No leva-e-traz da política científica: Uma interrogação sobre as “relações sociais”
Eni Puccinelli Orlandi
Para quem quer se soltar invento o cais Invento mais que a solidão me dá
(...)
Invento o mar
(Milton Nascimento)
Introdução
Para esta reflexão, partode uma pesquisa feita junto a mulheres do Núcleo Eldorado dos Carajás, em Campinas, no projeto Barracão, coordenado pela pesquisadora Cristiane Dias (Labeurb/Nudecri/Unicamp/MEC). Como parte desta experiência de extensão há também uma entrevista, publicada pela coordenadora do projeto, e um vídeo de acompanhamento da pesquisa feito por GrecielyC. da Costa. Todos estes materiais são fundamentais na produção do conhecimento sobreeste grupo social.
Na introdução ao que aqui exponho, já coloco a questão que foi a base desse meu trabalho de pesquisa: o que está significado em “gruposocial”? Lembro Sartre (2002) quando faz a diferença entre série e grupo, e também K. Marx (1987) em sua reflexão sobre alienação. De Sartre, guardo o que disse teorizando sobre o fato de que um conjunto de pessoas esperando um ônibus é uma série – nada os liga como projeto – e um conjunto de pessoas fazendo uma reivindicação comum é um grupo. A qualidade, a natureza da relação, portanto, distingue série e grupo. Em Marx, lembro sua afirmação da impossibilidade do lúmpen proletariado considerar-se como grupo/classe, da mesma forma que um saco de batatas é só um saco de batatas. Aqui vemos a intervenção do que diz Marx da alienação, em que o sujeito se transforma no objeto que produz. Batatas. Um saco de batatas não é um grupo.
E passo, imediatamente, ao que já se pode antever no que estou procurando dizer, pensando “grupo” e “relações sociais”, sobretudo, no que pude compreender a partir desta experiência de pesquisa, e que está na epígrafe deste trabalho, tirada da música composta por Milton Nascimento, a música Cais. E a palavra mote desta minha exposição é a palavra “invenção[1]”.
[1]Se algum autor, além da música, me inspira no uso da palavra invenção é de Certeau, quando fala de cultura (1974): “ proliferação de invenções em espaços de coerções”.