Nosso objetivo neste texto é refletir sobre o político, tal como o consideramos, e a partilha do real. Para isso analisaremos aspectos do manifesto da Guerra dos Farrapos.
Consideramos o político como constituído “pela oposição entre a afirmação da igualdade, em conflito com uma divisão desigual do real produzida enunciativamente pelas instituições que o organizam” (Guimarães, 2018, p. 50). Esta posição já está também posta em “o político é um conflito entre uma divisão normativa e desigual do real e uma redivisão pela qual os desiguais afirmam seu pertencimento.... mais importante ainda para mim é que deste ponto de vista o político é incontornável porque o homem fala. O homem está sempre a assumir a palavra por mais que esta lhe seja negada” (Guimarães, 2002, p. 16).
Para refletir sobre esta configuração do político retomo aqui o que Rancière coloca sobre a partilha do sensível: “Denomino partilha do sensível o sistema de evidências sensíveis que revela, ao mesmo tempo, a existência de um comum e dos recortes que nele definem lugares e partes respectivas” (Rancière, p. 15, 2000).
Isto caracteriza os que tomam parte no fato de governar e ser governado. “Mas uma outra forma de partilha precede esse tomar parte: aquela que determina os que tomam parte. O animal falante, diz Aristóteles, é um animal político. Mas o escravo, se compreende a linguagem, não a possui” (idem, p. 16)
Ou seja, segundo Rancière, na partilha do real há um embate sobre quem “domina” e quem é “dominado”. Mas antes disso há os que mesmo existindo, não fazem parte. O seu dizer não conta, mesmo quando dizem. Meu objetivo aqui é, ao analisar o texto do manifesto da Guerra dos Farrapos, discutir aspectos sobre a relação entre as partes que “participam” e a parte que “não faz parte”.
A Guerra dos Farrapos: Aspectos Gerais
A Guerra dos Farrapos foi uma revolta ocorrida no Rio Grande do Sul entre 1835 e 1845, durante o Período Regencial brasileiro. Este movimento se fez com o objetivo de estabelecer maior autonomia e melhores condições econômicas para a província, ao ficar independente do império brasileiro. Era liderada pela elite de estancieiros locais, e buscava maior autonomia política e melhores condições econômicas. A insatisfação dos estancieiros com os altos impostos imperiais sobre produtos como o charque era grande. Proclamou-se a República Rio-Grandense que terminou com o Tratado de Poncho Verde, que reunificou o Brasil. Este tratado comprometeu-se com a liberdade a todos, inclusive dos escravizados que lutaram ao lado dos rebeldes.
A Guerra dos Farrapos se deu no período Regencial. Foi a mais longa revolta do período. A Cabanagem no Pará, por exemplo, durou 4 anos, cujos revoltosos, diferentemente da guerra dos Farrapos, não eram da elite dominante local.
Ressaltemos alguns pontos relacionados às razões e desenvolvimento da Rebelião:
-A elite gaúcha revoltosa estava insatisfeita com a centralização do poder e com as políticas fiscais do Império, que prejudicavam, segundo ela, a produção local.
-Os altos impostos sobre o charque gaúcho, ao lado dos incentivos à importação do produto de outros países do Prata, tornavam o produto local menos competitivo.
-A elite da província estava influenciada pelos ideais iluministas e liberais, e começou a defender a autonomia e o federalismo.
-Os líderes farroupilhas buscavam deposição do presidente da província e o direito de escolher novos presidentes e comandantes de armas.
-Em 1836, foi proclamada a República Rio-Grandense, com sede em Piratini, embora o separatismo não fosse unânime entre os rebeldes.
-Em 1845, Pelo tratado de Poncho Verde, pôs-se fim à rebelião. Assim o Rio Grande do Sul se reincorporou ao Império do Brasil.
-Como parte do acordo, o governo imperial concedeu anistia aos revoltosos, e incorporou os militares ao exército.
Passemos à análise do documento. Procuraremos caracterizar incialmente a cena enunciativa e em seguida trataremos de aspectos da argumentação do texto e da designação do nome povo. Ao final faremos uma reflexão sobre a questão da partilha do real significada no documento em análise.
