Parque Jambeiro/Campinas: rua, espaço e paisagem como possibilidades pedagógicas


resumo resumo

Juliana Damas C. Silva
Vera Santana Luz
José Roberto Merlin



Introdução

Este trabalho busca entender o espaço como uma instância social, priorizando aspectos educadores informais que o compõem, como uma continuidade da Pesquisa de Iniciação Científica 2018/19, “Morfologia e a Pedagogia da Rua”, na qual o centro de Campinas/SP foi o objeto de estudo (SILVA; MERLIN, 2020); na investigação atual foi escolhido um tecido periférico, o bairro Parque Jambeiro, Campinas/SP, como forma comparativa. Tendo como referência a Carta das Cidades Educadoras (2004), apresentada pela primeira vez em 1990, no 1° Congresso Internacional das Cidades Educadoras em Barcelona e, que contém vinte princípios que objetivam transformar todas as ações municipais em projetos educadores, a Pesquisa buscou entender a cidade como uma “grande escola” e as potencialidades territoriais educadoras para as relações comunitárias de determinada população, a partir de onde vive até determinados aspectos regionais.

Nesse contexto, o objetivo desse artigo é apresentar alguns resultados da Pesquisa, por meio de análises espaciais, aspectos de como o espaço urbano e a paisagem influenciam, de forma positiva ou negativa, o comportamento social, sob a égide do conceito de cidade educadora, analisando especificamente os espaços de uso público da cidade de Campinas em uma área periférica, a fim de desvelar como diferentes morfologias e tipologias podem potencialmente influenciar nas ações do homem como ser social, contrapondo diferentes ambientes.

A metodologia se deu pela seleção e análise crítica de referências bibliográficas, buscando um quadro para fundamentação teórica e referências documentais, para leitura territorial do estudo de caso, para estabelecer determinados resultados a partir da articulação conceitual com o objeto de estudo, uma vez que, em virtude do contexto epidemiológico (COVID-19), a visita de campo não pode ser realizada. O entendimento socioterritorial se configurou a partir de referências e mediante a utilização de instrumentos habituais à prática do arquiteto e urbanista, como desenhos, mapas, fotos, croquis, dentre outros. Buscou-se constituir uma síntese, outorgando ao território atributos, destacando pontos específicos investigados conforme as características do local, priorizando a materialidade e circunstâncias inerentes aos espaços, objetivando desvelar preceitos intervenientes que possam engendrar qualidade aos espaços públicos, potencializando-os como lugares educadores.

 

 

 

Espaços: livres, públicos, urbanos, educadores

Segundo Yi-Fu Tuan (2013), se o espaço é algo que permite movimento, o lugar é pausa. Os espaços são indiferenciados, até que se dotem de valor (TUAN, 2013); segundo Milton Santos, o espaço é “um conjunto indissociável sistemas de objetos e de sistemas de ações” (2006, p. 12); é uma instância social, como a economia, a cultura e a política. De acordo com o autor, o espaço é “um híbrido entre materialidade e sociedade, entre forma e conteúdo, entre fixos e fluxos, entre inércia e dinâmica e, entre objetos e sistemas de ações” (SANTOS, 2006, p. 220).

Quanto à conceituação de espaços livres, Queiroga et al. (2011) afirmam que são todos aqueles “descobertos, sem edificações, urbanos ou não, pavimentados ou vegetados, públicos ou privados” (2011, p. 27), por nós adotada para o presente trabalho.

O espaço público, por sua vez, recorrentemente pode ser entendido como o oposto ao privado; no limite, este entendimento tem o risco em derivar para a compreensão de que os espaços públicos venham a ser residuais, sem qualidade formal ou preocupação com civilidade e cuidado coletivo. No entanto, podemos afirmar que a coisa pública seja a representação do grau mais avançado de cidadania. Para alguns autores, passa a ser um objetivo do urbanismo moderno conceber esse espaço dotado de uma forma precisa e pré-determinada (HUET, s.d.). A partir de alguns pioneiros, como Fredrick Law Olmstead, desde fins do século XIX, estabelecem-se critérios para o que atualmente poderíamos denominar como sistema de espaços livres (QUEIROGA, 2011; QUEIROGA et al., 2011), que envolve elementos e relações que organizam e estruturam o conjunto de todos os espaços livres, tanto regionalmente como de um determinado recorte urbano, em associação. Parte-se do princípio de que toda e qualquer cidade possui, mesmo que embrionários, sistemas de espaços livres, melhor ou pior conectados entre si, a partir do que esta Pesquisa pretendeu investigar potencialidades subjacentes em seu estudo de caso.

Considera-se que os espaços livres devem ser multifuncionais e atender a diferentes demandas da sociedade, a mudanças sazonais, ao entorno edificado, aos eventos organizados, às condições de segurança e, em especial, a serviços ecossistêmicos urbanos (MARQUES, 2020). Para nosso escopo e entendimento, partimos do princípio de equiacessibilidade (QUEIROGA et al., 2011), ou seja, um sistema que considere a distribuição desses espaços na cidade e sua acessibilidade pelos diversos meios de transporte. De acordo com o autor:

 

Diante de uma mobilidade e de uma renda média crescente no país pode-se não apenas prover a população de espaços livres mais adequados, mas propiciar à população o direito de escolha em conhecer e se apropriar mais destes ou daqueles espaços livres, segundo seu tempo disponível e interesse específico neste ou naquele equipamento público. (QUEIROGA et al, 2011, p. 19)

 

Conforme aponta Marques (2020), segundo o TEEB – The Economics of Ecosystems and Biodiversity in National and International Policy Making (2011), a respeito de serviços ecossistêmicos, temos:

 

(...) os serviços de provisão são aqueles baseados nos produtos ou saídas materiais dos ecossistemas tais como, alimentos, água, produtos medicinais etc. Os serviços de regulação são aqueles responsáveis pela manutenção e regulação das funções ecossistêmicas relacionadas à qualidade do ar, do solo, da água (incluindo o manejo da quantidade das águas e o controle de enfermidades). Quanto aos serviços de suporte ou habitat, estes fornecem apoio a todos os outros Serviços Ecossistêmicos e incluem a provisão de espaços para a diversidade de organismos, plantas e animais, produção de biomassa, ciclos de nutrientes etc. Finalmente, os serviços culturais são aqueles não-materiais e incluem os benefícios socioecológicos (por exemplo psicológico e cognitivo), recreacionais e estéticos. (TEEB, 2011, apud MARQUES, 2020, p. 49)

 

Segundo Cabezudo, “o espaço urbano é uma escola sem paredes e sem teto” (CABEZUDO, 2004) e o seu principal espaço livre é a rua, a qual é, também, o principal elemento de conexão e onde acontece grande parte da vida cotidiana da sociedade.

