Discurso artístico no metrô: Sentidos inusitados para sujeitos em trânsito


resumo resumo

José Horta Nunes



As estações de metrô são espaços de passagem, de trânsito, que ligam diferentes localidades da cidade. São também locais de pouso, de espera, de estada provisória. Afetados pela temporalidade cambiante, os sujeitos vivenciam a viagem e a parada, a pressa e a calma, a caminhada (ou corrida) e a imobilidade, a (re)programação dos percursos, a pausa e o retorno ao movimento. Dentre os discursos que aí circulam, estão os artísticos e de divulgação da arte. A arte se espacializa no metrô. Há obras expostas nas plataformas e textos que lhes atribuem sentidos, gestos de interpretação. Em movimento, os sujeitos deparam-se com elas a partir de diferentes localizações, perspectivas, posicionamentos estáticos ou dinâmicos.

Em algumas estações do metrô de São Paulo, encontram-se obras de arte estreitamente relacionadas ao espaço-tempo em que estão inseridas, de maneira que elas significam na relação com a materialidade envolvente. Há também painéis de divulgação artística e cultural, visualizados nas proximidades do embarque e desembarque dos trens. Esses painéis indicam, anunciam, descrevem as obras presentes na plataforma ou em outras linhas do metrô, assim como orientam para roteiros artísticos e eventos. O espaço do metrô, desse modo, é ocupado por dispositivos de divulgação da arte para os sujeitos em trânsito, artefatos que projetam para os leitores uma imagem de apreciador, fruidor, propondo-lhes lugares e roteiros para contatos com a arte.

Neste trabalho apresentamos uma análise da divulgação artística em estações da “linha verde” do metrô paulistano, na região da Avenida Paulista (estações Consolação, Trianon-Masp e Brigadeiro). Temos em vista especificamente compreender o discurso artístico institucional do metrô, considerando-se as relações com os sujeitos que frequentam as plataformas. Para isso, com base em uma abordagem discursiva, efetuamos alguns recortes de análise. Primeiramente, explicitamos o discurso institucional sobre a arte no metrô. Em seguida, analisamos os painéis de divulgação artística, tendo em vista mostrar como eles significam as obras dispostas na plataforma, bem como os sujeitos em trânsito. Finalmente, analisamos uma das obras presentes na estação Brigadeiro, procurando compreender os sentidos possíveis a partir de certos posicionamentos espaciais.

Situamos esta pesquisa no campo dos estudos discursivos sobre a cidade (ORLANDI [Org.], 2001a; ORLANDI, 2004, 2017). Considerando-se uma série de trabalhos sobre a espacialidade urbana e seus modos de significação, atentamos para os espaços de trânsito, em que os sujeitos se movimentam na passagem de uma a outra localidade. As estações são concebidas como espaços de interpretação, sítios de significação (ORLANDI, 2004). Observamos também as relações entre os sujeitos e as instituições públicas, na tensão entre o real da cidade (os sujeitos em suas práticas diversas) e a organização da cidade (direcionamentos de sentidos para os sujeitos citadinos), com ênfase para a análise dos sentidos públicos do discurso artístico.

No livro Mégapolis – les derneirs pas du flâneur, Régine Robin fala de seu “amor pelas cidades”, especialmente pelas grandes cidades (“D’où vient cette passion des grandes villes, des capitales?”). Após discutir as várias maneiras de se entrar, de atravessar uma cidade desconhecida, a autora propõe falar sobre suas andanças, itinerários, errâncias, peregrinações por cinco megalópoles: Nova Iorque, Los Ângeles, Tóquio, Buenos Aires e Londres. Mesclando reflexões intelectuais e experiências, performances, encontros subjetivos, a autora considera diversos olhares sobre as megalópoles: na ficção literária, no cinema, na televisão, discorrendo também sobre a “vida sensível”, a circulação, os fluxos, os meios de transporte, principalmente os metrôs:

 

Circuler, traverser, déambuler, passer d’un point à un autre, d’un lieu à un autre, aller au bout de la ligne, au terminus, là où les trains, les bus, les troleys, les tramways, les métros s’arretent. Bouts du monde. Buvettes fermées, escaliers ne donnant sur rien, terminus au millieu d’une prairie, d’un champ, d’une usine desaffectée ou d’une station ultramoderne, juste reconstruite. Être en transfert, en correspondence, avoir à changer, prendre de nouvelles directions, descendre à... Si on savait à l’avance où il faut descendre! Ne jamais descendre, savoir qu’on ne revient jamais au même lieu. (ROBIN, 2009, p. 12)

 

Questionando os sentidos do “flaneur”, tal como considerado desde o século XIX, em autores como Baudelaire e Benjamin, como uma espécie de observador oculto em meio à multidão, a autora reflete sobre as errâncias nos dias de hoje, nas grandes cidades, seja a pé, de automóvel ou pelos meios de transporte público. Diante de um mundo globalizado e sob as câmeras de vigilância, Robin diz: “J’incarne peut-être, à ma façon, ce nouveau flâneur des gigantesques centres commerciaux et des cafés qu’on retrouve partout à la surface du glôbe: Starbucks, Second Cup, Neos, etc.” (ROBIN, 2009, p. 346).

As estações de metrô, bem como os arredores da Avenida Paulista, são um desses espaços de andanças pela cidade. O sujeito em movimento observa e é observado, fotografa ou “narra” silenciosamente durante os percursos e paradas para, como diz Robin, “saborear”, “imobilizar esses instantes de plenitude” (ROBIN, 2009, p. 10). Ao andar pelas plataformas com uma câmera, buscamos formular questões de análise, propor modos de visualizar as obras e compreender os possíveis gestos de fruição e de interpretação das materialidades textuais e das espacialidades urbanas. Entre a apreensão cotidiana e a reflexão com base no Dispositivo de Interpretação da Análise de Discurso, procuramos flagrar os sentidos, expondo-nos ao mesmo tempo às alteridades e à “desorganização” da cidade[1].