Cena Enunciativa e Argumentação
O documento aqui analisado tem no seu título, e no final do texto o que tomamos no recorte [1]:
[1.1] MANIFESTO
DO
PRESIDENTE DA REPUBLICA
RIO GRANDENSE
EM
NOME DE SEUS CONSTITUINTES
..........
[1.2] Piratini 29 de Agosto de 1838.
BENTO GONÇALVES DA SILVA —Presidente.
DOMINGO JOSÉ D ’ ALMEIDA .— Ministro Sec. d’lnterior
Para melhor configurar a cena enunciativa consideremos também o recorte [2.1], abaixo, parte do recorte [2] que analisaremos a seguir. Em [2.1] sublinho o governo de sua majestade:
[2.1] “O Governo de Sua Majestade o Imperador do Brasil tem consentido que se avilte o Pavilhão Brasileiro, por uma covardia repreensível, pela má escolha de seus Diplomatas, e pela política falsaria e indecorosa de que usa para com as Nações estrangeiras.”
Considerados os recortes acima indicados, observa-se que a relação de alocução que se apresenta significa, de um lado o Presidentes da República Rio Grandense como alocutor, e de outro o imperador do Brasil, como alocutário. Se consideramos o modo de enunciação do recorte [2.1] acima, que o alocutor enuncia, tal como em [1.1] “em nome de meus constituintes”, podemos considerar que faz parte desta cena enunciativa um enunciador-coletivo.
Tem-se, então, na cena enunciativa
Locutor Locutário
alocutor-Presidente da República do RGS alocutário-império Brasileiro.
enunciador coletivo
Desde modo, pela cena enunciativa, significam-se os rebeldes estancieiros enquanto revoltosos.
Na própria configuração da cena, apresentamos o recorte [2.1] que, claramente, é um elemento da argumentação do texto. Abaixo vou tomar, para esta reflexão, uma parte de uma enumeração de razões para a rebelião (o recorte [2]) que inclui, no seu início, [2.1], já apresentado acima:
[2] “O Governo de Sua Majestade o Imperador do Brasil tem consentido que se avilte o Pavilhão Brasileiro, por uma covardia repreensível, pela má escolha de seus Diplomatas, e pela política falsaria e indecorosa de que usa para com as Nações estrangeiras.
Tem feito Tratados com Potências estrangeiras, contrários aos interesses e dignidade da Nação.
Faz pesar sobre o Povo gravosos impostos e não zela os dinheiros públicos.
Tem contraído dívidas taes e por tal maneira que ameaçam a ruína de Nação.
Não administra as Províncias imparcialmente.
Tem desprezado e mesmo punido como a crimes, as mais justas é atendíveis representações do Povo.
(....)
Estes males, além de outros muitos, nós os temos suportado em comum com as outras Províncias da União Brasileira; amargamente os deplorávamos em silêncio, sem contudo sentirmos abalada a nossa constância, o nosso espirito de moderação e de ordem. Para que lançássemos mão das armas foi preciso a concorrência de outras causas, outros males que nos dizem respeito particularmente a nós, e que nos trouxeram a íntima convicção da impossibilidade de avançarmos na carreira da civilização e prosperidade, sujeitos á um Governo que há formado o projeto iníquo de nos submeter à mais abjeta escravidão, ao despotismo mais abominável.”
Trata-se de uma longa enumeração. Nesta enumeração observamos a formação nominal que a inicia, estes males. Trata-se de uma reescrituração por condensação de toda a enumeração de razões, de argumentos, portanto.
Neste último parágrafo da enumeração de argumentos se apresenta um argumento decisivo e ao que estas razões levaram os revoltosos a fazer: “lançar mão das armas”.
Outro aspecto importante a considerar: podemos fazer duas sínteses parafrásticas do recorte [2]:
Primeira Síntese parafrástica:
[2’] Desligamos o povo riograndense da comunhão brasileira declarando independência do Império Brasileiro
porque
O Governo de Sua Majestade o Imperador do Brasil tem consentido que se avilte o Pavilhão Brasileiro;
Tem feito Tratados com Potências estrangeiras, contrários aos interesses e dignidade da Nação
......