A Carta das Cidades Educadoras determina valores e princípios que uma cidade educadora assume, reconhecendo, como seu principal desafio, promover equilíbrio e harmonia entre identidade e diversidade, garantindo o direito de todos seus habitantes de se sentirem reconhecidos pela sua identidade cultural. Dentre seus 20 princípios (AICE, 2004), estes foram reconhecidos como mais articuláveis à situação urbana deste estudo:

Princípio 1: Todos os habitantes de uma cidade terão o direito de desfrutar, em condições de liberdade e igualdade, os meios e oportunidades de formação, entretenimento e desenvolvimento pessoal que ela lhes oferece [...]

Princípio 5:[...] O papel da administração municipal é o de definir as políticas locais que se revelarão possíveis e o de avaliar a sua eficácia, assim como de obter as normas legislativas oportunas de outras administrações, centrais ou regionais;

Princípio 7: A cidade deve saber encontrar, preservar e apresentar sua identidade pessoal e complexa. [...];

Princípio 8: [...] O ordenamento do espaço físico urbano deverá estar atento às necessidades de acessibilidade, encontro, relação, jogo e lazer e de uma maior aproximação com a natureza. [...];

Princípio 10: O governo municipal deverá dotar a cidade de espaços, equipamentos e serviços públicos adequados ao desenvolvimento pessoal, social, moral e cultural de todos os seus habitantes, prestando uma atenção especial à infância e à juventude;

A eleição de um bairro periférico pressupõe a segregação socioespacial como situação sistêmica urbana no Brasil (Princípio 1), cujas políticas públicas tendem a acentuar pela falta de provimento (Princípio 5) (MARICATO, 2013), cuja relação socioambiental em geral apresenta conflitos entre o direito à cidade e o direito ao meio ambiente (Princípio 8), em espaços desprovidos de infraestrutura, equipamentos e espaços públicos de qualidade (LUZ, SILVA, 2020).

A partir da autora Cabezudo, propondo a cidade como uma grande escola e validando os conceitos da Carta das Cidades Educadoras, busca-se conhecer, problematizar e enfatizar os princípios educadores da rua.

Caminhar, ou até mesmo pedalar, pode potencializar relações interpessoais afetivas. Para que essa experiência seja positiva, é preciso que a qualidade dos espaços seja garantida e, consequentemente, que seus usuários se sintam seguros e dispostos a usá-los. Se reforçarmos a vida na cidade de modo que mais pessoas caminhem e passem um tempo nos espaços comuns, em quase todas as situações haverá um aumento da segurança, tanto da real quanto da percebida (JACOBS, 2000). A presença de outros indica que um lugar é bom e seguro. Existir “olhos na rua” e frequentemente “olhos sobre as ruas” (GEHL, 2013, p. 99), além de fachadas ativas, poucos muros, iluminação, proteção contra intempéries e arborização são fatores importantes para garantir a segurança dos usuários.

O papel positivo almejado para transformar a rua num lugar educador é justamente transformar esse espaço considerado não lugar em um espaço de convívio da comunidade, propondo-se à diversidade étnica e social, tirando proveito das diferenças para aprender na convivência. Segundo Bradshaw (1993) existem alguns conceitos, que juntos conformam o Índice da Caminhabilidade, os quais contribuem para a identificação de espaços potencialmente educadores e para validar o conceito de pedagogia da rua, além de ser uma forma de medir a qualificação do espaço para o andante. Estes critérios conceituais passam por:

Segurança: interface da rua com as edificações, sinalização, iluminação e largura das calçadas;

Conforto: inexistência de obstáculos, proteção contra intempéries, presença de arborização das vias e praças, existência de mobiliário urbano, locais de permanência, evitar poluição sonora e sujeira nas vias;

Acessibilidade: obediência às leis e normas de acessibilidade (no nosso caso a NBR 9050/2020) (ABNT, 2020).

Citamos em complementariedade conceitos que Merlin e Queiroga (2011, p. 10) propuseram e que sintetizam hipóteses acerca de espaços educadores, sendo esses:

Relações com o entorno: quando permitem ampla acessibilidade, respeitam o meio ambiente e consideram o entorno;

História do lugar: quando relatam a história do lugar desvelando os eventos significativos pregressos, evidenciam como e quando foram concebidos e construídos e revelam intencionalidade dos propositores (agentes sociais, políticos, autores);

Encontros humanos: quando estimulam eventos sociais, políticos ou culturais, promovem relações interpessoais e o respeito à alteridade;

Suscitar percepções: quando aguçam os órgãos dos sentidos humanos (visão, olfato, tato, audição, gustação) e facilitam a eclosão de sensações de estranhamento;

Qualidade do design: quando os programas de necessidades permitem múltiplos usos e atividades e, principalmente, dignificam o lugar como produção cultural oferecendo espaços de qualidade funcional, técnica, ética, política e estética à apropriação pública pela qualidade do seu desenho.

Uma arquitetura adequada a seu espaço e seu tempo pode instigar sensações e estimular o processo de conhecimento. Uma maneira de incentivar relações de conhecimento entre sujeito e objeto no processo perceptivo do ambiente, espaço e território é a partir dos sentidos – tato, paladar, olfato, visão e audição – que são os meios de interface primordial que propiciam o aprendizado das coisas pelo homem. A arquitetura, além de permitir despertar e usufruir os complexos processos da percepção, pode transmitir segurança. Para ilustrar este âmbito recorremos à Teoria das Janelas Quebradas.

 

A Teoria das Janelas Quebradas

No fim da década de 60 o professor da Universidade de Stanford, Philip Zimbardo, desenvolveu uma teoria, denominada Teoria das Janelas Quebradas, com base em experimentos em diferentes tecidos urbanos. Os experimentos se constituíram de: dois automóveis idênticos foram abandonados em dois bairros diferentes, um no Bronx, em Nova Iorque, bairro conflituoso e pobre, e o outro em um bairro rico de Palo Alto, na Califórnia (WILSON; KELLING, s. d.). O veículo que se encontrava situado no Bronx foi deteriorado em questão de minutos; os primeiros a chegarem foram uma família composta por pai, mãe e filho, que roubaram o radiador e a bateria; no fim do dia, tudo o que havia de valor no veículo foi roubado. A partir desse momento todo o resto foi destruído, janelas foram quebradas e o estofamento foi rasgado.

