nação indígena em questão. (2024, p. 40)
A palavra “escravo” foi utilizada bastante no processo de colonização das Américas, por conta da mão de obra que era capturada na África e por conta dos povos originários que viviam nos territórios, que hoje denominamos como Brasil, e acabavam sendo escravizados no processo de apropriação daquilo que viria a ser os Estados Nacionais da América Latina. Em termos de Brasil, povos africanos e povos indígenas sofreram no processo de colonização, ainda que levantassem bastante resistência contra os portugueses. Dessa forma, pessoas dos países da África e povos indígenas se contrapunham à Coroa Portuguesa e deixaram marcas no imaginário brasileiro e em obras de arte (como as pinturas de Jean-Baptiste Debret).
A denominação “escravo” já era utilizada pelos povos europeus, um exemplo é na época do Império Romano, em que outros povos do continente eram capturados e serviam como escravos. Com o processo de colonização das Américas, Portugal começou um empreendimento-sanguinário que foi capturar pessoas em países Africanos para servir no processo de expansão da colonização. Esse negócio durou quase quatro séculos. Gerando para o continente Africano o estigma de uma mazela da humanidade e que se espraia até os dias atuais com a desumanização dos sujeitos negros, o imaginário de uma África miserável em sua totalidade, a ideia de que o continente tem povos primitivos e a marca da escravidão.
Quando se reivindica a mudança de “escravo” para “pessoa escravizada” há um movimento semântico e sintático nesse processo. O primeiro é que a palavra escravo, que poderia continuar sendo usada, ficou engessada ao processo de escravização dos povos africanos no imaginário brasileiro. Dessa forma, falar escravo no Brasil não abriria a memória, no primeiro momento, dos escravos europeus na época do Império Romano, se entenderia que se trata de uma pessoa negra. Em termos sintáticos, mas não menos semânticos, a ideia da troca é que se tira um nome com uma carga de agentividade e passa para uma expressão com uma perspectiva de “paciente”. O africano não é escravo, foi escravizado por um processo de captura e jogo político de países Europeus. O negro sofre a ação, ela não é dada, é sofrida por um algoz, no caso os portugueses. Ao colocar “pessoa” coloca-se a ideia de que mulheres, e não apenas homens, sofreram com esse processo. Há toda uma memória discursiva que opera nesse item linguístico, uma memória que perpetua essa ideia de escravo igual a negro, então se isso é produtivo discursivamente, cabe fazer a mudança e mostrar que não é dado, é fruto de uma violência histórica e que antes desse processo, os africanos eram diversos e plurais, também com seus jogos políticos e dominando outros povos, mas não fica dado que é inerente e posto que sempre foram escravos. Aí a necessidade de marcar a diferença de escravo para escravizados, eles não eram, foram violentados para serem.
Ao que se relaciona à palavra índio é um pouco diferente, mas deságua na mesma reflexão. Índio foi a denominação que os colonizadores, portugueses e espanhóis, deram aos nativos das terras do continente americano. Quando se denomina um indivíduo como “índio”, lança-se mão da denominação do colonizador que, ao chegar, pensava que tinha chegado às terras das Índias (zona asiática à volta do oceano índico), e ao olhar os nativos os denominou como “índios” palavra não existente, mas começou a se referir de forma genérica a qualquer indivíduo nativo. Com o passar do tempo, os indígenas vão se apropriando dessas discussões e começam a reivindicar essa denominação, fazendo a primeira mudança para “indígenas” e mais atualmente para “povos indígenas” ou “povos originários”. Em um vídeo no canal do site YouTube, o professor Daniel Munduruku, explica essa distinção:
A palavra índio é uma palavra que está no nosso vocabulário e também no vocabulário dos povos indígenas, porque é algo que foi sendo repetido à exaustão. Nos anos 1970, quando essa juventude começou a olhar e a se perceber como parte de uma sociedade maior, foi assim que começou o movimento indígena. Essa juventude usou esse termo índio como uma forma de luta, como uma forma de identificação daqueles que eram parceiros. Então se essa palavra é usada por uma liderança, é nesse sentido. Quando é usada pela sociedade brasileira, é no sentido do apelido, no sentido do desdém, no sentido do estereótipo, no sentido da ideologia. […] Porque ela está me colocando numa classificação, digamos, de menos humanidade. E aí a gente tem que brigar contra isso. Nesse sentido, aparentemente, é bom que se informe as palavras índio e indígena não são as mesmas coisas. A maioria das pessoas acha que uma é derivação da outra, mas não é. A palavra índio, no próprio dicionário está dito isso (...) é uma palavra inventada, não tem significado efetivo. (...) procurem no dicionário (...) o primeiro significado que aparece lá é que índio é o elemento químico número 49 da tabela periódica. (...) Se você buscar pela palavra indígena, você vai descobrir que indígena significa originário. (...) (Munduruku, 2018)