Enquanto local de exposições de arte, as estações de metrô apresentam especificidades que procuramos compreender por meio da análise. Do mesmo modo como Françoise Rigat mobiliza a noção de silêncio, de E, Orlandi, para analisar certas formas de silêncio em visitas a museus, gostaríamos de evocar esse gesto para abordar a arte no metrô, onde os fatos de silêncio também chamam a atenção. Vejamos alguns dos sentidos de silêncio que Rigat observa nas visitas a museus:

 

Dans le musée, “ce lieu fréquenté où regne la retenue” (FRESNAULT-DERUELLE 2004: 31), il y aurait une éthique de la visite silencieuse ou, pour paraphraser Eni Puccinelli Orlandi (1996: 13), un mode d’être en silence, dans le silence du visiteur qui approche l’oeuvre: c’est le silence recuelli, méditatif, favorable à la délectation; silence touché, compréhensif qu’observe le connaisseur qui reçoit le mystère de l’art; silence vertigineux, fusionnel d’où émerge la vérité: silence pudique et respectueusement craintif du regardeur ébloui qui hésite à se rendre à la somptuosité du tableau; silence grave, apliqué de l’érudit qui scrute fixement chaque détail pour en dévoiler la substance; silence paralysant; aphasique qui nous saisit devant une toile que le hasard a mis sous nos yeux; silence engourdi, apaisé, que nourrissent la rêverie et la mélancolie des âmes réconciliées. C’est aussi le silence défiant, hébété, frustré du profane qui cherche ce que l’artiste a voulu dire; silence détaché, indolent du visiteur pressé; silence désinvolte et étourdit de l’amateur blasé; silence suspensif, aérien, propre à la “déambulation”, comme on dit,, où se meut librement la pensée... (RIGAT, 2015, p. 617)

 

Nessa enumeração de sentidos de silêncio no museu, por Rigat, notamos uma passagem do visitante que vai do “recolhimento” (meditação, deleite, compreensão, verdade, etc.) à “deambulação” (indolente, atordoado, insensível, aéreo, etc.). O sujeito visitante transita do repouso ao movimento. No caso das estações de metrô de São Paulo, notamos que o movimento é definidor do sujeito em trânsito, de modo que a imagem do sujeito visitante é a de quem realiza seus percursos, seus diferentes posicionamentos de fruição, vivenciando instantes efêmeros de parada, em meio à aceleração do dia-a-dia, e significando nas brechas a tensão entre repouso e movimento.

Um dos sentidos dos silêncios do sujeito em trânsito nas plataformas do metrô é o de sua deambulação imaginária, antecipações de percursos, reflexões, busca de recolhimento ou de laços identitários e de espaços em que possa situar-se. A fim de apreender esses momentos, mobilizamos o conceito de narratividade, conforme a concepção discursiva de Orlandi:

 

a narratividade como a maneira pela qual uma memória se diz em processos identitários, apoiados em modos de individuação do sujeito, afirmando/vinculando seu pertencimento a espaços de interpretação determinados, consoantes a específicas práticas discursivas” (ORLANDI, 2017, p. 287).

 

Os sujeitos que circulam pelas plataformas podem ser considerados, a nosso ver, na relação com processos de identificação, em práticas que produzem narratividades de transição espacial. Na busca por sentidos, na tensão entre movimento e repouso, o sujeito é exposto ao discurso artístico e cultural e isso traz certas condições para a formulação de narrativas espaciais. Ao trazer a noção de silêncio, para abordar as narrativas possíveis para o sujeito em movimento, entendemos que essa compreensão não é obtida diretamente, pois o silêncio não é representável, mas sim por um método que permite analisar seus reflexos[2]. Propomos, assim, analisar posicionamentos de visualização artística dos sujeitos nos espaços das estações. O discurso visual, se assim podemos dizer, seria um dos que participam da narratividade urbana.

A captura de fotos e vídeos e a análise de textos de exposições nos parecem procedimentos produtivos para tal propósito. Em um mundo em que a imagem tem sido ressaltada enquanto textualidade, e a visualização enquanto leitura, procuramos lidar com os artefatos de visualização que se apresentam para o analista em seus percursos citadinos. Trata-se também de uma prática de observação das textualidades urbanas, em suas materialidades diversas.[3]

 

Montagem do corpus e procedimentos de análise

Tendo em vista a análise do discurso institucional, consultamos o site oficial do Metrô de São Paulo. Selecionamos no site as sequências em que a instituição é apresentada e outras que permitiram observar a relação com as atividades artísticas no metrô. Além da sessão institucional “sobre nós” do site, ali encontramos também uma remissão para o livro digital Arte no Metrô, de A. Nascimento (2012), no qual encontramos, além de um prefácio sobre os inícios e as transformações das exposições de arte, uma sessão sobre o Acervo Artístico do Metrô de São Paulo, com descrições das obras e biografias dos autores que fazem parte desse acervo.

Para analisar as obras e os painéis de divulgação, fizemos algumas visitas às estações de metrô, a fim de observar os espaços de exposição e de divulgação da arte, assim como a circulação dos sujeitos ali de passagem. Após os primeiros contatos com as obras de arte, algumas chamaram a atenção por estarem estreitamente ligadas ao espaço da estação e à movimentação dos frequentadores. Selecionamos, então, para a montagem do corpus, um painel de autoria de Fernando Lemos, denominado Des-aceleração, que está fixado na parede do túnel por onde passa o trem, na Estação Brigadeiro. Tal painel é visível de dentro do trem, quando ele parte da estação Brigadeiro em direção à Estação Trianon-Masp; ou, a partir da plataforma, quando os passageiros aguardam o trem.

Quanto ao painel de divulgação das obras, ele traz dois textos de divulgação artística. O primeiro identifica, descreve e mostra a localização das obras permanentes do sistema do Metrô de São Paulo. E o segundo consiste em uma divulgação de atividades culturais disponíveis para os interessados, atividades essas realizadas também no interior das estações de metrô.

Após a seleção dos materiais de análise, e considerando-se as diferentes materialidades (verbais e não-verbais) aí presentes, efetuamos fotos das obras de arte e dos painéis de divulgação, por meio de câmera de celular. As fotos permitiram a montagem do corpus com base na simulação de enquadramentos possíveis a partir de diferentes posições de visualização pelos sujeitos na plataforma. Inicialmente, capturamos fotos das obras da posição de quem as observa à beira da estação, na espera do trem. Em seguida, fizemos fotos do painel de divulgação do ponto de vista quem se aproxima para a leitura.

Na medida em que a montagem do corpus progredia, foram surgindo questões mais específicas para a análise, que levaram a novas visitas e capturas de fotos com outros enquadramentos. Assim, o procedimento fotográfico acompanhou as reflexões, as descrições das materialidades textuais e as reformulações teóricas. As fotos desempenharam um papel de artefato de observação da cidade, envolvidas na montagem do dispositivo de análise. Por meio de recursos de cortes, ajustes de zoom (afastamentos e aproximações) e controle de brilho e contraste, foi possível formular novos recortes, afinar as descrições e aprimorar a explicitação dos gestos de interpretação.

Após as primeiras análises das fotos, e em vista da questão de compreender não somente a posição de quem contempla a obra de arte da plataforma, mas também a de quem viaja pelo trem, realizamos ainda outra visita, para a captura de vídeos de dentro do trem, registrando movimentos de visualização dos painéis artísticos na aproximação da estação e na saída em direção à estação seguinte. Assim como no caso da fotografia, o vídeo condicionou reflexões teóricas e metodológicas que levaram a novos recortes de análise, com o auxílio, nesse caso, de montagem de uma sequência de vídeo-fotos, com momentos sucessivos de visualização das obras. Em seguida, a sequência de vídeo-fotos foi analisada, trabalhando-se as questões que surgiram nessa última etapa de análise.