Em Palo Alto o automóvel ficou intocável por uma semana, até o momento que os cientistas envolvidos decidiram por quebrar uma janela do carro. No mesmo dia algumas pessoas que passaram por ele o destruíram por completo. Um item de valor abandonado, não-assistido, tenderia, portanto, a se tornar uma oportunidade para que pessoas que passam por ele o enxergassem como diversão, inclusive violenta. Devido à natureza à qual é submetida a comunidade do Bronx e à frequência em que carros lá são abandonados, roubados e destruídos, isto contribuiria para o sentimento de que “ninguém se importa” e para que o vandalismo tenha começado muito mais rapidamente do que em Palo Alto. Neste último, por outro lado, onde essas ações não são rotineiras, o vandalismo aconteceria somente com um ato indutor e, quando se percebe que não há um senso de respeito mútuo e as obrigações de civilidade não são seguidas, de modo que “ninguém se importa”, uma cadeia de ações degradadoras seria ativada.

A teoria sugere que esse comportamento indesejado possa levar também a problemas na segurança da comunidade e que ruas, lotes e praças limpas e organizadas urbanisticamente trazem maior segurança aos cidadãos e diminuem o número de ações degradadoras, incentivando os moradores, entre eles idosos, adultos e crianças a utilizarem as ruas e os espaços públicos.

Um vidro quebrado induziu ao “vale tudo”. Logo, os resultados destes experimentos indicaram que os comportamentos agressivos não se ateriam apenas a grupos sociais de baixa renda, mas que as atitudes das pessoas seriam influenciadas pelo ambiente. Nesse raciocínio, o vidro quebrado do carro transmitiria a ideia de desinteresse, deterioração e despreocupação, criando a ilusão de que não existem leis, vigilância ou regras, fazendo com que as pessoas pudessem se sentir livres para quebrar as normas de convivência. Verificou-se que cada novo ataque depredador reafirmou e multiplicou essa ideia, até que se tornou incontrolável, resultando numa “violência irracional”, que parece estar ligada à ausência de zelo pelos objetos e espaços urbanos.

Conforme mencionamos, fatores subjetivos, de caráter cultural, podem ser responsáveis por fazer com que um mesmo espaço seja interpretado de diversas maneiras, por cada usuário ou coletividades. Assim, cada pessoa usando um mesmo espaço, imprimiria para si uma marca própria, conforme informações de sua origem, crença, visão de mundo e gostos pessoais, transformando os espaços em catalizadores de formação humana pela troca coletiva. Porém, permanece, em certa medida, uma concepção hegemônica no Brasil, de que a rua seja vista como um local perigoso e, consequentemente, os que fazem parte deste espaço também são temerários, como dançarinos de rua, pessoas que vivem ou nelas moram e pessoas que usufruem da rua como espaço para uso de drogas – como uma generalização. Essa visão é potencializada por noticiários e programas policiais na mídia jornalística, que constroem uma visão negativa da rua e não como um espaço de convivência de diversas culturas e identidades.

Por muitas vezes a rua se transforma em um lugar mediador e de expressão cultural, com músicas e danças, a qual é apropriada pelos usuários como oportunidade de ocupar o tempo com algo prazeroso vinculado ao lazer e à convivência. A rua, como espaço de culturas, é onde se chocam ideias e conceitos, gerando tensões – caráter inerente aos espaços públicos. Porém, para aqueles que estão na rua e dela fazem parte, existem diversos processos educadores que despertam perspectivas críticas, criativas e humanizadas que, na base do diálogo, são fundamentais para a formação dos cidadãos.

 

Analogias possíveis para vislumbrar possibilidades: SPAWNERS - San Pablo Wathershed Neighbors Education and Restoration Society

O rio San Pablo na Califórnia é o curso d’água determinante da Bacia de nome análogo e está localizado próximo às cidades de El Sobrante, San Pablo e Richmond. É um dos únicos rios da região que, apesar de passar próximo a áreas urbanas, não foi canalizado; seu curso é camuflado por árvores e vegetações, sendo por vezes revelado no trecho urbano, por pontes. O rio tem grande importância histórica, pois está relacionado à primeira população de colonizadores, que ali chegou em 1817 e escolheu esse local para a implantação de sua comunidade, tendo o rio como fonte para consumo de água, pesca e, também, para irrigação das plantações circundantes. Com a chegada do trem, foi necessária a criação de uma barragem para facilitar o acesso às áreas próximas, alterando o percurso e as características naturais do rio. Outro grande impacto para o rio foi a urbanização, que se exponenciou após a Segunda Guerra Mundial, quando se constituiu um eixo comercial ao longo da barragem de San Pablo. Atualmente o rio é responsável por 10% do abastecimento dos distritos do East Bay e ainda é um refúgio para a vida selvagem nativa (SPAWNERS, 2018).

Nesse contexto, o grupo SPAWNERS (San Pablo Wathershed Neighbors Education and Restoration Society) foi formado no ano 2000, com o intuito de incentivar a comunidade local como ativa e consciente, capaz de proteger a Bacia do Rio San Pablo, através da apreciação e administração, por meio da defesa, educação e restauração dos habitats naturais. A primeira ação do grupo foi a limpeza das margens do rio, proximamente à biblioteca municipal de El Sobrante. A partir disso, o escopo do grupo passou a integrar restauração dos riachos, remoção de espécies de plantas invasoras, plantio de espécies nativas, monitoramento da qualidade da água, além de convocar estudantes a participarem das atividades propostas (SPAWNERS, 2018).

Atualmente o grupo possui um programa abrangente de atividades que busca, por exemplo, educar os moradores sobre a questão da poluição, em como o uso do solo se relaciona com a qualidade da água, em como identificar problemas relacionados a esta temática e encontrar soluções adequadas. As atividades procuram sempre envolver uma diversidade de cidadãos e organizações, públicas ou privadas, além de especialistas, favorecendo a troca de conhecimentos e recursos que apoiam e permitem os participantes a compreender e tratar de maneira eficaz os problemas relacionados à água. As atividades em andamento, descritas durante a realização da presente Pesquisa, são: gerenciamento e limpeza de riachos, jardins de plantas nativas, reuniões que são realizadas a cada dois meses, apresentadas por um orador convidado que traz novos tópicos relacionados à água; realização de um boletim trimestral distribuído aos residentes locais informando e promovendo as atividades do grupo; convocação de estudantes, através da divulgação do programa nas escolas locais, para participarem das atividades de monitoramento e restauração da qualidade da água; e eventos especiais, como a celebração do Dia da Terra, entre outros, que incluem passeio pelos rios da bacia, caminhadas, pesquisa e mapeamento de riachos (SPAWNERS, 2018).