“Índio” e “indígena” operam em memórias diferentes para alguns sujeitos indígenas. Enquanto a primeira é a denominação pelo colonizador, a segunda é o movimento político que os indígenas fizeram para sair desse enlace da memória de denominado e passa a se denominar. Movimento que mostra a mobilização política que os indígenas fazem desde sempre, mas que ganha maior protagonismo com o processo de redemocratização do Brasil. Quando consulto o verbete índio no dicionário Mini Aurélio, tem as seguintes entradas: i) Aborígene das Américas, habitante das terras americanas, ao chegarem os primeiros europeus, nos séculos XV e XVI. ii) Indivíduo que pertence a grupo étnico descendentes dos aborígenes americanos. iii) Relativos a índio. E há uma segunda entrada para colocar o elemento químico: Elemento de número atômico 49, metálico. Já a palavra indígena apresenta quatro entradas: i) Originário de determinado país, região ou localidade; nativo. ii) Relativo a índio, ou aos índios em geral. iii) Pessoa natural do lugar ou do país que habita; nativo. iv) índio.
Dessa forma, pode-se perceber um esforço de sair dessa denominação feita pelo colonizador, ainda que muitos indígenas usem ou prefiram ser chamados assim (de índio) isso não silencia ou desmobiliza o movimento por parte dos indígenas de: primeiro se desvencilhar do nome dado pelo colonizador; segundo promover as diversas identidades que há entre os povos indígenas e terceiro mostrar a coletividade e não cair num individualismo fantóchico11 de uma identidade coringa que promove uma generalização que cabe apenas ao branco. Se há necessidade da demarcação de diferenças (e há!) que marque pela pluralidade dos povos.
O próximo verbete é polêmico e nem um pouco consensual, porque envolve memória e etimologia, não apresentando qual origem, de fato, tem tal expressão. Segue abaixo o verbete:
Criado-mudo
O entendimento de que o termo seja racista não é unânime nem entre os acadêmicos. É utilizado para descrever um tipo de móvel com gavetas frequentemente colocadas ao lado das camas. Alguns pesquisadores debatem se a expressão não pode estar relacionada à figura das pessoas escravizadas que desempenhavam funções domésticas, como buscar água e o penico aos “senhores”. Essas pessoas eram muitas vezes instruídas a serem discretas e evitar perturbar o ambiente. Elas eram encarregadas de segurar objetos para seus proprietários. Os linguistas que discordam afirmam que a palavra possui origem na língua inglesa. Na dúvida, a expressão pode ser substituída por “mesa de cabeceira”. Pg 29-30
O verbete abre com a ideia de que não há consenso sobre o termo ser ou não um problema em ser usado, quando coloca “O entendimento de que o termo seja racista não é unânime nem entre os acadêmicos”, ou seja, talvez o termo nem precisasse entrar no Glossário. Como se coloca no início, já há uma dúvida, porque: “Alguns pesquisadores debatem se a expressão não pode estar relacionada à figura das pessoas escravizadas que desempenhavam funções domésticas”, mas ao pensar sobre o que motiva a relação não tem nada além do que a memória do período de escravização; não há uma correlação ao termo “criado”, nem ao termo “mudo” diretamente com as questões racistas. O que há é um deslizamento de sentido entre a palavra “criado” e o processo de escravização negra com a subserviência que os senhores brancos exigiam dos sujeitos escravizados.
Como o próprio verbete aponta: “Os linguistas que discordam afirmam que a palavra possui origem na língua inglesa”, dessa maneira, evoca-se a língua inglesa e o termo “dumbwaiter” (elevadores pequenos usados para fazer transporte de alimentos e bebidas ou pode se referir aqueles carrinhos que tem em hotéis e restaurantes) uma correlação quase literal em que “dumb” é mudo e “waiter” é garçom. Porém, há algumas vertentes que também relacionam o termo como de origem francesa12, assim, criado-mudo teria sua origem no século XVIII na França, na qual há uma crença em que se contratavam pessoas para dormir nos quartos dos seus empregadores e precisavam ficar calados para não atrapalhar o sono; e dentro dessa mesma vertente há uma outra mais parecida com a vertente inglesa em que o móvel era “guéridon” (mesa em português), tendo uma mudança no século XVII para apoiar objetos pessoais.