O trabalho de montagem de corpus, mediado pelo procedimento de foto e vídeo, fez refletir sobre a relação entre movimento e repouso nas situações de contato com as obras de arte e painéis de divulgação. Os aparelhos de captura de imagens, ao lado do olhar do analista, promoveram outros enquadramentos e efeitos visuais, contribuindo para uma compreensão multifacetada, modular, dos objetos discursivos e dos limites e fronteiras entre estática e dinâmica dos sujeitos no espaço citadino. Note-se que durante a análise das fotos, deparamo-nos com “fatos” inusitados, não previsíveis, construídos por meio dos dispositivos, de modo que lidamos a todo momento com os “equívocos” do discurso artístico, com a polissemia, os diferentes posicionamentos de apreensão das obras. Consideramos, assim, o artefato fotográfico, na relação com a teoria do discurso, como sujeito a equívocos, na relação entre o sujeito analista, ao montar seu dispositivo, e o objeto de análise: artefato sujeito a “falhas”, ferramenta “imperfeita”[4].

     

Discurso institucional sobre a arte no metrô: educação em viagem

Quando o discurso artístico e cultural é sustentado por uma instituição pública, a relação da arte com o Estado toma contornos específicos, com a adoção de certos direcionamentos para o cidadão, a cidade, o espaço público. De que modo a arte e a cultura são significadas nesse discurso institucional voltado para os usuários do transporte público?

Nos anos 60, a institucionalização da arte pelos museus passa a ser questionada, de modo que outros espaços passaram a ser ocupados para as exposições de arte. Conforme o professor e curador Fernando Cocchiarale:

 

A arquitetura de áreas expositivas vem sendo adequada aos novos conceitos e repertórios que alteraram e seguem alterando o rumo da produção artística e das teorias de arte desde o século XVIII. Dos ateliês e museus influenciados pelo Iluminismo, nos quais os quadros recobriam, de alto a baixo, qual uma coleção de insetos ou de mineralogia, as paredes dessas recém-criadas áreas expositivas, passando pelo cubo branco modernista, cuja neutralidade podia acolher, sem quaisquer interferências, a pureza formal das obras de arte, até a apropriação recente de espaços concebidos e projetados  originalmente para atividades com funções estranhas à arte, temos, sempre, o entrelaçamento entre as questões e as necessidades da produção artística e as características espaciais da arquitetura nas quais é exibida (COCCILIARALE, 2007, p. 181)

 

Os espaços subterrâneos dos metrôs, que evocam a memória da arquitetura das “cavernas”[5], com sua modernidade de jogos de sombras e luzes. consiste em um desses espaços que passaram a ser ocupados para as exposições artísticas, como é o caso do metrô de São Paulo. Embora as condições de mobilidade sejam outras, nota-se, assim como nos museus, uma prática de institucionalização da arte, um discurso de organização que orienta sentidos para os sujeitos em trânsito[6].

O Metrô de São Paulo é organizado pela Companhia do Metropolitano de São Paulo, constituída em 1968 e controlada pelo Governo do Estado de São Paulo, sob gestão da Secretaria de Estado dos Transportes Metropolitanos (STM). Segundo o site da empresa (COMPANHIA DO METROPOLITANO, 2019, s.p.), esse Metrô é responsável por 6 linhas que somam 65,8 km de extensão e 59 estações, por onde passam 4 milhões de passageiros diariamente. Tal rede está integrada aos trens metropolitanos (CPTM) e a outros modais de transporte na cidade de São Paulo. A quantidade de usuários, que caracteriza um “transporte de massa”, é ressaltada e torna-se uma questão que se repete como determinante para a realização de projetos envolvendo a arte nesse espaço.

Há uma série de programas culturais organizados pelo Metrô, dentre os quais salientamos aqui o Arte no Metrô e o Linha da Cultura. As propostas de arte no metrô remontam aos inícios das atividades do Metrô, em 1968, mas elas foram formalizadas posteriormente, em 1988. Há um discurso de fundação das linhas de metrô, que é marcado pela relação dos transportes públicos com a arte, e pela ideia de transformar as estações em “galerias de arte subterrâneas”:

 

Quando a Estação Sé do Metrô de São Paulo foi inaugurada, há 34 anos, já com as primeiras obras de arte instaladas, surgiu o momento de colocar em prática uma ideia que vinha sendo trabalhada desde a fundação da Companhia, em 1968: transformar as estações do sistema em galerias de arte subterrâneas e aproximar o cidadão dessas manifestações culturais. Eram esculturas, como as de Alfredo Ceschiatti e Marcelo Nitsche; e murais, como os de Renina Katz, Cláudio Tozzi e Mário Gruber. Eles estão entre os primeiros artistas plásticos especializados em arte pública e esse pioneirismo despertou o interesse de pintores e escultores. Nascia, assim, o projeto "Arte no Metrô", formalizado em 1988, que passou a estabelecer critérios e organizar o acervo de obras de arte contemporânea do Metrô de São Paulo. (COMPANHIA DO METROPOLITANO, 2019, s.p.).

 

 

Arte Pública e Arte Contemporânea são as que se apresentam nesse projeto fundador e que até hoje são tomadas como pertinentes para serem expostas e “aproximar o cidadão dessas manifestações culturais”. Atualmente, o acervo do Metrô conta com 91 obras de arte em 37 estações, “composta por painéis, murais, pinturas sobre tela, instalações e esculturas. São artistas renomados, como Aldemir Martins, Tomie Othake, Antonio Peticov, Denise Milan, entre outros” (idem, s.p.). Além de obras permanentes, de autores consagrados, o Metrô fomenta também exposições temporárias e outras atividades artísticas de interesse social e educativo, como se nota no programa Linha da Cultura:

A Linha da Cultura é um programa voltado para produções artístico-culturais realizadas no Metrô de São Paulo. Desde 1986, o Programa de Ação Cultural realiza, sistematicamente, ações continuadas para a promoção de diferentes formas de expressão artísticas: exposições, música, dança e teatro.

A Linha da Cultura – exposições - oferece uma agenda que abarca diversas linguagens artísticas com abordagem de conteúdos de interesse social e educativo, proporcionando a troca e interação da empresa com seus usuários por meio da arte. (COMPANHIA DO METROPOLITANO, 2019, s.p)

 

Esses programas levaram à organização de comissões formadas por representantes de instituições artísticas, de modo que o discurso governamental se associa ao de especialistas na área:

A intensa procura fez com que o Metrô instituísse, em 1990, a Comissão Consultiva de Arte, formada por representantes da Pinacoteca do Estado, do MASP, do MAM, do IAB – Instituto dos Arquitetos do Brasil, da ABPA – Associação Paulista de Belas Artes e por representantes das áreas de Marketing e Arquitetura do Metrô paulistano. A função desta comissão é a de assegurar um processo de seleção criterioso e consistente para a escolha de projetos de arte contemporânea, bem como sua adequação para ser instalada em espaço público do Metrô de São Paulo. (idem, s.p.)