Estes males, além de outros muitos, nós os temos suportado em comum com as outras Províncias da União Brasileira; amargamente os deplorávamos em silêncio, sem contudo sentirmos abalada a nossa constância, o nosso espirito de moderação e de ordem. Para que lançássemos mão das armas foi preciso a concorrência de outras causas, outros males que nos dizem respeito particularmente a nós, e que nos trouxeram a íntima convicção da impossibilidade de avançarmos na carreira da civilização e prosperidade, sujeitos á um Governo que há formado o projeto iníquo de nos submeter à mais abjeta escravidão, ao despotismo mais abominável.
Segunda síntese parafrástica :
[2’’] O Governo de Sua Majestade o Imperador do Brasil tem consentido que se avilte o Pavilhão Brasileiro;
Tem feito Tratados com Potências estrangeiras, contrários aos interesses e dignidade da Nação
......
Estes males, além de outros muitos, nós os temos suportado em comum com as outras Províncias da União Brasileira; amargamente os deplorávamos em silêncio, sem contudo sentirmos abalada a nossa constância, o nosso espirito de moderação e de ordem. Para que lançássemos mão das armas foi preciso a concorrência de outras causas, outros males que nos dizem respeito particularmente a nós, e que nos trouxeram a íntima convicção da impossibilidade de avançarmos na carreira da civilização e prosperidade, sujeitos á um Governo que há formado o projeto iníquo de nos submeter à mais abjeta escravidão, ao despotismo mais abominável.
Por Isso
Desligamos o povo riograndense da comunhão brasileira declarando independência do Império Brasileiro.
Ou seja, a enumeração das razões (chamemos isso de X) são argumentos abundantes que apresentam e sustentam uma conclusão: desligamos o povo rio grandense da comunhão brasileira declarando independência do império brasileiro (C).
Pela primeira paráfrase, o que se diz no início da paráfrase (desligamos o povo riograndense da comunhão brasileira declarando independência do Império Brasileiro) é a conclusão (C) que é sustentada pelo que parafraseamos por porque mais a enumeração das razões, os argumentos (X).
Pela segunda paráfrase, o que vem no início é a enumeração de razões (o argumento X) que se relaciona com conclusão (C) (desligamos o povo riograndense da comunhão brasileira declarando independência do Império Brasileiro).
Levando então em conta a cena enunciativa, o alocutor -Presidente da República sustenta uma relação tal como a que representamos logo abaixo:
enunciador-coletivo
Alocutor –pres.
_
X PT C
No diagrama acima:
X: argumento: caracterização da arbitrariedade do Imperador.
C: conclusão: a separação do RGS do Brasil, constituindo-se uma república.
O alocutor apresenta e sustenta (seta espessa) X PT (portanto) C, onde X é toda a enumeração argumentativa e C é a conclusão (desligamos o povo riograndense da comunhão brasileira declarando independência do império Brasileiro). E o alocutor, ao fazer esta apresentação, alude ao, faz alusão (seta simples), enunciador-coletivo (é a voz de todos) como elemento que sustenta (traço interrompido no diagrama) a relação argumentativa.
Sai-se de um império, de uma monarquia, e assume-se pela voz coletiva uma república, por argumentos tais como os considerados no recorte [2].
Façamos uma pequena parada para uma reflexão, que de algum modo é significada nessas relações argumentativas, na cena enunciativa considerada: lembremos alocutor-presidente da república ----- alocutário-imperador do Brasil. Há uma relação argumentativa produzida na qual os revoltosos proclamam uma república como reação às atitudes negativas apresentadas na sustentação argumentativa contra o império e o imperador. Em vista disso podemos considerar aqui duas redes enunciativas (Dias, 2018, p. 31 e ss.) nas quais os enunciados se correlacionam três a três, acima e abaixo da linha divisória de oposição que apresentamos a seguir: leiamos a partir dos enunciados acima, (a) e abaixo (d) da linha. Isto nos leva a dois conjuntos de relações, de um lado a, b, c e de outro d, e, f.
