Reportagem e Folhetinismo: narrativas infames como poder finalista


resumo resumo

Rodrigo Marcelino



A crônica é uma narrativa que não é alvo da crítica no século XIX, como será no século XX. Machado de Assis até vê na crônica oportunidade de vez por outra exercer a crítica. Ele não quer de modo algum tornar os “simples apontamentos da crônica em revista crítica de artes liberais” [1], mas muitas das suas crônicas assim vão tomando consistência. Talvez, seja por isso que acabe por considerar a crônica como mais ou menos crítica, como se fosse dever da crônica “atribuições que se estreitam na menção das obras, e na manifestação da impressão recebida” [2]. Em Sílvio Romero, (1906) “a crônica, essa é política, literária ou de costumes. Em qualquer dos três casos não passa, por via de regra, de acervos de banalidades em estilo rendilhado mui do gosto de todos os superficiais, e ignorantes” (idem, p.80). Tristão de Athayde (1933) não vai sentir literatura naquilo que ele na juventude inventiva do modernismo vai chamar de cronismo; a crônica fora do jornal lhe parece “uma flor murcha, dessas que antigamente se guardavam nos livros e que lembram apenas melancolicamente o frescor da vida que possuíram” (idem, p.77-78).

No fundo, se o folhetim do século XIX é outro nome para crônica (COUTINHO, 1987, p.279), o é no sentido que a crônica difere da História e não está ligada ao folhetim, quando esse é relato de ficção. Isso que quer dizer que a crônica é uma narrativa indicial construída com os acontecimentos ínfimos do frescor da vida, aqueles que se perdem por sua natureza próxima e simples. Machado de Assis vai subscrever que “um fato de trinta dias pertence à História, não à crônica” [3]. Um crítico, aliás, de boa fé, para José de Alencar (1874), é da opinião que se o folhetinista inventou em vez de contar, é que, por conseguinte, excedeu os limites da crônica (idem, p.21). É no século XX que vai surgir, de uma maneira não vista antes, nossa crônica com foros literários. A crônica passa a se referir a um relato de ficção, “pelo ângulo da recriação do real” (SÁ, 2005, p.9), narrativa literária específica, estreitamente ligada ao folhetinista, quando esse escreve romance ou contos. Crônica como literatura é uma invenção do século XX[4], assim como o seu encontro com a reportagem.

O Futuro, 15 de fevereiro de 1863.

Diário do Rio de janeiro, 26 de janeiro de 1862.

Ilustração Brasileira, fevereiro de 1878.

Flagrante formulação de Afrânio Coutinho nas colunas do Diário de Notícias, entre 1953 e 1957, reunidas no livro Da crítica e da nova crítica (1957). Em Introdução à Literatura no Brasil (1959), vai dizer que em língua portuguesa moderna dificilmente existe algo parecido a Rubem Braga, e, “em primeiro lugar, é mister ressaltar a natureza  literária da crônica” (COUTINHO, 1972, p.304- 305).



[1] O Futuro, 15 de fevereiro de 1863.

[2] Diário do Rio de janeiro, 26 de janeiro de 1862.

[3] Ilustração Brasileira, fevereiro de 1878.

[4] Flagrante formulação de Afrânio Coutinho nas colunas do Diário de Notícias, entre 1953 e 1957, reunidas no livro Da crítica e da nova crítica (1957). Em Introdução à Literatura no Brasil (1959), vai dizer que em língua portuguesa moderna dificilmente existe algo parecido a Rubem Braga, e, “em primeiro lugar, é mister ressaltar a natureza  literária da crônica” (COUTINHO, 1972, p.304- 305).