Revista Rua


A coevolução do "roubo de identidade" e dos sistemas de pagamento
The coevolution of "identity theft" and payment systems

Benoit Dupont

(Koops et al., 2009:11). Dito de outro modo, as conseqüências negativas do uso ilegal dos dados identificadores da vítima não a privam de sua identidade. Ademais elas perdem momentaneamente o prazer de algumas vantagens instrumentais como os pontos de crédito e a capacidade de emprestar dinheiro do banco. Seria, portanto mais justo fazer referência a um “empréstimo de identidade” (Jones e Levi, 2000: 1) ou a uma “manipulação da identidade”, o roubo só diz respeito aos documentos identificadores que podem ser facilmente substituídos, das informações pessoais que permitem o acesso a diversos serviços, e em alguns casos, de ter fiadores confiáveis nas instituições bancárias.
Por outro lado, a declinação da palavra “identidade” no singular conduz ao entendimento do que constitui um conjunto homogêneo e coerente de características que permitem estabelecer a individualidade. Ou, a identidade de uma pessoa se compõe mais de um agregar díspar de elementos identificadores atribuídos (o status matrimonial) ou mesmo escolhido (um identificador e uma senha para acessar uma conta online) (Jones e Levi, 2000: 3; Koops et al., 2009: 4) que dispõem de um potencial muito variável de exploração pelos fraudadores. Se desejarmos conservar o termo “roubo”, este deve se referir aos elementos identificadores em toda sua diversidade ao invés de uma identidade singular.
Diante de tal imprecisão terminológica, seria preferível designar o encadeamento das fases de aquisição, de transformação e de exploração fraudulentas dos elementos identificadores como “crimes ligados à identidade”. Entretanto, a adoção generalizada pela impressa escrita e as mídias eletrônicas do termo “roubo de identidade” parece hoje irreversível.
 
b. Das estatísticas à confiabilidade frágil
 
O discurso midiático sobre o “roubo de identidade” é essencialmente alimentado pelas estatísticas do qual a confiabilidade merece ser atentivamente examinada. De fato, diante das poucas estatísticas oficiais disponíveis, a medida do fenômeno é principalmente assegurada pelos interesses privados. O desinteresse relativo das autoridades governamentais se explica em parte pela falta de uma penalidade criminal acompanhada geralmente (mas não sistematicamente) de formulários de recolhimento da estatística policial e judiciária (Pontell, Brown e Tosouni, 2008), mas também pela reticente emergência de uma forma de delinqüência muito crescente contra a qual poucos recursos repressivos podem efetivamente ser mobilizados. Por outro lado,