Interessante nessa análise é que, independentemente do termo ter ou não origem racista, ele opera com a ideia de um trabalho e um trabalho que é subserviente, porque é necessário estar “mudo”, daí esse incômodo por parte do movimento negro e a analogia com a escravização. Mas isso por si só não comprova nada, além de as pessoas não terem acesso à origem do termo, criado-mudo ganha o status de móvel na circulação da língua portuguesa e nessa variação de poder ou não falar, fica impedido e silenciado sem ter uma justificativa plausível. Como nos ensina Orlandi (2017):
(...) não há uma relação termo a termo entre linguagem, pensamento e mundo. E, no processo de identificação, não entra apenas a ‘vontade de verdade’. Mesmo porque o sujeito não tem acesso direto ao que o constitui como tal, já que neste processo intervém ideologia e inconsciente. Ou seja, ele não é transparente nem para si mesmo. (p. 209)
Esse fetiche com a origem do sentido e a partir daí cercear o discurso mobiliza até certo ponto, porque de alguma maneira se perde de vista a ideia de resistência e que é pelas frestas que todos os movimentos, em especial aqui os sujeitos negros, fazem/fizeram para se fazerem presentes.
Os dois últimos verbetes operam com a ideia de quem fala e nas condições em que fala, uma vez que os termos podem ser racistas ou não, a depender das condições de produção. Seguem abaixo:
Negão/negona
As expressões “negão/negona” são consideradas inadequadas e ofensivas quando usadas para se referir a uma pessoa negra. Esses termos são exemplos de linguagem uso dessas expressões “negão/negona” é desrespeitoso e pode causar constrangimento e desconforto para a pessoa envolvida. Isso ocorre porque a expressão reduz a pessoa a uma característica física, ignorando sua individualidade, talentos e personalidade. Portanto, é fundamental evitar o uso dessas expressões e optar por uma linguagem que promova respeito e inclusão.
Negrinha/Neguinha
O termo “negrinha” é considerado pejorativo e ofensivo. Ele carrega uma carga histórica de racismo e discriminação racial. Ao se referir a uma pessoa com base na cor de sua pele de uma forma diminutiva ou com conotação depreciativa, ocorre uma desconsideração de sua dignidade e individualidade. Em termos históricos, “negrinha” era o termo relacionado à escravidão e ao abuso sexual perpetrado pelos senhores.
As duas entradas trabalham com quem fala e quais as condições em que enuncia. O termo negro e preto possui uma longa discussão sobre qual deveria ser escolhido para denominar pessoas com a pele escura. Por um tempo significativo, o Movimento Negro Nacional reivindicava a denominação negro, e preto ficou por um tempo escanteado por fazer referência à cor e não à raça. Depois, preto vira uma marca de afirmação de pessoas pretas retintas (com a tonalidade da pele mais escura), enquanto o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) começou a colocar negro como a junção de pretos e pardos (pessoas com a tonalidade de pele mais clara, mas ainda com traços fenotípicos que remetiam a indígenas e a africanos). Lembro que por volta de 2008, houve uma onda do politicamente correto para que essas denominações fossem deixadas de lado para chamar de “afrobrasileiro”, sendo assim o termo politicamente correto, sem focar na questão da cor. Vou dizer que o brasileiro, de uma maneira geral, e isso significa colocar pessoas de todas as raças e cores, tem uma dificuldade de denominar pessoas que sejam não brancas voltadas para os fenótipos indígenas e africanos. Então expressões/palavras como: moreno/a, moreninho/a, marrom bombom, moreno/a jambo, mulato/a, queimadinho/a de sol, bronzeado/a, dar cor do pecado e por aí afora... são inúmeras expressões/palavras que fazem os sujeitos tentarem escamotear as denominações “preto” e “negro” e tudo isso, por acharem que essas palavras carregam uma forma de ofensa a quem é direcionado (Cf. Schucman, 2012 e 2018).
