Revista Rua


www.cienciaemcurso.unisul.br
(www.cienciaemcurso.unisul.br)

Solange Leda Gallo

interlocutores. Em relação ao discurso da ciência, não é qualquer interlocutor que aí se inscreve, justamente pelo modo particular de funcionamento desse discurso. E nessa perspectiva, então, o trabalho de um divulgador não é um trabalho de tradução. Na verdade, o que nós temos que fazer é uma transposição, ou seja, “a divulgação científica é uma versão da ciência”, nos termos de Orlandi (2004: 84), um movimento de interpretação de um discurso que funciona de um modo, para um outro discurso que funciona de um outro modo, completamente diferente. O conhecimento prévio necessário para que se possa interpretar o discurso da ciência é diferente do conhecimento prévio necessário para que se interprete um texto de divulgação. A mídia em geral, e o jornalismo em particular, utiliza textos produzidos por ela mesma sobre ciência, como memória do seu dizer atual, e assim tem superado o problema da memória da ciência, apresentando a ciência como notícia, de um modo em que não é necessário para o interlocutor conhecer o discurso da ciência para saber sobre um “fato científico” (todo mundo se lembra das inúmeras vezes que a mesma imagem da ovelha Dolly apareceu nos nossos televisores). Nesse sentido, a ciência torna-se um produto: acontecimentos de mídia que se sucedem e mantêm entre si uma relação encadeada. Isso é o que normalmente podemos ter, por exemplo, a partir do aparecimento de um ciclone, do qual toda a mídia vai falar e, por essa razão, pode se tornar pauta para se publicar uma entrevista com um pesquisador que aparece, não para falar do processo da sua pesquisa, mas para alimentar aquela pauta, que não é científica, absolutamente. Geralmente é nesse lugar que a ciência se articula ao jornalismo. A ciência é transformada em notícia e perde sua historicidade, ou seja, o jornalismo, ao produzir o fato científico, mostra o resultado da pesquisa, apenas, e não o processo de sua construção.
Por outro lado, muitas vezes o próprio discurso científico produz a ciência como produto, também; um conhecimento acabado, conseqüentemente compreendido como um discurso verdadeiro, absoluto, neutro, objetivo, inequívoco.
Nosso objetivo na Revista Laboratório Ciência em Curso é o de refletir sobre a posição do sujeito que faz a divulgação, que somos nós, e que neste caso não estamos inscritos no discurso jornalístico, mas sim no discurso acadêmico científico. Muitas são as diferenças entre as determinações de cada um desses dois discursos. Por exemplo, nós não temos a mesma pressão relativa ao tempo, relativa à forma, que tem um meio de comunicação como um jornal, uma televisão. Nosso foco recai muito mais no processo de desenvolvimento de uma pesquisa. Isso é que nos interessa. A divulgação desse