Sentidos (tra)vestidos: a individuação e a constituição do sujeito travesti pelo Estado


resumo resumo

Lidia Noronha Pereira
Telma Domingues Da Silva



uno, a que o Estado valoriza, é a que, não raro, se repete, se (re) afirma em nosso cotidiano, em debates, causas religiosas, políticas, morais etc. E, dessa forma, essa memória ‘oficial’ que se divulga, é reafirmada pelas outras instâncias de poder, afetando ideologicamente os sujeitos a ela submetidos, sendo responsável pela individuação do sujeito pelo Estado através da ciência médica e da estatística, produzindo-se uma continuidade entre o saber científico e a gestão de Estado.

Tal individuação ocorre, então, pelo modo como o sujeito travesti é dito, significado a nível nacional, ligando-o a uma terra e o identificando através de uma formação discursiva que lhe dá uma origem: a brasileira. Mesmo que o sujeito travesti não se identifique com a significação de si, dada pelo Estado, esse discurso faz parte e se faz presente da/na história de sua sociedade: o cartaz é o gesto de memória do Estado que, ao individuar o sujeito travesti, o faz um tipo específico de cidadão, interpelado como tal, de todo o seu domínio territorial.

Observando o primeiro cartaz, temos em letras maiores, dando destaque à mensagem principal: “Travesti, não fique na dúvida. Faça o teste da aids.” Logo abaixo, continuando a mensagem, mas em letras menores, lemos: “Fique sabendo.”, “Aproveite também para fazer os testes de sífilis e hepatites B e C. E use sempre camisinha”. Tais falas, provenientes de um órgão de governo, com os verbos no modo imperativo advertem, chamam a atenção do sujeito travesti e o convocam para que este encare os riscos a que se submete: “Não fique na dúvida’; “Faça o teste...”; “Aproveite”; “use sempre camisinha”. Há, ainda, a exposição de argumentos, em amarelo, de modo a dar segurança ao sujeito travesti que se submeter ao exame de HIV: “O teste é gratuito, rápido, seguro e sigiloso.” Temos, então, o Estado oferecendo todos os recursos possíveis para o sujeito travesti o manter informado sobre a sua sexualidade e práticas sexuais e essa menção ao “sigiloso” em que se mostra a contradição desse “cuidado de Estado”, uma vez que o próprio cartaz sugere que o sujeito travesti é um possível portador de HIV.