c- “ É autoritário
b- “ É um império
a-O Brasil tem um Rei
______________________________
d-O RGS tem um presidente
e- “ É uma república
f- “ É Democrático (não é autoritário)
Temos aqui, de um lado, duas formações nominais (Dias, 2018, p. 50 e ss.): o Brasil em oposição a o Rio Grande do Sul. Estas formações nominais podem estar em duas redes enunciativas diferentes. De um lado a, b, c (O Brasil tem um Rei, O Brasil é um império, o Brasil é autoritário). De outro d, e, f (o Rio Grande do Sul tem um presidente, o RGS é uma república, o RGS é democrático (não é autoritário)). Então, mesmo que o texto não diga isso expressamente, isto está significado pelas relações de sentido que a argumentação estabelece, em virtude da Cena enuncicativa (entre a enumeração de argumentos e a conclusão que se sustenta).
A oposição entre as duas formações nominais (O Brasil e O Rio Grande do Sul) significa em virtude da diferença entre as redes enunciativas de que cada uma participa, em virtude da argumentação contra o governo imperial.
Um outro aspecto a se observar aqui é que no recorte [2] há, como vimos, uma longa enumeração de razões para a conclusão desligamos o povo riograndense da comunhão brasileira declarando independência do Império Brasileiro. E nesta longa enumeração está dito, quanto aos males suportados: “temos suportado em comum com as outras Províncias da União Brasileira”. Observa-se aqui uma afirmação de pertencimento ao todo do Brasil, junto com as outras províncias. Podemos ver então uma certa “equivocidade” entre ficar, com modificações nas atitudes do império, ou se separar. Equivocidade que se confirma pela possibilidade de um acordo para o fim da rebelião em 1845.
A Designação de Povo
Passemos agora à análise de um outro aspecto, a designação do nome povo no texto. Observemos os recortes que seguem
[3] “Desligado o Povo Rio-Grandense da Comunhão Brasileira reassume todos os direitos da primitiva liberdade;(...)”
[4] “Igual aos Estados Soberanos seus Irmãos, o Povo Rio Grandense não reconhece outro Juiz sobre a terra além do Autor da Natureza, nem outras Leis além daquelas que constituem o Código das Nações.”
[5] “É a hospitalidade Rio Grandense universalmente conhecida; celebres historiadores a tem preconizado, é um hábito inveterado, uma virtude arraigada ao coração do Povo. O patriota rio-grandense, verdadeiro cosmopita, aqui a oferece franca, larga e generosa ao primeiro infeliz que se apresenta à sua vista”.
Como se vê, marcamos em itálico no texto, temos as formação nominal (FN) o povo riograndense em [3] e [4] e temos em [5] a FN patriota rio grandense. O que apresenta o povo reescriturado por patriota, ou seja, patriota determina semanticamente a designação de povo.
Temos então uma relação tal que povo é semanticamente determinado por patriota (povo├ patriota). Voltaremos a isso a seguir.
Observemos agora [6] e [7]:
[6] “Igual aos Estados Soberanos seus Irmãos, o povo Rio Grandense não reconhece outro Juiz sobre a terra além do Autor da Natureza, nem outras Leis além daquelas que constituem o Código das Nações.”
[7] “Só empunha o gládio dos combates para cobrir-se e defender-se de uma odiosa agressão; faz neste momento o que fizeram tantos outros povos por iguais motivos, em circunstâncias idênticas: assim encontre este povo virtuoso e bravo entre tantos povos ilustrados da terra essas generosas simpatias amplamente dispensadas a quantos o precederam neste afanoso comprometimento, ....”
Temos a reescrituração por repetição de o povo riograndense e encontramos a palavra povos (ou seja, os povos em geral), e logo à frente está este povo virtuoso e bravo. Em que este reescritura rio grandense e tem-se uma formação nominal em que povo é significado como virtuoso e bravo. Significado, portanto, por qualidades altamente positivas.
Por outro lado, o nome patriota está em [8] e [9[, abaixo, relacionado a pátria. Nos dois casos nossa reescritura os rio grandenses. A pátria dos rio grandenses, ou seja, os patriotas riograndenses, pelo que vimos antes.