Se afirmar como negro (pretos e pardos) ou preto (para quem tem a pele mais escura) passa a ser uma consciência política e motivo de valorização da cor da pele e dos seus traços fenotípicos. Junto a essas denominações também orbitam outras denominações que não são racistas, mas a depender das condições de quem as profere podem ser, como: nego/a, neguinho/a, negão/ona, negrinho/a. Interessante pensar que há inúmeros exemplos de uma dessas palavras sendo utilizada com valor positivo, é o caso de “Você é um negão de tirar o chapéu” da música “Meu ébano” composta por Nelson de Morais Filho e Paulo Roberto Rezende e cantada por Alcione, um dos ídolos da cultura negra no Brasil. Há também “Negona dos olhos terríveis” composta por Gustavo Ruiz, Julio César de Souza, Roosevelt de Carvalho e Liniker de Barros, esta última também sendo a cantora da música e também sendo um dos expoentes da música negra da atualidade no Brasil.
Há o uso de “nego” e “neguinho” de forma a colocar como uma espécie de pronome indefinido, forma genérica, sempre no masculino e sempre no singular. Um texto de João Ubaldo Ribeiro chamado “Questões Gramaticais” aborda um pouco sobre isso e a canção “Neguinho” de Caetano Veloso também em que dá exemplos dessa forma genérica de denominar com a palavra “neguinho” como: “Neguinho fura o sinal” e “Neguinho compra 3 TVs de plasma, um carro GPS e acha que é feliz”. A questão posta no texto de João Ubaldo Ribeiro é pertinente e usual até hoje, “nego” e “neguinho” são denominações que não têm a ver com a cor/raça a quem é direcionado, no entanto, como parte da letra de Caetano Veloso aponta/retrata questões negativas em que o autor do ato não realiza ações lidas como positivas. Há nesse jogo discursivo uma tensão que ora vai trabalhar as palavras de forma positiva e carinhosa (como nos exemplos da Liniker e da Alcione) e outras de maneira negativa, mas quem não se direciona à raça/etnia do autor da ação. Porém, quando se coloca que ações negativas, mesmo quando feitas por sujeitos brancos, são denominadas como “nego” e “neguinho”, não há uma memória discursiva que reitera o racismo do passado e dos dias atuais? E que continua reiterando o lugar do “nego” de fazer coisas negativas? Não se projeta na língua/no discurso o imaginário do negro como malfeitor?
Os dois verbetes “negão/negona” e “negrinha(o)/neguinha(o)” vão ganhando sentidos a depender de quem os enuncia e nas circunstâncias em que profere. Um sujeito negro que chama o outro de “negão/negona” e “negrinha(o)/neguinha(o)” estaria sendo racista a depender das circunstâncias? Um sujeito negro de pele clara poderia cometer injúria racial/ser preconceituoso racialmente contra uma pessoa com a pele mais escura? Essas hipóteses são importantes, pois evocam a questão da Formação Discursiva e das Condições de Produção, que é quando as palavras ganham sentidos.
Essas palavras não são racistas de forma intrínseca, tanto que podemos observar o sentido valorativo em algumas condições. Em outras, como no conto “Negrinha” de Monteiro Lobato, podemos perceber que há uma carga racista significativa por conta da história de uma menina. Esse exemplo do Monteiro Lobato ganha mais destaque depois de uma pesquisa dos professores João Feres Júnior, Leonardo Fernandes Nascimento e Zena Winona Eisenberg na Revista Dados, denominado Monteiro Lobato e o Politicamente Correto (Cf. Júnior, Nascimento & Eisenberg; 2013) em que prova a relação do autor brasileiro com ideias eugenistas e uma valoração do movimento Ku Klux Kan, movimento esse que pregava a supremacia branca.
Quando os dois verbetes são escritos com as definições de que: “são consideradas inadequadas e ofensivas quando usadas para se referir a uma pessoa negra” e “considerado pejorativo e ofensivo” ignoram o que está no início do glossário quando colocam que: “enquanto as avós, matriarcas em suas famílias, usam o termo ‘neguinha’ afetuosamente para suas netas, os descendentes da colonização usam esse mesmo termo como um insulto para humilhar ou desqualifica mulheres negras.”. Os sujeitos usam essas palavras na sociedade e os sentidos que vão ganhar, vão depender das formações discursivas de quem as enunciam e das condições de produção, gerando um dizer que pode ser racista e preconceituoso ou um uso dessas palavras de maneira afetiva e carinhosa; esse movimento de possíveis sentidos não pode ser ignorado. Afinal, como coloca Orlandi (2017), “A relação palavra e coisa não é nem direta, nem transparente. E, [...] ler é saber que todo sentido pode ser outro. Instabilidade, equívoco, movimento, pluralidade.” (Orlandi, 2017; p. 207). A questão é que a língua já não é mais só do colonizador, ela é dos que ficaram no território brasileiro e construíram o que chamamos hoje de português brasileiro, ou língua brasileira (Cf. Orlandi, 2002 e Soares & Moura, 2022) através de disputas e de resistência. Estão significando em níveis fonológicos, morfológicos, sintáticos, lexicais e discursivos. O colonizador é o Outro e está fora, mesmo que opere dentro de nós brasileiros como uma instância de castração. Nesse sentido, surgem ideias brasileiras que “não falamos bem o português”, ou “Eu não sei falar português”, enquanto falamos, vivemos e fazemos arte com essa língua que é nossa.