 

Com a inserção da arte no metrô, assentada em uma memória institucional e nas vozes de especialistas, produzem-se determinadas imagens da arte, do modo de divulgá-la e do sujeito usuário do metrô. A arte é concebida na relação com a espacialidade das estações, tendo em vista a grande quantidade de usuários em movimento. Isso propicia, segundo Abramo, uma forma de “educação para o povo”, seguindo as concepções do escritor e crítico de arte inglês Ruskin, no século XIX. Enquanto “fruidor” da arte, nessas circunstâncias, o usuário do metrô é visto como alguém que apresenta um modo de percepção específico:

 

Para Radha Abramo, que durante anos foi uma espécie de curadora do projeto Arte no Metrô, a disponibilização de obras de arte para milhares de usuários do metrô resgata o sonho utópico do intelectual inglês John Ruskin de levar a arte até o povo, em função de seu inegável potencial educador. Entende Radha que o homem moderno é caracterizado pela percepção fragmentada das coisas e que essa fragmentação tem suas origens na aceleração da vida. E acrescenta que, normalmente “o fruidor não para diante do painel do metrô; movimentando-se no percurso convencional que o leva ao trem, vai acumulando formas, cores e linhas que depois se arranjam mentalmente em correspondência com a obra vista. Com essa atitude, ele soma ao anterior prazer maior de recriá-la abstratamente na memória.” (SACRAMENTO, 2012, p. 8)

 

O “homem moderno” que se projeta para o usuário de metrô é o que se caracteriza pela “aceleração da vida”. Esse sentido de “aceleração”, associado à espacialidade e à temporalidade das estações de metrô, evoca uma série de discursos sobre a cidade de São Paulo, enquanto metrópole acelerada, moderna, sempre em transformação. O discurso institucional do Metrô, ao promover as exposições e demais atividades artísticas e culturais, atualiza essa memória de uma prática educativa que visa a lidar com os sujeitos em movimento e a aceleração moderna e contemporânea das grandes cidades.

 

O painel de divulgação: arte no metrô e roteiros culturais para sujeitos em movimento

Passemos à análise dos painéis de divulgação. Localizados em locais de passagem, geralmente nos mezaninos, nas plataformas ou próximo ao embarque/desembarque, nota-se uma linguagem visual (com ênfase para fotos de obras e imagens de materiais de divulgação), acompanhada de textos verbais que orientam os leitores para a localização das obras presentes no sistema do metrô, apresentando também uma breve descrição delas. Na foto abaixo, na Estação Brigadeiro, os dois painéis de divulgação artística, situados à direita, encontram-se ao lado de outros textos endereçados aos passageiros, como o mapa das linhas de metrô e algumas orientações de segurança, do lado esquerdo:

 

Uma imagem contendo no interior, noite, mesa, loja

Descrição gerada automaticamente

Fonte: acervo do autor

 

De um lado, textos voltados ao leitor enquanto usuário de transporte; de outro, textos endereçados ao leitor enquanto sujeito cultural em contato com as obras e atividades artísticas no metrô. Um dos painéis culturais é intitulado Linha da Cultura e outro Arte no Metrô. Esses dois títulos correspondem, como vimos mais acima - na análise do discurso institucional do Metrô, a dois programas de atividades artísticas promovidos para os frequentadores das estações. O Arte no Metrô promove exposições permanentes com obras de Arte Contemporânea de autores renomados em uma série de estações do metrô. E o Linha da Cultura é aberto a projetos de artistas, que são selecionados para exposições temporárias também no metrô. Enquanto o texto de Arte no Metrô está disponível permanentemente no painel, o texto da Linha da Cultura é trocado a cada mês, (no painel que fotografamos, esse painel remete ao mês de outubro de 2019).

Podemos considerar uma proximidade desses textos aos textos de exposições em museus, também chamados de textos expográficos[7], na medida em que ambos abordam exposições artísticas, obras de arte em sua espacialidade, “guiando” de certo modo os leitores em seu percurso. Porém, os textos de metrô que analisamos apresentam uma especificidade, que é a de considerar os sujeitos em movimento em espaços abertos, em uma temporalidade de passagem, o que condiciona os modos de visitação, fruição ou até mesmo a dispersão dos passageiros. Enquanto nos museus, a diversidades de textos e de materialidades exposicionais é cada vez mais acentuada, contemplando-se diferentes sensibilidades, nas estações de metrô que visitamos há uma limitação dos textos expográficos, com tendência a anunciar as obras, indicar sua localização e fornecer uma breve descrição, enquanto os textos de apresentação mais extensos, explicativos, especializados, podem ser encontrados no site do Metrô e em outros endereços da Internet.

Isto posto, na análise que segue vamos nos limitar ao estudo do painel Arte no Metrô, e mais especificamente, como adiantamos, a uma das obras ali indicada e descrita: o painel Des-aceleração, de Fernando Lemos.

 

O passageiro em movimento e a fruição artística

Abaixo focamos o painel Arte no Metrô. O texto é organizado em uma primeira parte, introdutória, em que há um texto verbal direcionado aos passageiros, seguida do corpo do painel com imagens reduzidas e descrições das obras. Estas são indicadas por pequenas fotos distribuídas pelas linhas do metrô, estando presentes as seguintes linhas: linha 1 Azul, linha 2 Verde, linha 3 Vermelha, linha 5 Lilás:

 

Uma imagem contendo PowerPoint

Descrição gerada automaticamente  

Fonte: acervo do autor

Tomemos primeiramente, para análise, o texto introdutório, localizado na parte de cima do painel:

Entre uma viagem e outra, você pode apreciar o acervo de arte contemporânea nas estações do Metrô de São Paulo. Produzidas por renomados artistas plásticos, as esculturas, painéis, pinturas e instalações integram-se à arquitetura das estações e convidam à contemplação. Conheça as estações com obras de arte e crie o seu próprio roteiro cultural.

 

Podemos remeter esse texto à posição institucional já desenvolvida nos itens anteriores, na qual se produz um discurso educativo para a “massa” de sujeitos que frequenta o metrô. A partir dessa posição de educador divulgador das obras, o discurso é orientado para os interlocutores passageiros, em um certo período temporal: “Entre uma viagem e outra”. A preposição “entre” marca aí os espaços intervalares entre as viagens, dentro do que estamos considerando como um discurso de transição espacial. Nesse entremeio, o discurso didático aponta o que o sujeito “pode” fazer no período em que se encontra nas estações, especialmente “apreciar o acervo de arte contemporânea nas estações do Metrô de São Paulo”. O sujeito leitor é identificado pelo pronome “você”, marcando uma relação próxima, convidativa, imaginando-o como um sujeito apreciador das artes, individualizando-o em meio à multidão. Esse sujeito é convidado a “apreciar”, “contemplar”, “conhecer” e “criar” seu próprio roteiro cultural. 