O SPAWNERS conta com patrocínio do grupo The Watershed Project - uma organização sem fins lucrativos, desde 1997, que visa proteger e restaurar a bacia de São Francisco, Califórnia, com diversos programas que envolvem alunos, professores e voluntários na busca por educar a população sobre qualidade da água – e financiamento das atividades pelo grupo Contra Costa Conty Clean do Departamento de Conservação do Estado da Califórnia, além da ajuda de outras fundações e doações de voluntários e membros do grupo.

O grupo SPAWNERS, apesar das diferenças na formação socioespacial com o objeto de estudo, pode ser considerado um exemplo de ação comunitária na busca de manutenção dos espaços de lazer público, por meio de mutirões com adultos e crianças, no sentido de incentivá-los a cuidar do espaço que é de todos, possibilitando maior integração e, consequentemente, reforçando o processo de identidade com o local, fortalecendo laços entre cidadãos e cidade.

 

O Bairro Parque Jambeiro, Campinas, SP

Segundo o IBGE (2019), as Regiões Metropolitanas são constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, instituídas por lei complementar estadual, de acordo com a determinação do artigo 25, parágrafo 3° da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), visando integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum. Segundo a EMPLASA – Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano – recém extinta no atual governo do Estado, as regiões metropolitanas são constituídas por um conjunto de municípios próximos entre si e integrados socioeconomicamente a uma cidade central, a metrópole, e têm seus serviços públicos e de infraestrutura planejados regionalmente, a fim de melhor atender as necessidades da população. No entanto, somente em 2015, foi promulgado o Estatuto da Metrópole, Lei 13.089/2015, que “estabelece diretrizes gerais para o planejamento, a gestão e a execução das funções públicas de interesse comum em regiões metropolitanas e em aglomerações urbanas instituídas pelos Estados, normas gerais sobre o plano de desenvolvimento urbano integrado e outros instrumentos de governança interfederativa, e critérios para o apoio da União a ações que envolvam governança interfederativa no campo do desenvolvimento urbano” (BRASIL, 2015). O Estatuto da Metrópole foi modificado pela Medida Provisória 818/2018 e depois convertido em Lei 13.683/2018.

 

A Região Metropolitana de Campinas (RMC), criada em 2000 (Figura 1), é a segunda maior RM em população do Estado de São Paulo, contando com mais de 3,2 milhões de habitantes dos quais se concentram aproximadamente 1,2 milhões no município de Campinas (IBGE, 2019) e é composta por 20 municípios. Trata-se de uma região importante para o Estado pois, segundo a EMPLASA (2019), a RMC possui uma estrutura agrícola e agroindustrial, um centro inovador no campo das pesquisas científicas e tecnológicas e o segundo maior aeroporto em transporte de cargas, o Aeroporto de Viracopos.

Para o escopo deste trabalho, no sentido de entender a organização dos espaços públicos na escala da região metropolitana, foram realizados diagramas, denominados Diagrama A, Diagrama B e Diagrama C, em 3 escalas diferentes, que apontam a relação entre espaço urbano, os espaços livres e a hidrografia. O Diagrama A é um recorte que foca na cidade de Campinas e nos municípios vizinhos - apresentando 8 das 20 cidades da Região Metropolitana de Campinas. Neste primeiro Diagrama são identificadas as principais rodovias, o Aeroporto de Viracopos e a área de recorte deste estudo, o bairro Parque Jambeiro. Por este instrumento foi possível identificar as grandes massas verdes que envolvem os núcleos urbanos, sejam elas rurais ou de caráter ambiental, bem como verificar que, a despeito das cidades estarem em grande medida conurbadas, ainda pode-se encontrar grandes vazios entre municípios e em seus entornos, conforme é ilustrado na Figura 2, a seguir.

 

No segundo Diagrama foi realizada uma aproximação, abrangendo os municípios de Campinas, Hortolândia, Valinhos e Vinhedo, onde se pode verificar com mais clareza as áreas urbanizadas, livres e o sistema de rodovias mais imediatamente relacionado com a área de estudo; este Diagrama permitiu também identificar os elementos principais do sistema hídrico. É possível nesta escala a visualização de cursos d’água que cruzam a área de estudo, subafluentes do Rio Capivari. Nota-se a posição da área central do município de Campinas e em destaque a área de estudo, a sul (Figura 3).

 

O terceiro Diagrama tem foco no entorno imediato e nas áreas de influência do recorte de estudo, abrangendo apenas parte do município de Campinas; este Diagrama, revela a relação espacial entre o centro da cidade e o bairro Parque Jambeiro, além de permitir a visualização dos diferentes sistemas de espaços livres dessas áreas de influência associadas, em diversos momentos, aos rios existentes na malha urbana (Figura 4).

 

Foi possível inferir que, pela constante presença de espaços livres, muitos deles vegetados e articulados a corpos hídricos, em situações recorrentes regionais bem como na relação centro-periferia do município de Campinas, seria interessante estender a hipótese de espaços educadores praticamente intermitentes, articulando bosques, praças, ruas e parques de rio em conjuntos contínuos de paisagem.

Após o entendimento da inserção da área de estudo perante a Região Metropolitana de Campinas, realizamos, para a conveniente aproximação, a análise do recorte de território escolhido, o bairro Parque Jambeiro, conforme descreveremos a seguir, justificando esta escolha.

A escolha do Parque Jambeiro como objeto de estudo se deu na tentativa de investigar espaços públicos e ruas como potenciais agregadores de processos educadores para as comunidades de baixa ou média renda, na região periférica da cidade de Campinas, após a realização anterior de estudo semelhante em área central do mesmo município1. A seleção do bairro Parque Jambeiro se deu pelas principais circunstâncias, a saber: presença de um grande espaço público suprido por uma lagoa oriunda de sistema hídrico que perpassa o local, articulado a equipamentos escolares - não frequente em regiões periféricas ocupadas que, em geral, apresentam grande densidade construtiva e rarefação de vazios urbanos; presença de dois espaços verdes institucionalizados – o Parque das Águas e a Praça dos Esportes (Figura 5)2 – bem como pequenas praças de vizinhança; existência de arcabouço construído de valor histórico patrimonial.