Por fim, o verbete “Mulata” para concluir as análises dos verbetes:
Mulata
A palavra “mulata” é frequentemente alvo de debates quando se fala sobre o combate ao racismo. Existem diferentes explicações sobre a origem dessa palavra. Ela é usada para se referir a mulheres negras que têm a pele mais clara. Isso reflete um preconceito, porque faz as pessoas acharem que ter a pele clara é mais bonito e tenta afastar a ideia de que a negritude também é bonita. Além disso, algumas pessoas acham que usar a palavra “mulata” faz com que as mulheres negras sejam tratadas sempre como objetos de desejo. O historiador Nei Lopes, na Enciclopédia brasileira da diáspora africana, registra que “mulata” é uma palavra usada para descrever pessoas mestiças, filhas de mãe branca e pai negro. No entanto, a origem da palavra tem diferentes explicações. Segundo o Dicionário Houaiss (2018), a palavra é sinônima de “jumento”, que é um animal híbrido resultante do cruzamento entre cavalo e jumento.
Primeiro ponto importante desse verbete é que é um verbete que aponta apenas para o gênero feminino, ainda que haja a palavra “Mulato”. O segundo ponto é que esse termo abre um debate sobre o espectro do colorismo na sociedade brasileira, onde o espectro de cores pode chancelar a participação desse sujeito negro na sociedade ou não. Em seu estudo, Modesto (2022) analisa os verbetes da palavra “mulato” em alguns dicionários e observa que, em dois verbetes do mesmo dicionário do século XIX, há uma distinção de gênero proeminente em que o homem “mulato” tem maior condição de ascensão social do que a mulher “mulata”:
O racismo produzirá uma distinção entre brancos e negros, relacionando os brancos à razão e os negros à emoção e ao corpo. O mulato homem, ao abraçar o seu lado branco, demonstraria o desenvolvimento racional a que está propício e que os negros não conseguiriam desenvolver. Mas apenas o homem terá essa capacidade. A mulher mulata seguirá sendo relacionada à emoção e ao corpo, à intensidade sexual e à servidão completa, desempenhando, como já mencionado, as funções de mucama (função doméstica), mãe preta (função familiar) e mulata (função sexual). (Modesto, 2022; p. 12-13)
Pode-se observar que a mulher, nesses verbetes e nessas condições de produção, era lida como um elemento para trabalho; seja na função doméstica (mucama), seja na função do cuidado (mãe preta) e seja como trabalho no âmbito sexual (mulata). Interessante como no “Glossário” é justamente pinçado o termo no gênero feminino e não no masculino. Ao voltar para a definição, os autores colocam: “(...) algumas pessoas acham que usar a palavra ‘mulata’ faz com que as mulheres negras sejam tratadas sempre como objetos de desejo”. Há, desde a época da escravização até os dias atuais, o sentido de “mulata” como elemento sexual da mulher negra. O trabalho de Lélia Gonzales deixa isso em destaque quando a autora coloca:
Quando se diz que o português inventou a mulata, isso nos remete exatamente ao fato de ele ter instituído a raça negra como objeto a; e mulata é crioula, ou seja, negra nascida no Brasil, não importando as construções baseadas nos diferentes tons de pele. Isso aí tem mais a ver com as explicações do saber constituído do que com o conhecimento. (Gonzales, 1984; p. 240)
O sentido de “mulata” opera com esse ideal sexual e isso ganha dimensões maiores quando pensamos que tempos atrás existia uma figura como o Oswaldo Sargentelli, radialista que abriu diversas casas de show no Rio de Janeiro e São Paulo com grupo de mulheres negras, denominadas mulatas, e faziam sucesso principalmente com estrangeiros que assistiam ao show de samba. Sargentelli se denominava como “mulatólogo” por apresentar esse show de samba e logo, as mulheres que dançavam em seu grupo eram chamadas de “Mulatas do Sargentelli13”.
