Do garrafeiro ao catador de materiais recicláveis: o (re) surgimento de um sujeito do projeto urbano


resumo resumo

Rubiamara Pasinatto



também é feita por cães e gatos que habitam a rua. Surge daí uma pista para enunciação do animal mexendo no lixo, que aponta para o ser que como um animal remexe o lixo em frente às casas daqueles que o produzem colocando em desordem. Esta descrição que trouxemos é apenas um já-dito que constitui o interdiscurso. Contudo, existem certamente, outros dizeres que podem ser evocados por meio da memória discursiva que têm relação com o fragmento.

O segundo enunciado que tomamos para análise é hoje [...] semos tratados como trabalhadores. Emerge aí a posição-sujeito que vamos chamar de trabalhador. aqui uma resignificação no sentido da palavra lixo, que no enunciado anterior remetia ao animal e ao excluído e desempregado, na constituição da posição-sujeito trabalhador (PST), passa a ser o objeto de trabalho do catador. Neste enunciado o lixo não é mais visto como sinônimo de restos, coisas sem valor, mas ao contrário, passa a representar coisas aproveitáveis e que dão o sustento e garantem a possibilidade ao catador de se constituir como trabalhador.

Destacamos que não foi somente a maneira como a sociedade vê estes sujeitos que mudou, mas também perante à legislação trabalhista, que passou a elencar entre as profissões a de catador de materiais recicláveis. Segundo Pinhel (2013) a partir da capacidade de articulação, os catadores participaram do debate da Política Nacional de Resíduos Sólidos, que os aponta como parceiros preferenciais na gestão dos resíduos, conquistando o reconhecimento como categoria profissional na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO). “A classificação foi disponibilizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego em 2002. O catador de material reciclável possui o número 5192-05 como código.” (PINHEL, 2013, p. 27).

Também verificamos neste segundo enunciado a marcação da cronologia com a palavra hoje, a partir da qual percebemos uma tentativa do próprio catador de salientar  pela língua o fato de não ser mais visto como um animal que busca materiais no lixo ou nos lixões, mas que hoje passa a ser tratado como um trabalhador, que inclusive tem compromissos com a gestão dos resíduos sólidos.

Tomamos agora o enunciado melhor projeto que aconteceu [...] que não abandone. O presente fragmento discursivo constitui a posição-sujeito que daremos o nome de subautônomo (PSS). Há aqui uma demonstração de fragilidade deste sujeito, que apesar de já ser considerado como trabalhador pela CBO, e relatar que hoje é tratado como trabalhador, ainda teme pelo abandono da empresa financiadora. Fala neste momento o interdiscurso relativo ao catador, que passou de condição de animal