 

Localizado a sul da cidade de Campinas, lindeiro a rodovia Anhanguera, o bairro dista, em linha reta, 6 km do centro da cidade e 11 km do Aeroporto de Viracopos.

O bairro se originou da Fazenda Jambeiro, que lhe deu o nome e foi uma das maiores produtoras e exportadoras de café da região, em 1860. Em torno de 1887, a fazenda passou por um processo de modernização, parte de suas lavouras foram na ocasião utilizadas como áreas experimentais do IAC – Instituto Agronômico – e a sede, que está atualmente em ruínas, foi construída.

Após a decadência do sistema de produção cafeeiro, a propriedade teve diversos proprietários, até que foi determinado seu loteamento, devido à expansão da malha urbana que já chegava próxima ao local. Com o crescimento e a ocupação do bairro, a sede da Fazenda se encontrava em alto grau de deterioração e, por esta razão, em 1989, 148 moradores locais firmaram um abaixo-assinado solicitando o tombamento e a restauração do imóvel, porém o processo de tombamento recebeu parecer favorável apenas em outubro de 1993 (AUGUSTO, 2012). Além da falta de manutenção, tanto do edifício quanto do bosque de figueiras ao seu redor, o local não possui iluminação, qualquer determinação uso que condicione sua apropriação, nem expedientes de segurança pública, tornando-se ponto de encontro para usuários de drogas. Dado que a sede da referida fazenda se situa, mesmo em ruínas, no bairro, esta passa a ser de interesse para o sistema de espaços livres educadores que propusemos a investigar. Podemos relacionar este elemento urbano à Teoria das Janelas Quebradas, inferindo que o local atualmente em ruínas poderia ser potencializado pela qualificação arquitetônica e urbana como espaço de fruição, incentivando os moradores a sua apropriação.

Para a análise do bairro, como ponto de partida, foi realizado um mapeamento dos principais equipamentos existentes e a linha de ônibus que o atende, ao que demos o nome de Mapa Síntese. Neste, destaca-se a presença da antiga sede da fazenda referida e, a norte desta, uma grande área livre com uma lagoa, conforme já mencionado e, a leste dela, outra grande área livre, de potencial uso rural; como equipamentos, assinala-se duas escolas públicas, uma praça de esportes, o Parque das Águas - área verde mais distante a nordeste, dois postos de saúde próximos e a única linha de ônibus que cruza o bairro, com seus respectivos pontos de parada. Notou-se que o Centro de Saúde (CS) de referência para o bairro é o CS Ipê, distante cerca de 3 quilômetros do bairro Parque Jambeiro, apesar de existir um centro de saúde mais próximo, o CS Jaime César Corrêa Lima, não utilizado pela comunidade; isto se dá pois a linha de ônibus que atende ao bairro - a linha 408 -, que tem como ponto final a Rodoviária, passa próxima ao CS Ipê, facilitando seu acesso pelos moradores do bairro Parque Jambeiro (Figura 6).

 

 

 

Quanto ao zoneamento, segundo a SEPLURB – Secretaria Municipal de Planejamento e Urbanismo – todo o bairro, inclusive as áreas verdes destacadas no Mapa Síntese apresentado à Figura 6, como produto da análise, está classificado como Zona Mista 2, ou seja, “zona residencial de média densidade habitacional, com mescla de usos mistos e não-residenciais de baixo e médio impacto compatíveis com o uso residencial e adequados ao sistema viário” (SEPLURB, 2018, p. 6)3. Quantos aos usos além do residencial, a zona permite: CABI - comércio atacadista de baixa incomodidade; CAMI - comércio atacadista de média incomodidade; CVBI - comércio varejista de baixa incomodidade; CVMI - comércio varejista de média incomodidade; SBI - serviço de baixa incomodidade; EMI - entidade institucional de média incomodidade; UP - preservação e controle urbanístico de valor histórico, arquitetônico, artístico, paisagístico e ambiental; UR - atividade rural dentro do perímetro urbano; e, SRF - preservação e controle urbanístico de valor histórico, arquitetônico, artístico, paisagístico e ambiental (SEPLURB, 2018).

O recorte da área de interesse imediato de estudo buscou contemplar não somente o Casarão Jambeiro, por sua importância histórica e pelo processo de identificação dos moradores com o espaço, mas também a grande área livre a norte e as sete quadras lindeiras também a norte dessa área. A delimitação do perímetro circunstanciado, conforme ilustrada à Figura 7, foi realizada a partir da morfologia dos elementos fundamentais do território conjugadas aos limites viários do traçado urbano, a saber:

a norte – a rua Sebastião Ignácio da Silva;

a leste – a rua João Nonato Rosetti que perfaz o limite com a zona livre rural;

a oeste - a avenida Paulo Corrêa Viana e,

a sul – a rua Eduardo Monkecevic que limita a praça das escolas e a da lagoa; a rua José Honório Filho que se relaciona com o término do tecido urbano e as ruas Flávia Pereira Netto e Artur Osvaldo Sigrist que envolvem o Casarão do Jambeiro.

Uma vez que não foi possível realizar nenhuma visita de campo, devido ao contexto epidemiológico (COVID-19) durante a pesquisa que dá origem a este artigo, como forma de entender as características e as dinâmicas do bairro e o processo de enraizamento e das relações interpessoais dos cidadãos com o lugar, foram realizados três levantamentos específicos da área de recorte, sendo esses: uso do solo, gabaritos, áreas livres e miolos de lote, que tiveram grande importância para esse estudo, pois nos revelaram a ocupação real do solo (Figura 7).

 

 

Foi também estudada a avenida Paulo Corrêa Viana, coletora de maior fluxo de pessoas a partir dos fixos, relacionados à maior presença de comércios, serviços e equipamentos institucionais (SANTOS, 1994), que evidentemente coincide com parte da rota de ônibus (Figura 6). As demais vias são locais, de menor fluxo. A partir do conceito de Bradshaw, de que os locais urbanos devem ser social e culturalmente diversificados, podendo assim aumentar o contato entre pessoas, pode-se considerar o entorno da avenida Paulo Corrêa Viana, pela concentração de comércios, serviços e equipamentos institucionais, como um espaço agregador, com potencial de caráter educador do bairro como um todo.

