Pedagogização do espaço urbano


resumo resumo

Mariza Vieira da Silva
Claudia Castellanos Pfeiffer



demais formas de educação, produzir relações entre trabalho e educação, tendo peso decisivo no desenvolvimento e reprodução do modo de produção capitalista.

O século XVI, nas sociedades europeias, é um marco, nesse processo, de uma configuração sócio-histórica particular para a Escola, em uma conjuntura de reorganização do campo político e religioso, de instauração de uma ordem urbana a que o sujeito devia submeter-se, e que exigia o estabelecimento de novas formas de relação social entre sujeitos de diferentes classes. Essa forma escolar[1] vai ser marcada por um modo de organizar e colocar em funcionamento o espaço e o tempo, ou seja, a escola como um lugar separado daqueles próprios a outras relações e práticas sociais, e um tempo que divide o saber por idade, por classes, por séries, por anos, por atividades, estabelecendo uma cadeia progressiva de conhecimentos a serem aprendidos e de dificuldades a serem superadas, conforme uma hierarquização de capacidade, vontade, esforço individuais. Uma unidade dividida desigualmente entre sujeitos.

Desenvolve-se, pois, um processo complexo de assujeitamento, de individuação desse sujeito urbano escolarizado, que podemos observar analisando, por exemplo, o aprender-saber escolar, as políticas públicas de educação, a legislação educacional, as teorias, metodologias e tecnologias, como as cartilhas de ensino de primeiras letras. A escolarização de todas as crianças nos centros urbanos torna-se um empreendimento de ordem pública, que cria condições para que o sujeito se submeta livremente ao Estado. Não uma submissão a pessoas, mas a regras comuns para todos no cotidiano escolar, a uma verdade pautada em uma razão universal (VINCENT, LAHIRE E THIN, 1994). Uma subordinação em que está sempre presente a relação entre ignorância e ciência, entre o sujeito que ignora algo (tudo?) e o sujeito que domina um conhecimento capaz de tirá-lo da ignorância.

Ao observar esse processo no Brasil, em sua dimensão histórica, podemos fazer alguns recortes para explicitar a produção de sentidos que aí se dá para o conhecimento e para a constituição da posição sujeito de conhecimento. No século XVI, as escolas de ler, escrever e contar são construídas no Brasil como escolas de catecúmenos, em que “Poucas letras bastariam aqui, porque tudo é papel branco e não ha que fazer outra cousa, sinão escrever á vontade as virtudes mais necessarias e ter zelo em que seja



[2] “Forma escolar” é um conceito que aparece no fim dos anos 1970, na França, em trabalhos conduzidos de uma perspectiva da sociologia histórica, a partir do uso que dele faziam historiadores como Roger Chartier, Dominique Julia e Marie-Madeleine Compère, de forma a romper com uma historiografia presa a etimologias. Ver Vincent, Lahire e Thin, 1994.