Apresentação

Abrimos o ano de 2019 com muitas e variadas publicações que nos animam, em termos de política científica, a insistir na abertura de espaços como este que a Revista Rua proporciona. Neste volume 25, as análises são de múltiplas áreas com lugares teóricos distintos e recortes analíticos bem diversos. Começamos olhando para a rua, para seus sujeitos, no artigo (Re)existência nas ruas: entre punição e caridade de Lauro José Siqueira Baldini e Ana Elisa Volpato Ortolano, em que pudemos compreender as disputas de sentidos que envolvem a presença/permanência da população de rua na cidade de Campinas em que a loucura e a pobreza se articulam e se atravessam na produção histórica de mecanismos institucionais de controle dos corpos-sentidos na/da cidade. Continuamos com O controle da paisagem urbana – “rolêzinho”: jovens que incomodam de Rafael Lopes de Sousa, Álvaro Cardoso Gomes e Luiz Antonio Dias, no qual o “rolêzinho” e sua trilha sonora – o “funk ostentação” – é tomado por um carácter simbólico ou estratégico como alternativa de cultura e lazer para os jovens periféricos, observando-se o fascínio paradoxal que o funk desperta na classe média. Em Caminhar e desvelar paisagens de Arthur Simões Caetano Cabral e Vladimir Bartalini, no batimento entre reflexões teóricas e a presença poética de Guimarães Rosa, somos levados à compreensão da paisagem enquanto presença que se revela pelo caminhar. E que não se revela cabalmente ou por completo e sempre em uma relação entre a paisagem, o caminhar e a revelação poética. Dentro ainda da materialidade da literatura, Ana Paula Franco Nobile Brandileone e Caroline Helena dos Santos, em A representação da realidade periférica em Letras de Liberdade: “Lembranças ao Vento”, de Márcio Marcelo do Nascimento Sena, trazem o caráter realista de boa parte da narrativa brasileira não apenas como da ordem da representação estética, mas também da intervenção ética e política no mundo real, principalmente quando se trata da realidade periférica, analisando o conto Lembranças ao Vento de Sena. Mantendo-nos ainda no espaço literário, vamos a José Roberto Araújo de Godoy que nos mostra, em seu A construção de espaços provisórios na literatura latino-americana, como determinados territórios e suas peculiaridades espaciais se refletem em narrativas ficcionais, sobretudo o caráter provisório dessas espacialidades, recortando em suas análises gestos dos escritores César Aira e Milton Hatoum. Também na discursividade literária, João Batista Costa Gonçalves e Marcos Roberto dos Santos Amaral trabalham, em A escrita subversiva de “n. d. a.”: um corpo desgarrado e grotesco questões da ordem da autoria e do grotesco indicando um descentramento de práticas de produção discursiva em que a deriva e a instabilidade referencial se instalam. De luz em luz, a poesia é desenhada, de Lucília Maria Abrahão e Sousa, Elaine Pereira Daróz e Dantielli Assumpção Garcia, igualmente cuidando de analisar o funcionamento literário, agora da poesia, reflete sobre a poesia da rua que se inscreve em uma exposição do Museu da Língua Portuguesa e deriva na equivocidade e no inatingível, no impossível dela. Em Vestígios do silêncio, Iago Moura Melo dos Santos e Maurício Beck fazem, como dizem, um teatro textual teórico em que o ensaio é refletir sobre o silêncio em três atos, tomando o silêncio como a terceira margem do Rio Lethe (Ideologia), em relação à base material da língua (primeira margem), em que se dão os processos discursivos (segunda margem). Meire Oliveira Silva, em seu Desenvolvimentismo, plano-piloto e segregação: uma análise de Brasília, contradições de uma cidade nova, de Joaquim Pedro de Andrade, explora as contradições do gesto fílmico patrocinado que expõe as fissuras da desigualdade presentes na capital federal, cujo plano inicial buscava dissipar qualquer desnível social, alçando o Brasil aos patamares progressistas da década de 1960. Mas a cidade material irrompe na representação, abrindo fissuras incontroláveis interditando o filme de sua exibição. Em Três experimentos escolares e 2013: um primeiro contato, um erro e uma