O levantamento dos gabaritos das construções do recorte de interesse imediato (Figura 8) nos permitiu visualizar a tendência da morfologia das construções existentes, contribuindo para o entendimento da paisagem local e a relação entre edificações e espaços livres. Confirma-se a média densidade, pela predominância de edificações residenciais de um a dois pavimentos, sugerido pelo ordenamento do solo e pelo que constitui a Zona Mista 2, da qual o bairro faz parte. Esse levantamento, somado ao de uso do solo e ao de espaços livres e miolos de quadra (Figura 9), possibilitou identificar hipóteses de potencialidades educadoras desse bairro, a partir da dinâmica de usos, da paisagem conformada e da quantidade e natureza dos espaços públicos, em analogia ao 8º princípio da Carta das Cidades Educadoras, que especifica: “A transformação e o crescimento de uma cidade devem ser presididos por uma harmonia entre as novas necessidades e a perpetuação de construções e símbolos que constituam referências claras ao seu passado e à sua existência.” (AICE, 2004).

 

 

O terceiro levantamento realizado é relativo à existência de áreas livres e miolos de lotes (Figura 9). A identificação desses espaços mostra, de modo importante, a potencialidade educadora do bairro, visto que são nesses lugares que ocorrem, predominantemente, encontros dos membros da comunidade, que é considerado por Merlin e Queiroga (2011) um dos parâmetros que sintetiza o espaço educador. Das áreas verdes identificadas, destacam-se as três maiores praças. A primeira, no limite sudoeste, conjugada a campo de futebol existente, adjacente às escolas, é uma grande área arborizada, com a presença de um corpo d’água e de calçamento em todo seu perímetro, porém não há nenhum tipo de mobiliário urbano que possibilite seu uso como um espaço de permanência, o que, se houvesse, poderia potencializá-lo.

A segunda grande área livre está a sudeste, contígua à anteriormente descrita, e faz limite com a zona livre rural, a leste do recorte de interesse imediato, como apresenta a Figura 9. Essa grande praça se constitui como uma área pública cercada, a qual atualmente possui, além do calçamento em todo seu perímetro externo, uma pista de caminhada, iluminação pública e algumas lixeiras. Porém, se trata de uma área que não recebe manutenção frequente do serviço público, e há registro de denúncias em noticiários locais, por parte dos moradores, sobre o assoreamento do lago (EPTV, 2017). A soma desses fatores resulta em um espaço que não é muito utilizado pela comunidade, pois, apesar de possuir iluminação e arborização, não se torna suficientemente um lugar atraente para permanência.

Segundo Gatti (2013, p.8) a qualidade de vida de uma cidade é, e sempre será, medida pela dimensão da vida coletiva que é expressa nos seus espaços públicos dispostos democraticamente pela cidade, seja no parque, na praça, na praia ou mesmo na rua.

Como decorrência da análise territorial do Parque Jambeiro, foi possível, no estudo de caso definir que:

o bairro é de uso predominantemente residencial de média densidade, com concentração de comércios e serviços ao longo da avenida Paulo Corrêa Viana que possui duas pistas com canteiro central de modo que se infere que o bairro tem potencial agregador comunitário e concentrações de convivência potencial nesta avenida;

possui equipamentos institucionais de educação e lazer, como a praça dos esportes, a oeste, e duas escolas públicas, a Escola Estadual Dr. Disnei Francisco Scornaienchi e o Centro de Educação Infantil Parque Jambeiro, localizadas próximas à grande área livre onde há um lago; isto indica a possibilidade de potencialização de espaços educadores articulados aos equipamentos de ensino e áreas livres como um conjunto;

há presença do patrimônio histórico, na grande quadra a sudeste, de importante significado, pois seria fonte de conhecimento e recurso de potencial importância na valorização da memória e da identidade das comunidades locais, contribuindo para promover, desta maneira a autoestima (FREITAS, 2015, p. 33). Nesse sentido, conforme verificado pela recente Nova Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo, na Lei Complementar nº 207 (CAMPINAS, 2018);

há sistemas de espaços livres articulados a partir do sistema hídrico e áreas verdes, sendo essas a praça a sul das escolas e praça da lagoa, passíveis de configurar espaços livres em continuidade, até a área central.

 

Considerações finais

Após a construção de fundamentação teórica e do cotejamento de projetos análogos, a análise do recorte de interesse imediato no bairro Parque Jambeiro, compreendido em sua inserção regional, foi possível entender com mais clareza como a rua e o conjunto de espaços públicos é de fundamental influência na rotina dos cidadãos. Estes espaços – suportes da vida pública e comunitária – são elementos condicionantes para tornar a experiência diária um fator exponencial positivo e educativo para o exercício pleno de cidadania.

Territórios periféricos são em geral desprivilegiados de políticas públicas (MARICATO, 2013). Embora o escopo desse trabalho não abarque diretamente este âmbito, entende-se que os princípios da cidade educadora podem fomentar políticas públicas inclusivas, no sentido de prestigiar instâncias socioespaciais pré-existentes em direção à valorização de identidade, cuja estrutura do território de estudo é facilitadora, por apresentar condições vantajosas pela presença de diversos espaços livres que, se organizados, equipados, submetidos a manutenção e limpeza, supridos com iluminação, mobiliário urbano e arborização - como sugerido pela Teoria das Janelas Quebradas -, se tornariam espaços pertinentes para reforçar a integração da comunidade, como locais adequados para a troca cultural, de experiências e conhecimentos. Seguindo a mesma lógica exposta pela teoria e pelo incremento da oferta de equipamentos institucionais, seriam espaços de excelência para convivência em comunidade.

A análise da área de estudo, a partir da relação urbana, do uso do solo, dos gabaritos e dos sistemas de espaços livres, possibilitou entender a relação estreita entre entorno, qualidade espacial e pedagogia da rua, o que seria extensível até o centro da cidade, como sistema contínuo de espaços livres públicos de diversas morfologias e escalas.

A Teoria das Janelas Quebradas foi importante para o entendimento do potencial do edifício histórico e sua envoltória, atualmente em situação precária, que tende a repelir seu uso pela carência de manutenção e conservação. Ressalta-se a existência deste patrimônio em fomentar a dinâmica social, a partir de sua requalificação, com programa de usos que digam respeito às necessidades da comunidade, em processos participativos de decisão, podendo tornar-se local de referência para encontros e dinâmicas sociais.