O “convite” é uma tipologia recorrente em exposições de arte, e quando ele ocorre em um espaço público como o das estações de metrô, de modo permanente, marca-se uma outra relação com o leitor passageiro, que não é apenas a de usuário de transporte público. Trata-se de um convite para que o sujeito ocupe a posição de sujeito cultural e de fruidor de obras artísticas. Seria a nosso ver, um dos posicionamentos possíveis para esse sujeito em seus momentos de repouso, de transição entre uma viagem e outra, ou entre a chegada em uma estação e a saída para a “rua” (no caso, a Avenida Paulista, um dos mais conhecidos polos culturais da cidade). Enquanto isso, há também os “renomados artistas plásticos” que produzem as obras, imagem de artistas reconhecidos publicamente, que se busca aproximar dos apreciadores de arte.

É interessante notar que o “convite” aparece sintaticamente como sendo feito pelas obras de arte (personificação), estando estas “integradas” à arquitetura das estações. Assim, a voz de quem convida, que poderia ser a dos organizadores das exposições, ou mais amplamente da instituição metroviária, aparece silenciada, transformada, enquanto a localização das obras, ligadas à arquitetura em que se encontram, mostra-se como convidativa. Isso confere uma imagem universalizada para o discurso didático, com ausência de marcas de primeira pessoa, como em um convite anônimo, uma informação pública.

Diante do painel com ares de convite de exposição, colocamos a questão de saber de que modo a fruição, a “apreciação”, a “contemplação” poderia ter lugar nas estações. Ao ler nesse painel a legenda da obra “Des-aceleração”, deparamo-nos com uma nomeação que nos pareceu pertinente para a análise: Vejamos o detalhe da legenda abaixo da imagem do painel:

Fonte: acervo do autor

A nomeação suscita a questão da relação da obra com o local em que ela se encontra, na medida em que os trens nas estações apresentam movimentos de aceleração e desaceleração. Pensamos, diante disso, para a continuação do trabalho, analisar a nomeação da obra e em seguida refletir sobre as diferentes situações de “fruição” pelos sujeitos.

 

Nomeação e equívoco

Bernard Bosredon (1999, p. 20), ao analisar títulos de pinturas, nota que a maior parte dos títulos são construídos por meio de nomes ou sintagmas nominais, como nomes próprios de pessoas (Celestine, de Picasso), nomes próprios de lugares (Sacré-coeur, também de Picasso), nomes comuns (Montagne, de Kandinsky), nomes comuns expandidos (Jeune fille em Blanc dans um Bois, de Van Gogh). O autor aponta duas funções das nomeações: a função referencial (o nome significa o quadro, a pintura) e a função designativa (o nome descreve, representa a pintura). Dentre as formas de nomeação menos frequentes, importa aqui ressaltar aquela que coloca em cena um “jogo de linguagem”, como é o caso do título Galacidalacidisoxyribonucléidacide, de Dali. No caso da nomeação Des-aceleração, temos também um certo jogo de linguagem, propiciado pelo hífen, que coloca em relação duas palavras: aceleração e desaceleração. Pensando discursivamente, temos aí um equívoco e, conforme Pêcheux (1983), podemos analisar a relação entre a estrutura do nome e o acontecimento da fruição da obra pelos sujeitos no espaço das estações. Analisemos a nomeação da obra de Fernando Lemos inserida na descrição abaixo:

 

 

Linha 2-Verde - Estação

BRIGADEIRO

 

TÍTULO: DES-ACELERAÇÃO

ARTISTA: FERNANDO LEMOS

GÊNERO: PAINEL

DATA: 1991

TÉCNICA: PINTURA A REVÓLVER.

MATERIAL: LAJOTAS DE CERÂMICA DE 0,50 M X 0,50 M E TINTA.

DIMENSÕES: 2,00 M X 20,00 M

PESO: NÃO ESPECIFICADO

LOCALIZAÇÃO: PAREDE EM FRENTE A PLATAFORMA SENTIDO VILA MADALENA.

 

http://www.metro.sp.gov.br/cultura/arte-metro/arte-metro.aspx

 

Temos aí uma descrição institucional da obra, que obtivemos no site do Metrô de São Paulo (COMPANHIA DO METROPOLITANO, 2019, s.p.). A identificação da estação (Brigadeiro), assim como a localização da obra (parede em frente à plataforma sentido Vila Madalena) marca a orientação espacial que é oferecida aos leitores para apreciação do painel. Sendo obra autoral, o nome de autor é indicado, bem como o tipo (“painel”), e mais abaixo as dimensões que apontam para uma grande escala. Também aparece o material (lajotas de cerâmica) e a técnica (pintura a revólver). O título “Des-aceleração” está inserido, desse modo, em uma regularidade descritiva comum a todas as obras autorais expostas no sistema do metrô, de modo a formar uma rede de obras e autores considerados renomados. Assim, a titulação, inserida na textualidade descritiva, além de nomear a obra, tece ligações dessa obra com um autor, uma tipologia, uma técnica, um certo tipo de material e seu peso, uma localização, uma dimensão ou escala. Tal rede de significações resulta da organização institucional do acervo do Metrô, de uma leitura de arquivo que identifica e classifica as obras.

A nomeação “des-aceleração” não remete aí a uma significação pictórica do quadro nem a uma representação ou descrição unívoca, mas sim um jogo de linguagem morfológico-lexical, que condiciona equívocos para a nomeação em seu funcionamento discursivo. O hífen, ao separar o morfema [des-] da lexia [aceleração], marca a possibilidade de uma dupla formação de palavra (aceleração e desaceleração). Além disso, temos aí uma forma de nominalização, da qual depreendemos a relação com os verbos acelerar e desacelerar, assim como as possibilidades de preenchimento das posições de sujeito e complementos desses verbos[8]. E se tomamos em conta o jogo que Pêcheux mostra entre estrutura e acontecimento, levantamos enunciados possíveis de se encaixarem nessa estrutura morfo-sintática. Chegamos, assim, a formulações como: “O trem acelera pelo túnel da estação”, “O trem desacelera pelo túnel da estação”, “O passageiro acelera o passo”, “O passageiro desacelera o passo”. Outra alteridade que podemos indicar é a que está presente no discurso institucional explicitado anteriormente, na fala da curadora do programa de Arte no Metrô: “. Entende Radha que o homem moderno é caracterizado pela percepção fragmentada das coisas e que essa fragmentação tem suas origens na aceleração da vida”. Ressaltemos finalmente a imagem de metrópole pujante, que no século XX cresceu em grande velocidade, tornando-se influente sendo considerada no senso comum da época como a “locomotiva do Brasil”.[9] Assim, há uma série de discursos passíveis de incidir sobre a estrutura da nomeação Des-aceleração, que joga com as espacialidades da estação, os rituais dos meios de transporte (sujeitos a falhas), a vida acelerada (ou em desaceleração) dos sujeitos, a dinamicidade urbana, etc.