Importante colocar que, assim como o verbete do glossário coloca que: “Existem diferentes explicações sobre a origem dessa palavra” em que há quem aponte que mulato vem da palavra mulus em Latim, que significa mistura do cavalo com a jumenta resultando na mula; e há quem coloque que mulato vem do árabe muwallad ou mowallad, que é o filho de um árabe com uma mãe estrangeira, ou não árabe. No entanto, etimologicamente, não tem como interditar esse item lexical, uma vez que nem há um consenso sobre a origem, mas há uma interdição, porque há uma memória do dizer que se consegue recuperar nos dias de hoje que mulata, e eu diria também mulato, com o sentido sexual e de objetificação do corpo negro, desumanizando e ficando apenas no nível do desejo sexual. É aí que se opera uma memória discursiva em que os “mulatos”, seja qual combinação de raças possíveis (negro com indígena, por exemplo), vão virar um desejo e produto de exportação do Brasil trazendo e reforçando esse mito do país da democracia racial colocando o samba como lugar desse encontro e dessa horizontalidade de raças.
Síndrome de Policarpo Quaresma: a ilusão de uma línguaesterilizada
O personagem Policarpo Quaresma é o principal do livro “Triste Fim de Policarpo Quaresma” escrito por Lima Barreto no início do século XX. A história narra sobre Policarpo Quaresma, um funcionário público que vive no Rio de Janeiro e é subsecretário do ministro da guerra. Policarpo é extremamente nacionalista e acredita que o verdadeiro brasileiro é o indígena (índio na história) e propõe em uma carta que a língua do Brasil seja o Tupi-Guarani14, como na passagem abaixo:
Policarpo Quaresma, cidadão brasileiro, funcionário público, certo de que a língua portuguesa é emprestada ao Brasil; certo também de que, por esse fato, o falar e o escrever em geral, sobretudo no campo das letras, se veem na humilhante contingência de sofrer continuamente censuras ásperas dos proprietários da língua; sabendo, além, que, dentro do nosso país, os autores e os escritores, com especialidade os gramáticos, não se entendem no tocante à correção gramatical, vendo-se, diariamente, surgir azedas polêmicas entre os mais profundos estudiosos do nosso idioma — usando do direito que lhe confere a Constituição, vem pedir que o Congresso Nacional decrete o tupi-guarani como língua oficial e nacional do povo brasileiro. (Barreto, p.47; 2017. Grifos Meus)
Essa ideia de chancelar o Tupi como língua oficial e nacional é uma tentativa de buscar o que há de mais original e genuinamente brasileiro, assim não há mais impasse sobre as “censuras ásperas” que podem ser colocadas a quem fala a língua portuguesa do Brasil. Há um mergulho nesse mar de brasilidade, porque, na mesma carta, o Policarpo coloca:
(...) o tupi-guarani, língua originalíssima, aglutinante, é verdade, mas a que o polissintetismo dá múltiplas feições de riqueza, é a única capaz de traduzir as nossas belezas, de pôr-nos em relação com a nossa natureza e adaptar-se perfeitamente aos nossos órgãos vocais e cerebrais, por ser criação de povos que aqui viveram e ainda vivem, portanto possuidores da organização fisiológica e psicológica para que tendemos, evitando-se dessa forma as estéreis controvérsias gramaticais, oriundas de uma difícil adaptação de uma língua de outra região à nossa organização cerebral e ao nosso aparelho vocal — controvérsias que tanto empecem o progresso da nossa cultura científica e filosófica. (Barreto, p.47-48; 2017)
E nessa tentativa de buscar esse ideal de língua que estaria de acordo com a “organização fisiológica e psicológica” dos brasileiros e “evitando-se as estéreis controvérsias gramaticais, oriundas de uma difícil adaptação de uma língua de outra região” conseguiríamos chegar no “progresso da nossa cultura científica e filosófica”.
