No leva-e-traz da política científica: Uma interrogação sobre as “relações sociais”


resumo resumo

Eni Puccinelli Orlandi



(2009) fora dos padrões, sejam retóricos, sejam de gênero. Consideramos fundamentalmente seu funcionamento discursivo ligado ao interdiscurso e aos efeitos dos processos de individuação do sujeito-que-conta.

O discurso do corpo – olhares, risos – e outras formas de significar se juntam para emendar sentidos apesar de e ao lado. Sentidos que fogem: nada é transparente nos olhos que desviam, no silêncio que na fita, o corpo quieto, mãos que ocultam a boca, ocultam a testa, passam sobre os olhos e se ajeitam silenciosamente. Muitas vezes, um riso alto. As palavras nesse meio significam em muitas direções. Falam por conta própria. Desbaratam.

Sonho? Não, tava na roça trabaiando. Não sonha. Mas quando se pergunta o que mais queria: criar os filhos, dar escola pros filhos, ela estudar (chega a ser dito, às vezes), ter a casa própria. Não, ela diz, não sonha. Quando fala do filho: o que ela queria era ver o filho ir pra escola, depois trabalhar. É em nosso imaginário social sobre a pobreza que a isso chamaríamos “sonho”. Para ela é real.

O que é o sentido de sonho para quem inventa a vida? Para quem cria o dia seguinte no improviso de uma comida que vinha numa lata que parecia lavagem..., deusmelivre. E que ela comia porque tinha de amamentar o filho.

O que é o laço social? Um dava comida, outro ajudava. Os vizinhos ajudavam, a família não. E não estou falando da voz de uma, mas de todas. Há pouca diferença. Aparentemente. Nada é transparente. As palavras significam em muitas direções. Sentidos em fuga, a todo momento, e para todo lado. Acantoados. Esperançosos. Desesperados. Olhares. Risos. Olhos que olham pra longe. Olhos que se desviam. O corpo, em geral, imóvel. Quieto. Mãos que ocultam a boca. Ocultam a testa. Passam sobre os olhos e se ajeitam silenciosamente.

Que laços são esses que mantêm estas pessoas? Elas são todas vencedoras. Mas não demonstram saber. Dona W não aceitava que dissessem que seu filho, um dos 9, que nasceu com um problema no cérebro, não pudesse ir à escola. Se os outros iam, por que este não era pra ir? Diziam que não ia adiantar, que ele não ia aprender. Mas ela botou ele na escola. E dizia pras pessoas: se ele se formar e um dia tiver um emprego, eu posso morrer. E ele estudou porque ela não desistiu dele. Não é que ele arranjou mesmo um emprego aí em Viracopos, no aeroporto? E sabe que quando ele arranjou o emprego, eu quase morri. Sério. E meus filhos me diziam: não morre não mãe. Agora que ele arranjou o emprego a senhora não pode morrer. Até que foi indo e eu melhorei...