Revista Rua


Guerra Fria, Sangue Frio: As Conexões entre o Cinema de Terror e a Paz Armada
Cold War, Cold Blood: The Connections between Horror Movies and the Armed Peace

Marcelo Eduardo Marchi

produção de terror a ser indicada ao Oscar de melhor filme, bem como o filme de censura 18 anos de maior bilheteria de todos os tempos.
A audiência de O Exorcista era recém-egressa de uma época, na história recente, sem precedentes em termos de transformações sociais, bem como tecnológicas e científicas (apenas para citar algumas, a chegada do homem à Lua (a conquista e o domínio do espaço sideral) e o advento da pílula anticoncepcional (a conquista e o domínio do corpo humano), avanços que soam desproporcionais em seu alcance, mas que, ao contrário disso, mostraram-se complementares, o macro e o micro expandindo horizontes e limites, sejam eles geográficos, filosóficos ou comportamentais. O eco das mudanças deflagradas nos anos 1960 atravessaria toda a década de 1970, transformando a si mesmo e ao mundo, e 1973 era ainda cedo demais para compreender muito do que havia ocorrido menos de dez anos antes.
Foi assim com o movimento hippie, em franca decadência, e que vinha sendo rapidamente substituído por outras manifestações comportamentais jovens, como o glam,o qual reverberava os excessos da “década do ‘eu’” em uma freqüência mais afinada. No entanto, as “crianças das flores” haviam há pouco retornado às convenções do mundo suburbano, e tinham muito que explicar aos pais, professores e futuros patrões.
Voltamos à citação de King reproduzida anteriormente, em que ele aponta para a “sensação de documentário estranhamente convincente” despertada por filmes de terror dos anos 1950 e 1970 O Exorcista em especial – devido à constante atmosfera de medo sociopolítico vigente nesses períodos. Em ambas as épocas, um clima de guerra – iminente ou concreta – coincidiu (e, levando em conta o impacto social de conflitos do porte das guerras da Coréia e do Vietnã – as duas, embaladas no pacote constantemente prestes a explodir em um cogumelo atômico chamado Guerra Fria –, o termo “coincidência” não passa de um dispensável eufemismo) com um levante juvenil (mais inconsciente na década de 1950, e mais organizado nas duas seguintes) cuja importância não pode ser negada. King (2003: 41) associa alguns filmes de terror dos anos 1950, principalmente I Was a Teenage Werewolf e I Was a Teenage Frankenstein, ao medo que a sociedade de então nutria pelos “delinqüentes juvenis”, representados por James Dean e pelos astros da primeira geração do rock. O Exorcista atualizou esse medo para os anos 1960/1970, com seus hippies, roqueiros