Revista Rua


Uma enunciação sem comunicação: As tatuagens escriturais
An utterance without communication: the scriptural tattoos

Marie-Anne Paveau

elementos materiais exercem um papel importante: corpos biológicos tatuados mostrando outras marcas corporais eventuais, vestimentas, ambiente geográfico etc. É nisto que o enunciado tatuado mobiliza um ambiente cognitivo: os dados contextuais resultam da cognição dos agentes que fazem apelo ao conjunto dos dados materiais e imateriais pertinentes para a leitura do enunciado.
2.2.3 EMISSÕES EM SEGUNDA PESSOA
Último dispositivo em funcionamento no corpus: os enunciados em segunda pessoa, que apresentam, portanto, uma direção explícita e que parece implicar naturalmente uma interpretação comunicacional. Mais ainda, o dispositivo enunciativo é ampliado porque o “receptor” não existe no quadro de uma situação comunicacional inexistente, mas permanece virtual. Podemos dizer que ele é dado no ambiente, materializado assim que o olhar, no sentido de instância socialmente construída, qualquer que seja, o capte. Não estamos em uma situação de interação, na medida em que uma relação verbal com o outro não está estabelecida. Só permanece a produção de uma emissão da parte do tatuado (eu não encontrei nenhuma tatuagem não admitida em segunda pessoa, o que é notável), emitida não endereçada, se podemos dizer: leia o que passará, compreenda o que poderá, receba o que terá.
As emissões pertencem a categorias muito bem definidas.
Algumas tatuagens em segunda pessoa são claramente apelos ao olhar do outro que estabelecem uma relação visual entre o tatuado e o olhar que o captura:
 
- Vous qui me regardez, j’ai été une victime de l’armée (bas du dos, Delarue, Giraud 1950: 41) [Você que me olha, eu fui vítima do exército (abaixo das costas, DELARUE, GIRAUD, 1950: 41)]
- Oh! M...! encore un... qui me regarde [bras gauche]; As-tu louis à mettre dans le commerce, oui ou non? [avant-bras gauche] (Delarue, Giraud 1950: 46) [Oh! M...!