A partir dos levantamentos do bairro realizados, juntamente ao estudo da Lei de Parcelamento Uso e Ocupação do Solo, pressupõe-se a possibilidade de articular o patrimônio existente e a sua antiga característica rural à área rural a leste, a qual poderia se preconizar como apta à agricultura orgânica familiar exemplar, com feiras no próprio Casarão do Jambeiro. O edifício, após sua restauração, poderia ser utilizado como uma sede cultural em memória às origens do bairro, expondo e convidando seus moradores a conhecerem a história local, como oportunidade de identificação com o território, buscando assim que esses tenham mais interesse pela preservação e manutenção do patrimônio e fortalecendo seus laços de e pertencimento.

Evidencia-se pelos projetos educativos sistematizados, como a experiência do SPAWNERS (SPAWNERS, 2018) que nos indica formas de atuação inclusivas e de grande repercussão em diversos níveis do ponto de vista espacial, urbano e ambiental, abrangendo uma gama diversa de colaboradores e participantes de várias idades, origens, etnias e gêneros.

Como conclusão fundamental, confirma-se que os espaços públicos são elementos fundamentais para o ideal de formar cidadãos com ciência de seus direitos e obrigações que, identificados com a cidade, possam realizar ações participativas e transformadoras, erigindo uma cidadania ativa. Para isso os governos locais, além de propostas e recursos educativos, têm como compromisso que todos os cidadãos tenham acesso à oferta educativa que os incite à apropriação da cidade, à identificação com o passado com o intuito de melhorar o presente e projetar o futuro, como processo inclusivo a todos.

A pedagogia urbana aponta para instâncias de ensino-aprendizagem além das formais, reconhece múltiplos espaços educadores e não nega o significado da instituição escolar, visto que a educação é um processo complexo e se centraliza em inúmeros sujeitos históricos, além dos espaços.

Espera-se que este estudo possa construir subsídios para programas e ações governamentais e fortalecimento comunitário no sentido de usufruto dos espaços como bens públicos, abrangendo seu cuidado, apropriação e a interação social abrangente.

 

Referências Bibliográficas

ABNT. Norma Brasileira nº 9050, de 3 de agosto de 2020. Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. [S. l.], p. 1, 3 ago. 2020. Disponível em: http://www.portaldeacessibilidade.rs.gov.br/uploads/1596842151Emenda_1_ABNT_NBR_9050_em_03_de_agosto_de_2020.pdf. Acesso em: 14 fev. 2019.

AICE - Carta das Cidades Educadoras. Declaração de Barcelona (1990), revisões Bologna (1994) e Genova (2004). Disponível em: <http://www.edcities.org/wp-content/uploads/2013/10/Carta-Portugues.pdf>. Acesso em: 06 mar. 2017.

AUGUSTO, Marcelo Gaudio. Considerações sobre um patrimônio abandonado: Jambeiro, uma fazenda do século XIX na cidade do século XXI. Revista Confluências Culturais, Joinville, v. 1, n. 1, p. 46-59, sep. 2012. ISSN 2316-395X. Disponível em: <http://periodicos.univille.br/index.php/RCCult/article/view/66>. Acesso em: 16 fev. 2020. doi: http://dx.doi.org/10.21726/rccult.v1i1.66.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. [S. l.: s. n.], 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 5 maio 2020.

BRASIL. Lei nº 13.089, de 12 de janeiro de 2015. Institui o Estatuto da Metrópole, altera a Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, e dá outras providências. [S. l.], 12 jan. 2015.

BRASIL. Lei nº 13.683, de 19 de junho de 2018. Altera as Leis n º 13.089, de 12 de janeiro de 2015 (Estatuto da Metrópole), e 12.587, de 3 de janeiro de 2012, que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana. [S. l.], 19 jun. 2018.

BRADSHAW, Chris. Creating — And Using — A Rating System For Neighborhood Walkability Towards An Agenda For “Local Heroes”. 14th International Pedestrian Conference, Boulder, Colorado, v. 1, n. 14, ed. 1, p. 1-10, 1 out. 1993. Disponível em: <https://www.cooperative-individualism.org/bradshaw-chris_creating-and-using-a-rating-system-for-neighborhood-walkability-1993.htm>. Acesso em: 12 fev. 2019.

CABEZUDO, Alicia. A cidade que educa. Folha de S. Paulo, Online, p. 1-1, 25 maio 2004. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u829.shtml. Acesso em: 17 fev. 2019.

CAMPINAS. Lei Complementar Nº 207, de 20 de dezembro de 2018. Dispõe sobre a demarcação e ampliação do perímetro urbano, institui a Zona de Expansão Urbana e dá outras providências. [S. l.], 20 dez. 2018.

EPVT. MORADORES do Parque Jambeiro, em Campinas, denunciam abandono da lagoa do bairro. Gravação de EPTV Campinas. Http://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/jornal-da-eptv/videos/v/moradores-do-parque-jambeiro-em-campinas-denunciam-abandono-da-lagoa-do-bairro/5764337/: EPTV Campinas, 2017. Disponível em: http://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/jornal-da-eptv/videos/v/moradores-do-parque-jambeiro-em-campinas-denunciam-abandono-da-lagoa-do-bairro/5764337/. Acesso em: 13 abr. 2020.

FREITAS, Tassiane Mélo de. A educação para o Patrimônio Cultural como estratégia de desenvolvimento local. Revista de História e Geografia Ágora, Santa Cruz do Sul, v. 17, n. 02, p. 32-41, jul/dez 2015. DOI 0.17058/agora.v17i2.6682. Disponível em: http://online.unisc.br/seer/index.php/agora/index. Acesso em: 24 abr. 2019.

GADOTTI, Moacir; PADILHA Paulo Roberto; CABEZUDO, Alicia. (Org.) Cidade educadora: princípios e experiências. São Paulo: Cortez/Instituto Paulo Freire; Buenos Aires: Ciudades Educadoras América Latina, 2004.

GATTI, Simone. Espaços Públicos: Diagnóstico e metodologia de projeto. In: GATTI, Simone. Espaços Públicos: Diagnóstico e metodologia de projeto. 1. ed. São Paulo: Coordenação do Programa Soluções para Cidades, 2013. cap. 01, p. 01-93. ISBN 978-85-87024-66-4. Disponível em: <http://solucoesparacidades.com.br/espacos-publicos/espacos-publicos-diagnostico-e-metodologia-de-projeto/#:~:text=A%20qualidade%20de%20vida%20de,praia%20ou%20mesmo%20na%20rua>. Acesso em: 4 fev. 2020.