O que Quaresma reivindica poderia ser interessante, mas não aponta para as contradições, conflitos e fricções que há em qualquer língua, logo em qualquer sociedade. Por isso, minha ideia aqui é desenvolver a Síndrome de Policarpo Quaresma, porque nessa tentativa de apagar, extirpar termos e expressões que não estão dentro do que é possível de significar sem promover preconceito, propaga-se uma ilusão. O preconceito e os sujeitos preconceituosos vão existir com ou sem termos/expressões, como nos ensina Orlandi:
(...) discursivamente, como sabemos, se não ressoar, se não ecoar na história, como diz M. Pêcheux, não pega, não cola, não permanece. Portanto, não depende só da vontade do sujeito, nem muito menos da elaboração “científica” dos que pensam no linguisticamente correto como sendo capaz de “consertar” a realidade. A palavra vale pelo que significa. Depende da ideologia (jogos da interpretação na formação social, na história). (Orlandi, 2017; p. 215)
Essa ideia de banir e excluir do discurso expressões/palavras que rememoram a possíveis sentidos racistas serve para deixar possíveis aliados numa posição de não saber como agir, além, claro, dos próprios sujeitos que sofrem com essa ação não entenderem para que serve essa mudança de vocabulário.
A síndrome é esse complexo que age de maneira subjetiva e faz dentro de um conjunto de sinais e de sintomas, apresentando diferentes causas. O racismo no Brasil apresenta para pessoas negras inúmeros sintomas que vão desde a violência policial, passando pelo extermínio dos jovens negros nas periferias das cidades, chegando ao adoecimento mental até em negros que não estão vulneráveis economicamente. O discurso é boa ferramenta para tentar construir uma sociedade mais igualitária, mas essa relação de pensamento, língua e mundo de forma unívoca é problemática e pouco funcional. Podemos e devemos propor o debate sobre o racismo, mas sem a ilusão de que as expressões e termos vão dar conta, porque não vão e tampouco que essa discussão fomenta o debate, porque pode excluir os que também sofrem ao não entenderem por que não podem falar mais alguns termos que sempre falaram (a memória e a historicidade operando nos sujeitos da língua).
Conclusão– Um convite ao debate
“Eu sou uma contradição e foge da minha mão
Fazer com que tudo que eu digo faça algum sentido”
Como coloquei no início deste trabalho, o politicamente correto opera com esse constrangimento de quem o adere ou não. É claro que há expressões, termos e falas que os sujeitos não podem usar e, se usarem, precisam enfrentar as consequências que vão do jurídico à chamada de atenção de amigos e colegas em uma roda de conversa. O que a meu ver não cabe, é a censura “às avessas” “proibindo certas palavras para se proibirem certos sentidos” (Orlandi, 2010; p. 76). O racismo, a LGBTQIAPN+fobia, o capacitismo, o etarismo, o classismo precisam ser combatidos e apontados, mas não é a língua que deve pagar com o silêncio de palavras que não se sabe ao certo se tem ou não origem racista. Neste sentido: negão/ona; neguinha/o; nego/a; e criado-mudo não me parecem palavras/termos a serem silenciados, porque podem operar de forma racista, mas podem operar de forma carinhosa e valorativa (aqui não me reporto ao móvel criado-mudo, porém, às outras palavras).
A necessidade que sujeitos da linguagem vêm tendo para construir instrumentos linguísticos e, dessa forma, ficar construindo definições de sentido de palavras, expressões e itens linguísticos me parece uma dificuldade que estamos tendo com a polissemia e a metáfora15. Há sempre a necessidade de definirmos e reorganizarmos o sentido, colocando em formas para serem domesticados, domados e disciplinados. Nesse sentido, acompanho Orlandi nos dizeres:
O político, o social, o histórico e o ideológico se articulam na produção da vida e de como colocamos nomes nas coisas. A língua, por seu lado, se impõe em sua ordem, em seu real. O que significa que não temos controle sobre os sentidos ou sobre os sujeitos, mudando palavras, pensando com isto mudarmos a realidade (sobretudo a social com seu imaginário, sua dissimetria e seus valores ideologicamente constituídos). (Orlandi, 2017; p. 216)
É aí que opera a Síndrome de Policarpo Quaresma, nessa tentativa de encontrar uma língua estéril, asséptica, sem questões para promover as diferenças. Enquanto no personagem de Lima Barreto, reivindica-se a oficialização do “Tupi”, nos dias atuais procuram-se estratégias de como deixar esta língua, que foi do colonizador e é atravessada pelas línguas indígenas e pelas línguas africanas, menos preconceituosa. Esquecem ou apagam a resistência que marca na língua – para além das contribuições lexicais de línguas indígenas e línguas africanas – há na fonologia, morfologia e sintaxe a memória de línguas que foram silenciadas. Por isso, nosso português é diferente do português europeu, ainda que esse tenha sido a demonstração de poder do colonizador.