 

Fruição na plataforma: sentidos em repouso

O painel Des-aceleração encontra-se fixado na parede do túnel do metrô, na estação Brigadeiro, próximo ao embarque em direção à estação Trianon-Masp. Os frequentadores da plataforma se aproximam do painel quando vão aguardar o trem, mas mantêm certa distância, na medida em que o painel se encontra do lado oposto, separado pela linha do trem.  É uma obra de grande escala, que também pode ser observada de mais longe. Selecionamos para a análise duas fotos do painel, acompanhadas respectivamente de dois recortes de detalhe. A primeira foto mostra o painel em profundidade, em perspectiva, seguindo em direção ao túnel. A segunda apresenta o painel frontalmente, sem perspectiva, de modo a focar seus traçados simétricos e a materialidade pictórica. Os recortes de detalhes que acompanham cada foto foram obtidos por meio de aproximação, pelo recurso de zoom. Seguem abaixo as fotos e os recortes:

 

(1)

Uma imagem contendo trem, pista, colorido, pequeno

Descrição gerada automaticamenteUma imagem contendo laranja, embaçado, toalha

Descrição gerada automaticamente

Fonte: acervo do autor

(2)

Uma imagem contendo colorido, laranja, frente, pequeno

Descrição gerada automaticamente

Fonte: acervo do autor

O painel em perspectiva (1) faz.com que o olhar percorra uma variação formal das peças do painel, de modo que cada lajota pareça mais estreita, na medida em que o painel adentra o túnel, como se nota mais de perto no detalhe recortado. A textualidade em perspectiva faz.com que o observador, em repouso na plataforma, se exponha a sentidos de movimento e de variação de dimensões. Note se que uma série de fotos com esse mesmo enquadramento de perspectiva circula pela Internet, no site do Metrô e também no painel descritivo que analisamos mais acima. Isso vai de par com as significações de aceleração e desaceleração mobilizadas pela nomeação e pelos discursos disponíveis sobre a aceleração da vida, da cidade, dos sujeitos.

Já a segunda foto apresenta uma simetria em duas dimensões, favorecendo uma maior proximidade e exame de seu modo de construção geométrica, notando-se por exemplo as combinações utilizadas para a montagem do painel, seus motivos e variações, jogos de cores e de brilho. O detalhe por aproximação permite observar que os limites entre as cores, em alguns casos, são marcados por uma linha reta demarcatória, enquanto em outros casos não há linhas, mas sim transições em degradê. Com isso, há uma alternância entre peças separadas estritamente por uma reta, e peças em que há transições suaves, que quebram a rigidez da geometria. Assim, rupturas e continuidades são significadas respectivamente pelos limites em linha reta ou em degradê, como movimentos que prosseguem ou são interrompidos.

Seja na foto de perspectiva, seja na aproximação bidimensional, vemos que há indícios de significações de movimento que podem ser associados à aceleração/desaceleração. São olhares possíveis para posições de observação na plataforma, a partir das quais são selecionados pontos de enquadramento, detalhamento, visualização pictórica.

 

Fruição em viagem: sentidos em movimento

Neste recorte, analisamos uma viagem pelo trem do metrô, saindo da estação Brigadeiro, onde está exposto o painel de Fernando Lemos, em direção à estação Trianon-Masp. Com esse intuito, fizemos uma gravação de vídeo durante uma viagem nesse percurso, deixando a câmera estática diante de uma janela, em uma das portas do vagão, enquadrando a parede do túnel. O vídeo permitiu observar o painel do ponto de vista de quem está em movimento no trem e mostrar gestos de interpretação da posição de sujeitos em viagem. Note-se que o intuito inicial era o de mostrar os efeitos da filmagem do painel fora do trem, porém essa expectativa foi contrariada, já que os efeitos luminosos flagrados “adentraram” o trem,

As imagens obtidas foram afetadas pelo jogo especular das janelas: pelas reflexões, refrações, luminosidades, difusões, mesclas, translucidez. Observamos uma superposição de imagens, uma mescla de efeitos visuais envolvendo as textualidades dos painéis, das propagandas, das placas informativas das estações, e também de passageiros e de um artista que se apresentava no vagão, tocando violão e cantando[10]. Além das imagens, as sonoridades participam das cenas do vídeo, especialmente os sons de aceleração e desaceleração do trem e da canção entoada pelo artista de metrô. A fusão de cenas estáticas e em movimento produziu imagens fantasmáticas, em que corpos e textos se misturavam nos instantes de luminosidades refletidas.

Dando continuidade à análise, obtivemos vídeos-fotos de instantes do percurso analisado, a fim de explicitar os efeitos de sentido observáveis nas imagens. Analisemos a série de fotos-vídeos, explicitando alguns dos efeitos que notamos:Uma imagem contendo pessoa, no interior, homem, em pé

Descrição gerada automaticamente

 

Uma imagem contendo no interior, pessoa, homem, trem

Descrição gerada automaticamenteUma imagem contendo no interior, armário, aberto, geladeira

Descrição gerada automaticamente Uma imagem contendo no interior, janela, olhando, homem

Descrição gerada automaticamente Uma imagem contendo no interior, trem, cozinha, forno

Descrição gerada automaticamente Uma imagem contendo pessoa, no interior, homem, em pé

Descrição gerada automaticamente

Fonte: acervo do autor

Luminosidade e sequenciação

A série de fotos representa uma sequência do percurso do trem, partindo da Estação Brigadeiro, passando pelas placas de sinalização da estação (em verde), em seguida pelo painel de 20 metros de Lemos (cores azul, vermelho e branco), por um painel de propaganda (amarelo) e depois chegando ao túnel em sua área não iluminada externamente. Nota-se a variação de luminosidade, na medida em que a parede do túnel, situada no espaço iluminado da estação, projeta imagens das textualidades (das placas e painéis artísticos e publicitários ali fixados), enquanto a parte intermediária do túnel não o faz. Desse modo, a sequenciação do visual, em sua formulação discursiva, mostra o jogo de luzes e sombras, bem como as refrações das textualidades e das corporalidades no espaço-tempo do trem em movimento. Enquanto isso, na última vídeo-foto, nota-se uma penumbra, sendo que somente a iluminação interna do trem é ali notada.

Ao considerar a luminosidade na sequenciação do discurso, vimos que a cintilação das luzes, as variações de brilho e cor, as pulsações, as distorções, conformam efeitos de textualidade a partir da posição simuladora do sujeito em viagem. Assim, o olhar que mira a janela, por meio da câmera fixa, se depara com imagens não programadas, não organizadas, mas que flagram o sujeito viajante, expondo-o às alteridades materiais e sociais e a efeitos de sentido inusitados.