[8] “Contemporizávamos apesar disto. Mas entrava no plano de nossos ímpios tiranos levar-nos à desesperação por meio da intriga; exigia-se o aniquilamento de nossa Pátria”
[9] “Foi o primeiro exemplo de sangue de irmãos derramado por irmãos em nossa Pátria.”
Este conjunto de relações nos leva às seguintes relações:
POVO ├ PATRIOTA,
tal como indicamos há pouco, e
POVO ├ PÁTRIA
Em nossa pátria (recortes 8 e 9) o nossa reescritura povo riograndense e patriota riograndense.
Para dar mais um passo na análise, tomemos os recortes [10] e [11].
[10] “Tal era a nossa posição em 1834, quando o Primeiro Magistrado da Província, o delegado do Governo Imperial se uniu ao General das Armas para escravizar-nos descarregando o último golpe sobre as nossas Liberdades Pátrias.”
[11] “Muitos males sofremos e tudo podíamos suportar, não estava em nossa mão subscrever desonra, degradação, e ignomínia de nossa pátria de tão perto ameaçada pela mais aviltande escravidão.”
De um lado, o nos de escravizar-nos reescritura povo riograndense, ou seja, procurava-se escravizar o povo rio grandense. E esta escravidão está em [11] na formação nominal aviltante escravidão que é parafraseável por a escravidão é aviltante (avilta o ser humano).
A escravidão é dita aviltante quando ameaça o povo riograndense, no caso os estancieiros revoltosos. Por outro lado, os negros efetivamente escravizados pelos proprietários das terras não são mencionados uma vez sequer no decorrer do texto. E como se sabe eles não foram libertados ao final da rebelião tal como se pactuou antes. Podemos então, dado o que vimos acima e em virtude desta última observação, considerar o Domínio Semântico de Determinação (DSD) abaixo, que apresenta a designação do nome povo neste texto:
Pátria ┤ POVO ├ patriota
_______________________________________
Escravo
Neste DSD pátria e patriota determinam semanticamente povo (o que está indicado pelo sinal ┤). Por outro lado, povo e escravo estão em relação de antonímia significada no DSD pelo traço contínuo. A designação de escravo está excluída da designação de povo e seus sentidos. Povo tem uma relação de antonímia em relação ao sentido de escravo.
Considerações Finais
Como vimos, a sustentação argumentativa produzida no texto nas relações de alocução da cena enunciativa acaba por significar que o conjunto de razões apresentadas sustenta separar-se de Brasil e tornar-se independente. Assim fica significado como os riograndenses revoltosos se significam como “excluídos” pelo governo imperial do Brasil e nesta medida buscam uma república em que todos pudessem participar inclusive da escolha de seus dirigentes. A ponto de se dizer que o que o governo imperial fazia era produzir a escravização dos riograndenses.
Neste movimento é fundamental o que se pode observar pela designação de povo que aparece determinada por pátria e patriotas. Assim o povo são os patriotas, são o todos da pátria.
Por outro lado, o movimento deste acontecimento de enunciação significa pela absoluta ausência de consideração, no texto, do sentido de escravos e, assim, de todo o contingente de escravos que trabalhavam para os estancieiros. Nessa medida o manifesto significa a exclusão dos escravos do todo do povo na república riograndense e império do Brasil. Os escravos, segundo o que significa o texto analisado, são os que não participam da partilha dos papéis nas relações do funcionamento do poder na sociedade. Isto não significa que os escravos não se apresentam como parte que precisa ser incluída. Significa que o texto da Guerra dos Farrapos os coloca fora da relação dos que participam.
Referências:
Dias, L.F. Enunciação e Relações Linguísticas. Campinas, Pontes, 2018.
Guimarães, E. Semântica do Acontecimento. Campinas, Pontes, 2002.
Guimarães, E. Semântica: Enunciação e Sentido. Campinas, Pontes, 2018.
Rancière, J. (2000) A Partilha do Sensível. Estética e Política. São Paulo. Editora 34, 2005.
1 Doutorado em Lingüística pela Universidade de São Paulo. Docente da Universidade Estadual de Campinas. Coordenador do Laboratório de Estudos Urbanos. E-mail: eduardo.gui@uol.com.br.