assessoria, de Frederico Canuto, são estabelecidas aproximações com o acontecimento junho de 2013 e um estudo de caso de assessoramento técnico urbanístico, envolvendo alunos de graduação e a população local, que têm como recorte a relação do território com as águas urbanas e a bacia hidrográfica. Já em Casa da Mãe Santana: A construção de um lugar por meio de um jogo colaborativo, de Adriana Sansão Fontes, Joy Till e Gabrielle Rocha, conhecemos uma ação interdisciplinar de extensão, voltada à ativação de um espaço público subutilizado por meio de um jogo colaborativo, no Campo de Santana, parque de importância histórica e cultural para a cidade que se encontra pouco apropriado pela população. Também observando artefatos refletidos, o artigo Som Tridimensional para Deficientes Visuais: Interação na Arte e no Videogame, de Adriane Cristine Kirst Andere de Mello, Milton Luiz Horn Vieira e Victor Nassar, procura, a partir da tridimensionalidade sonora e de seus princípios históricos nas vanguardas artísticas, bem como alguns de seus desdobramentos na arte contemporânea, fazer discussões teóricas que embasam a construção de um dispositivo sonoro que facilite na localização e locomoção de deficientes visuais. Ainda olhando para artefatos, Magaly Prado e Adrian Alexandri, em Um site como ferramenta de identificação de uma agenda pública em uma pequena cidade, apresentam o desafio em criar uma plataforma digital jornalística que engaje os moradores de modo a serem co-autores na construção de uma agenda pública de prioridades a serem debatidas e resolvidas. Olhando também para o jornalismo, temos Infância e violência: uma leitura dos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo de Angela Maria Farah, em que se analisa a cobertura dada à temática da infância abandonada e ao tratamento semântico dado a essa infância, na perspectiva de Cremilda Medina, historiadores da infância, entre outros estudiosos. Mirando agora o discurso jurídico, Sheilla Maria Resende, em seu “PL do agrotóxico”: discurso, memória, silêncio e resistência faz uma discussão sobre defesas e comentários a respeito do Projeto de Lei n. 6.299/2002, conhecido como o PL do agrotóxico, mostrando que o agronegócio fala “por si”, enquanto a agricultura familiar é “falada sobre”, havendo, contudo, resistência do pequeno agricultor no silêncio na/da relação homem-terra. Nessa relação homem-terra, vemos, em A Emergência das Heterogeneidades Enunciativas no Discurso Indigenista Oficial Brasileiro, de Sheila da Costa Mota Bispo e Vânia Maria Lescano Guerra, a problematização de emergências de heterogeneidade(s) enunciativa(s) no Documento Base da 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista. Também trabalhando com a relação homem-terra, mas na deriva, o artigo O indígena e a cidade: panorama das aldeias urbanas de Campo Grande/ MS de Aleida Fontoura Batistoti e Karina Trevisan Latosinski, aborda a presença indígena, majoritariamente da etnia Terena, na área urbana de Campo Grande/MS, suas condições de vida, as habitações e a presença do indígena no espaço urbano, salientando que a migração dos indígenas se dá principalmente pela busca de qualidade de vida e oportunidades, além da efetivação e criação de políticas públicas que os contemple, já que o cenário atual é de precariedade e exclusão físico-social, dissonante com a cultura desse povo. Ainda na resistência e na cidade, Marcas da resistência nos muros da Universidade: pichações e seus efeitos, de Érica Daniela de Araújo, analisa o funcionamento discursivo em duas pichações inscritas nos muros da Universidade Federal de Uberlândia, tomadas como escrituras da luta pelo pertencimento em uma sociedade de segregações e de exclusões, se marcam como formas de resistência ao já significado pelo discurso urbano. Este volume 25 conta ainda com a resenha de Maurício Silva do livro De baixo para cima, de Eliane Costa e Gabriela Agustini, as notícias do primeiro semestre de 2019 do Laboratório de Estudos Urbanos e a seção Artes com a série Lago, de Amanda M. P. Leite.

Boa leitura!





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