A narrativa que aí se constitui está sujeita a uma alteridade social desconhecida, estranha, surpreendente, enquanto os efeitos pictóricos e sonoros e suas ressonâncias artísticas, projetam certas familiaridades, numa sociabilidade que combina a estranheza da convivência pública com lampejos de identificações sociais, institucionais, artísticas, em movimento.

 

Refração, estranheza e sociabilidade

Buscando compreender alguns dos efeitos da visualização do percurso da viagem, o jogo de refração pelas janelas do trem surge como um dos condicionantes da estranheza e da surpresa. As imagens obtidas surpreendem, pois, com os efeitos luminosos, a distinção entre o que está dentro e o que está fora do trem se dilui e os jogos especulares se multiplicam de modo inusitado. Com isso, a cada instante flagrado pelas câmeras, notam-se formações específicas, com nuances diversas, envolvendo projeções luminosas dos textos artísticos e propagandísticos e dos corpos dos viajantes em suas posturas no interior do vagão.

As imagens caleidoscópicas, prismáticas, fantasmáticas, produzem difusões de sujeitos e objetos, num mosaico simbólico de materialidades. O olhar dirigido para a janela não reflete o sujeito observador, mas uma série de alteridades in(visíveis). Se acrescentarmos à nossa observação das estranhezas e sociabilidades a questão da memória discursiva, podemos tomar os efeitos de refração como operadores de memórias múltiplas, efêmeras, que se fundem e dissolvem em instantes passageiros, flashes de evocações que transitam entre as subjetividades institucionais, artísticas, mercadológicas e aquelas suscitadas pelas corpos dos viajantes: posturas de reflexão, distração, leitura, conversação, dentre outras percebidas nos percursos analisados.

 

Translucidez

Algumas marcas examinadas nas vídeo-fotos suscitaram uma reflexão sobre a espessura da linguagem, nas fronteiras entre a transparência e a opacidade discursivas. A translucidez nos parece uma marca visual interessante para abordar os discursos de transição espacial. A superposição de imagens no metrô se dá de tal modo que se notam os vultos dos sujeitos recobertos pelos indícios das formas e cores dos painéis, dentre outros componentes das cenas. A translucidez, obtida pelas luminosidades e refrações, torna possível a mescla imaginária de materialidades. Entre a clareza e a opacidade, a distinção e a indistinção, a translucidez significa as nuances e as transições de sentido, nas fronteiras das textualidades.

Na série analisada, vemos que, nas quatro primeiras vídeo-fotos, os corpos dos passageiros se mesclam com a luminosidade do painel sinalizador e em seguida do painel artístico e da propaganda, de modo a sobrepor ou a indistinguir um do outro, enquanto na última video-foto a penumbra do túnel torna mais nítido os corpos dos sujeitos. Na temporalidade da viagem, temos então variações de nitidez resultantes de diferentes efeitos de translucidez. Na linguagem em movimento, a nitidez e o embaçamento se alternam no discurso.

           

Conclusão

Nesta análise trabalhamos a relação entre o discurso institucional e os movimentos dos sujeitos na estação do metrô. De um lado, a instituição convida o leitor a entrar em contato com as obras expostas nos espaços das estações; de outro, há diferentes modos de os sujeitos se relacionarem com as obras.

O recorte que efetuamos nos levou a refletir sobre dois posicionamentos de visualização. Na posição de observador situado na plataforma, explicitamos a distinção entre o olhar em perspectiva e o frontal, mostrando diferentes efeitos de sentido, entre movimento e repouso, entre a materialidade do painel situada no espaço e a materialidade pictográfica interna ao painel, entre a delimitação por linhas e a gradação de cores. Tratamos tais efeitos como não apartados da relação com os sujeitos e a significação de seus movimentos no espaço da estação.

Na posição de observador no interior do trem, confrontamos as situações em repouso do vagão, de onde efetuamos a filmagem, com a espacialidade do painel artístico em movimento relativo no túnel do metrô. A análise de efeitos inusitados conduziu à discussão sobre as noções de luminosidade, refração e translucidez. Como efeito das projeções, as luminosidades do painel apareceram no interior do trem, sobrepostas, atravessadas por entre os espaços, os objetos, os corpos dos sujeitos presentes no vagão.

A utilização de tecnologias de foto e vídeo condicionaram a análise do discurso artístico produzido no metrô. Essa prática foi considerada como parte da atividade do analista na relação com o Dispositivo de Interpretação da Análise de Discurso, ou seja, não como um instrumento neutro ou utilitário, mas como uma tecnologia de observação da cidade, sujeita a equívocos, que produz materialidades textuais, propiciando ou afetando o andamento da análise: a formulação de questões, a montagem de corpus, os procedimentos metodológicos. Um dos pontos que gostaria de salientar quando aos resultados da presente análise foi a obtenção de imagens inusitadas frente à proposta inicial de observar os painéis externos ao trem. As análises das luminosidades, das refrações, dos efeitos de translucidez que misturam o dentro e o fora, somente foram possíveis após o contato com as fotos e filmagens obtidas, ou seja, em uma segunda etapa do trabalho. As imagens tornaram-se fatos inéditos, propiciando a reformulação das questões independentemente de expectativas iniciais do analista.

Outra questão que gostaria de apontar está ligada ao estudo da espacialidade urbana, especialmente do espaço de transição das estações de metrô, onde se encontram sujeitos provenientes de diferentes espaços citadinos. Se podemos falar em “transporte de massa” diante do grande número de passageiros que têm contato com as obras do metrô (cerca e 4 milhões por dia), nas situações analisadas lidamos com encontros fortuitos, em que “estranhos” entram em contato. A distinção entre passageiros na plataforma e passageiros no trem, em que baseamos nossa análise, permitiu o estudo de posicionamentos comuns a qualquer sujeito que faz uma viagem pelo metrô. Ao mesmo tempo, os encontros fortuitos que aí se deram, a convivência com a diversidade de passageiros, as aproximações de um e outros, as relações efêmeras nas aglomerações de espera e no interior dos vagões, sugerem pensar a sociabilidade desses locais, mediada por posturas, gestos, silêncios, ações, etc., deslocando o fragmentário em direção ao flagrante social da alteridade.

Além dos percursos organizados, individualizados para os sujeitos, nos letreiros, painéis de aviso, sinalizações, há também os encontros “desorganizados”, como diz Orlandi (2004), dentre os quais salientamos alguns instantes inusitados. O discurso artístico nos parece se apresentar aí como um dos que provocam a sociabilidade nos espaços das estações, demandando sentidos aos sujeitos em movimento, em mistura, em multiplicidade, congregando em meio às diferenças, aos estranhamentos, às distâncias.

