Não habitamos porque construímos. Ao contrário. Construímos e chegamos a construir à medida que habitamos, ou seja, à medida que somos como aqueles que habitam.
Mas em que consiste o vigor essencial do habitar?
Heidegger
1.
Um sintoma social urbano, que é o das formas de resistência à modificação do espaço ocupado por comunidades, é aqui objeto de reflexão.
No Morro da Providência,sem muito aviso prévio por parte da prefeitura, e durante a ausência dos moradores, que em sua maioria havia saído para trabalhar, algumas casas foram pichadas com a sigla “SMH” – Secretaria Municipal de Habitação −, para serem derrubadas em função de projeto de reurbanização proposto pela prefeitura para o corpo da cidade. Tomamos aqui a cidade como um corpo e as pichações da prefeitura como aquilo que será cortado do corpo da cidade desfazendo laços daquele espaço urbano. Contrapondo-se às pichações da prefeitura, reproduções muito ampliadas de fotos dos moradores – fotos dos rostos e de corpo inteiro – foram feitas por um fotógrafo, morador da favela e líder comunitário, como resposta às marcações, como forma de resistência à derrubada das casas.
Nesse trabalho propomos uma discussão sobre as formas de escrita do social no corpo da cidade, seja a da escrita institucional da prefeitura que, através de pichações, normatiza, restringe e ordena sem perguntar, proscrevendo os moradores de seu lugar de origem; seja a de outra forma de escrita, feita a partir de imagens de pessoas que, com sua corporalidade, inscrevem um discurso de outra ordem, portando as marcas dos que resistem fora da normatividade urbana.
Falamos do lugar teórico da Análise do Discurso, o que significa dizer que tais sites e blogs foram lidos como discurso urbano, ou seja, materializam com palavras e imagens um sintoma social contemporâneo que é o das formas de ocupação do espaço nas cidades e as disputas aí envolvidas entre o poder público e moradores de áreas urbanas a serem modificadas em função de algum tipo de projeto do estado (governo e prefeitura).
Focalizamos, então, dois gestos de interpretação que, inscritos em moradias populares materializam dois diferentes processos de significação: a inscrição de uma