GEHL, Jan. Cidades para Pessoas. São Paulo: Perspectiva, 2013.

GOVERNO DE SÃO PAULO (SP). EMPLASA. Região Metropolitana de Campinas. São Paulo, 2019. Disponível em: https://emplasa.sp.gov.br/RMC. Acesso em: 2 jun. 2020.

HUET, Bernard. Espaços Públicos, Espaços Residuais. Sem data.

IBGE. Regiões Metropolitanas, Aglomerações Urbanas e Regiões Integradas de Desenvolvimento. In: Regiões Metropolitanas, Aglomerações Urbanas e Regiões Integradas de Desenvolvimento. [S. l.], 2019. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/geociencias/organizacao-do-territorio/divisao-regional/18354-regioes-metropolitanas-aglomeracoes-urbanas-e-regioes-integradas-de-desenvolvimento.html?=&t=o-que-e. Acesso em: 15 abr. 2020.

JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades. Coleção a. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2000.

LUZ, Vera; SILVA, Wesley Alves. Fitorremediação para precariedade urbana: estudo de caso como piloto replicável. In: MARTINS, A. N.; SAAVEDRA, J.; SULAIMAN, S.; BURGOS, M.; CARVALHO, M. A.; LEONÍDIO, O. (Orgs.). Atas do 1º Seminário Latino-Americano em Risco Resiliência, Arquitetura Humanitária e Incremental Housing em Favelas: o papel das universidades, dos(as) profissionais de arquitetura, da área social e das Marias & Marielles. Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa& Building 4Humanitu, Lisboa, 2020, p. 86. ISBN: 978-989-54741-2-7.

MARICATO, Ermínia. As ideias fora do lugar e o lugar fora das ideias. In: ARANTES, Otília; Vainer, Carlos; MARICATO, Ermínia. A cidade do pensamento único: desmanchando consensos. Petrópolis: Vozes, 2013.

MARQUES, Taícia Helena Negrin. Eixos Multifuncionais: Infraestrutura Verde e Serviços Ecossistêmicos urbanos aplicados ao córrego Mandaqui, São Paulo, SP. Orientador: Maria de Assunção Ribeiro Franco. (Tese de Doutorado), Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020.

MERLIN, José Roberto; QUEIROGA, Eugenio Fernandes. Sobre espaços públicos potencialmente educadores. 2011. Disponível em: <http://quapa.fau.usp.br/wordpress/wp-content/uploads/2016/03/Sobre-espa%C3%A7os-p%C3%BAblicos-potencialmente-educadores.pdf>. Acesso em: 07 mar. 2018.

QUEIROGA, Eugênio Fernandes. Sistemas de espaços livres e esfera pública em metrópoles brasileiras. Resgate, v. XIX (21), p. 25-35, 2011.

QUIEROGA, E.; MACEDO, S.; CAMPOS, A.C.; GONÇALVES, F.; GALENDER, F.; DEGREAS, H.; AKEMINE, R.; CUSTÓDIO, V. Notas gerais sobre os sistemas de espaços livres da cidade brasileira. In: CAMPOS, A.C.A.; QUEIROGA, E.F.; GALENDER, F.; DEGREAS, H.N.; AKEMINE,R.; MACEDO, S.S.; CUSTÓDIO, V. (Orgs.) Sistemas de espaços livres: conceitos, conflitos e paisagens. São Paulo: FAUSP, 2011, p. 11-20.

SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. 4° ed. São Paulo: EDUSP, 2006.

_____________. Técnica, espaço, tempo: globalização e meio técnico-científico informacional. São Paulo: HUCITEC, 1994.

SEPLURB. Lei Complementar Nº 208, de 20 de dezembro de 2018. Dispõe sobre parcelamento, ocupação e uso do solo no município de Campinas. [S. l.], 2018. Disponível em: https://leismunicipais.com.br/a/sp/c/campinas/lei-complementar/2018/21/208/lei-complementar-n-208-2018-dispoe-sobre-parcelamento-ocupacao-e-uso-do-solo-no-municipio-de-campinas. Acesso em: 27 abr. 2020.

SILVA, Juliana Damas C.; MERLIN, José Roberto. A Rua e os Espaços Livres como Potenciais Educadores: Um estudo da Avenida Francisco Glicério, Campinas SP.. ENEPEA: Rupturas ou Continuidades?, Rio de Janeiro, ed. XV, 2020. ISBN 978-65-00-13207-6. Disponível em: <http:// https://enepea2020.wixsite.com/emcasa>. Acesso em: 27 jan. 2020.

SPAWNERS. San Pablo Watershed Neighbors Education and Restoration Society. Califórnia, EUA, 2018. Disponível em: http://www.spawners.org/. Acesso em: 3 abr. 2020.

TEEB. The Economics of Ecosystems and Biodiversity in National and International Policy Making. Patrick ten Brink, ed, 2011. Disponível em: <http://www.teebweb.org/publication/teeb-in-national-and-international-policy-making/>. Acesso em: 10 set. 2017.

TUAN, Yi-fu. Espaço e Lugar: a perspectiva da experiencia. São Paulo, SP: Difel: EDUEL, 2013.

WILSON, James Q.; KELLING, George L. Broken Windows. Disponível em: <http://www.lakeclaire.org/docs/BrokenWindows-AtlantaicMonthly-March82.pdf>. Acesso em: 06 mar. 2019.

 

 

 

Data de Recebimento: 25/03/2021
Data de Aprovação: 30/09/2021


1  Um estudo anterior, realizado mediante Iniciação Científica, durante o período de 2018-2019, teve como objeto de estudo a avenida Francisco Glicério na cidade de Campinas, SP, com metodologia semelhante e referências teóricas específicas, orientado pelo Prof. Dr. José Roberto Merlin.

2  A Praça dos Esportes foi construída em 2003, projeto do arquiteto Maxim Bucaretchi e equipe (Bernardo Telles, Fábio Araújo e Luís Amaral).

3  O ordenamento territorial urbano de Campinas é regido pela Lei Complementar no. 208, de 20 de dezembro de 2018 que dispõe sobre o parcelamento, ocupação e uso do solo no município de Campinas. Disponível em: <https://leismunicipais.com.br/a/sp/c/campinas/lei-complementar/2018/21/208/lei-complementar-n-208-2018-dispoe-sobre-parcelamento-ocupacao-e-uso-do-solo-no-municipio-de-campinas>. Acesso em: 3 jul. 2020.