Então, podemos concluir que as palavras não portam os sentidos e que nenhuma delas precisa ser silenciada. As condições de produção em que são enunciadas/escritas ou quem as enunciam/escrevem é que vão apontar os sentidos que elas terão. E, dessa maneira, vamos enfrentando o preconceito de frente de quem sofre e de quem age, e tendo acesso aos “escombros do inconsciente” para trabalhar e convidar o sujeito preconceituoso ao debate e à reflexão. É claro, sabendo dos níveis do preconceito. Aquele que age de forma criminosa que pague pelo seu crime, aquele que deixa escapar uma palavra/expressão equivocada que seja a oportunidade da desconstrução ou não, que fale de maneira consciente sem concordar com o politicamente correto. O silêncio, nessas condições, nunca é uma boa arma para podermos avançar nas mudanças sociais e reflexões que nos atravessam...
Referências:
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Data de Recebimento: 12/09/2025
Data de Aprovação: 31/10/2025
1 Essa afirmação é baseada na matéria no site da BBC Brasil https://www.bbc.com/portuguese/geral-62550838 (Site visitado em 11/08/2025) sobre o que é o politicamente correto.
2 Agradeço ao querido amigo psicanalista Antônio Quinet, que, conhecendo meu trabalho de doutorado, fez-me provocações pertinentes sobre o glossário.
3 Pesquisa disponível em: https://forumseguranca.org.br/publicacoes/anuario-brasileiro-de-seguranca-publica/ (Visitado em 12/08/2025)
4 Segundo o site do Conselho Nacional de Justiça, Injúria Racial e Racismo consistem em conceitos jurídicos distintos, injúria racial ocorre quando há ofensa a honra de alguém, se valendo de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem. Por exemplo, chamar alguém negro de macaco. O racismo é crime que atinge uma coletividade indeterminada de indivíduos, discriminando toda integralidade de uma raça. Por exemplo, em um grupo de trabalhadores que vão prestar serviços, não deixar que os trabalhadores negros subam no elevador social, enquanto os trabalhadores brancos podem subir. O crime de racismo é inafiançável e imprescritível. Site https://www.cnj.jus.br/conheca-a-diferenca-entre-racismo-e-injuria-racial/ (Visitado em 12/08/2025.)
5 Cabe colocar aqui as letras APN (Assexuais, Pansexuais e Não Binários)
6 Site : https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2025-01/com-105-mortes-em-2024-brasil-e-o-pais-que-mais-mata-pessoas-trans (Consultado em 12/08/2025)
7 Acredito que hoje em dia tudo desemboque na expressão “Pessoas em situação de rua” uma vez que a ideia de “morar na rua” não é por escolha, mas por fatores outros que fazem os sujeitos estarem em situação e não serem originários ou pertencentes à rua. É na linguagem que se marca que esse sujeito não mora ali porque ele quer, mas por outros fatores.
8 Há uma discussão nos movimentos negros brasileiros se pessoas negras que não têm consciência de sua raça/cor seriam racistas ou não. O nível de alienação e de labirintos que a sociedade brasileira racista promove é tanta que é difícil colocar um indivíduo, que não goza dos privilégios da branquitude, como racista, ainda que ele possa promover o discurso racista.
9 Faço referência aos cabelos Black Power e às tranças nagôs que valorizam e recuperam a ancestralidade preta, e no caso do Brasil, negra.
10 Que vem de fantoche, ou seja, um individualismo manipulado pelo branco.
11 Li isso no site: https://listologia.com/origem-da-palavra-criado-mudo/ (Visitado em 14/08/2025)
12 Ambiguidade nesta expressão é bem edificante: ora porque o “do” pode significar origem, ora porque o “do” pode significar posse, rememorando os tempos de senhor de escravos. Discussões para outro artigo.
13 Importante apontar que Tupi-Guarani é a família de línguas indígenas como Tapirapé, Munduruku, Guarani, Teneteara, Assurini, entre outras, essas, sim, línguas. Agradeço à Tania Clemente de Souza pelo cuidado ao me chamar a atenção desse ponto.
14 Agradeço imensamente à professora Mara Glozman que, na mesa de abertura da “IV Jornada E-Urbano: Pensar o futuro, hoje” me chamou a atenção para esse sintoma dos dias atuais.
15 Faz estágio de Pós-Doutorado no Laboratório de Estudos Urbanos na Universidade Estadual de Campinas, é professor pesquisador da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). E-mail: Jonathan.moura@fiocruz.br