Em uma das obras expostas na estação Sumaré, de autoria de Alex Flemming, instalada em 1998, são reunidos vários retratos anônimos, fotografados frontalmente como nos passaportes e nas carteiras de identidade. Vejamos esta foto obtida nessa estação:

Uma imagem contendo placa, frente, placar, grande

Descrição gerada automaticamente

Fonte: acervo do autor

Sobre cada foto, o autor gravou poemas com letras coloridas, como das velhas máquinas de escrever. Ao comentar essa obra, o artista plástico Fábio Magalhães afirma que:

 

Alex Flemming, ao desenvolver seu projeto de arte para o Metrô de São Paulo, levou em conta essa multidão que se reúne e se dispersa, silenciosa ou barulhenta, rumo ao trabalho, ao jogo de futebol e que regressa a seu bairro. Levou em conta também sua experiência pessoal, sua memória de viajante, a lembrança dos seus retratos nos inúmeros passaportes.

A fotografia de passaporte serviu como metáfora, como registro do povo usuário do metrô. Flemming cria uma poética que faz aflorar em nós a inquietação do outro e descobrir o calor humano da pessoa estranha, do desconhecido que está ao nosso lado. (METRÔ DE SÃO PAULO, 1998, s.p.)

 

Diante das identidades cidadãs massificadas, os toques poéticos das letras gravadas nas fotografias rompem a inércia do anonimato e da massa restrita à funcionalidade do transporte. Assim como as luminosidades do painel Des-aceleração, projetadas nos corpos dos viajantes do metrô, tais gestos de interpretação produzem sentidos artísticos, narrativas e memórias que trazem inquietações, sentidos inusitados, esboçando sociabilidades para os sujeitos em seus trajetos pelas estações: parando, sem nunca parar.

Uma vez compreendido o processo discursivo, o contato com outras manifestações artísticas no metrô faz ressoar os sentidos com que nos deparamos durante a análise: fruição discursiva.

 

 

 

 

Referências Bibliográficas

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[1] Diante do imaginário institucional, que organiza sentidos, buscamos por outro lado flagrar os fatos de “desorganização” da cidade. Segundo E. Orlandi, “Atravessando esses efeitos imaginários, tratamos de compreender aspectos ‘flagrantes’ da cidade, certos modos de aparição por gestos que dão corpo à cidade mostrando-nos como ela se materializa, aqui e lá, em sentidos que estão sempre em movimento, sempre incompletos. Pela análise buscamos uma aproximação do real da cidade e da experiência dos sujeitos em suas rupturas, sua ‘desorganização’.” (A cidade como Espaço Político-Simbólico e Sentido Público. In: Discuso e Texto. Campinas: Pontes Editores, 2001, p. 194-195).

[2] Ver E. Orlandi (As formas do silêncio. Campinas: Editora da Unicamp, 1992).

[3] Evocamos aqui o estatuto da “textualidade” na Análise de Discurso, ligada aos modos de formulação e circulação dos discursos em diferents materiais: “os diferentes materiais e as diferentes superfícies determinam diferentes relações com/de sentidos. Escrito, ou oral, letra ou sinal, letreiro, painel, corpo. textura, tamanho. Cor, densidade, extensão, tudo significa nas formas da textualização, nas diversas maneiras de formular. Jogo da formulação, aventuras dos trajetos que configuram sua circulação. Acaso e necessidade.” (ORLANDI, Eni. Retomando a palavra: um corpo  textual? In: Discuso e Texto. Campinas: Pontes Editores, 2001, p. 205).

[4] Sobre a noção de “ferramenta imperfeita” (mauvais outil), a possibilidade de equívocos na relação língua-discurso e uma crítica à concepção de comunicação sem falhas, ver P. Henry (HENRY, P. A ferramenta imperfeita: língua, sujeito e discurso. Campinas: Ed. Unicamp, 1992).

[5] Remetemos aqui à distinção que se faz, na história da arquitetura, entre menir, caverna e cabana, sendo que a caverna e a cabana teriam funções de proteção, de abrigo. Com sua feição atual nos metrôs, teríamos, nesse sentido, um abrigo subterrâneo temporário, em meio aos movimentos dos sujeitos e, além da proteção, o trânsito e o contato com a arte.  Ver PEREIRA, J. R. A. Introdução à História da Arquitetura – das origens ao século XXI. Porto Alegre: Bookman, 2010; e NUNES, J.N. Sentidos de Cabana: arquitetura, urbanismo e arte. In: Pesquisas em Linguística: questões epistemológicas e políticas. Araraquara: Letraria, 2019.

[6] Segundo a professora e curadora Katia Canton, as tentativas de transformar o espaço de “fora”, em oposição aos espaços institucionais dos museus, teve como um de seus movimentos precursores a land arte, nos Estados Unidos, a partir dos anos 60, não como uma arte “de paisagem”, mas sim como uma arte feita “na paisagem”, em uma busca da solidão ou meditação como contraponto à urbanização crescente. No caso do metrôs, nosso objeto de estudo, trata-se de desdobramentos desse deslocamento para o exterior, trabalhando-se o espaço urbano e suas metáforas de movimento e quantidade populacional. Com diz Canton, “a partir da land art, o diálogo com o espaço público gradativamente se expandiu e modificou-se” e “Essa legião de anônimos, esse mundo de aglomeração é, afinal, nosso próprio espelho, e nele se refletem múltiplas facetas”. (ver Espaço e lugar. São Paulo: Editora WMF – Martins Fontes, 2009).

[7] Os estudos dos textos expográficos se disseminam em várias áreas. De uma perspectiva que considera questões de linguagem, mencionemos alguns deles: Mariagrazia Margarito. “Je suis dans le discours, donc j’existe...” L’objet d’art dans les textes d’accompagnement d’une exposition. Entremeios, v. 11, jul-dez, 2015; F. Rigat. Les textes expographiques: pour une approche de la langue-culture dans les expositions d’art moderne. Éla. Études de linguistique appliquée. Nº 138, 2005/2, p. 153-170; Marie-Sylvie Poli. L’effet didactif de textes poétiques dans une exposition de peinture. Sinergies Espagne nº 1 – 2008, pp.163-172.

 

[8] De acordo com P. Sériot, buscamos “saber como remontar da nominalização a essa ‘outra coisa’, a esse outro enunciado que não está no texto. Em seguida, de uma perspectiva discursiva, buscaremos saber qual é o espaço possível desse ‘alhures’” (Langue russe et discours politique soviétique: analyse des nominalisations. Langages, Larousse, 1986, p. 14)

[9] Note-se que nas últimas décadas, no entanto, essa imagem de movimento acelerado começou a ser desconstruída, de modo que temos também o sentido de desaceleração, diante de outras capitais e regiões do país: “São Paulo está ficando para trás. A desaceleração da velha locomotiva é suave, mas persistente. Enquanto o interior do Brasil e outras metrópoles pisam no acelerador, a capital paulista anda com o freio de mão puxado.” (TOLEDO, J. R. de, O Estado de São Paulo, 04/07/2011)

[10] Para evitar o reconhecimento facial dos passageiros, sombreamos nas fotos, com formas ovaladas em cinza, as partes que poderiam propiciar a identificação.