“No carnaval a fantasia é minha. O corpo é meu”: memória e rupturas feministas na folia
Dantielli Assumpção Garcia Lucília Maria Abrahão e Sousa
“No carnaval, pode tudo” é uma frase que deveria dar arrepios em qualquer um. A festa, por vezes, mascara a violência sexual que muitas mulheres sofrem durante a celebração do feriado.
Puxões, encoxadas, beijos forçados, mão boba, um tapinha que “não dói”… Quem nunca ouviu falar dessas histórias? E ela é sempre contada do ponto de vista do homem “galanteador”, seja em filmes, anúncios publicitários ou mesmo na boca de um amigo. A graça da conquista é a protagonista, merecedora de aplausos, risadas,high fives. O consentimento, por outro lado, não tem espaço neste roteiro.
(11)Se você cortar a cena e jogar luz para quem foi esquecida como figurante, vai enxergar coisas que talvez não gostaria: medo, aborrecimento, vergonha e traumas.
Por meio de narrativas de experiências, enviadas ao “Chega de Fiu Fiu” – campanha contra o assédio em lugares públicos –, são trazidos exemplos de violência sofrida pelas mulheres:
(12) “Ao ignorar um grupo de homens que me cantavam, levei um tapa na bunda. Eles riram. Eu chorei de dor e humilhação.”
(13) “um homem de moto diminuiu a velocidade ao passar por mim e enfiou a mão no meio das minhas pernas”
(14) “de repente, um cara se aproximou de mim com o pau pra fora.”
(15) “um motoqueiro gritou ‘sobe aqui e eu te mostro como se trepa.’”
Esse texto, posto em circulação na VIP, sustenta que o assédio é algo “grave e não tem limites”. Essa naturalização é legitimada pela sociedade, pelas propagandas, pelos formadores de opinião, porém, ao atualizar essa memória, a VIP tenta romper essa discursividade, mostrando que o homem que age assim é um “escroto”, que não respeita a mulher:
(16) O assédio é grave e não tem limites, nem mesmo de idade: algumas mulheres me confidenciam que sofreram pela primeira vez com o problema aos dez, nove e até oito anos. Infelizmente, tal comportamento é visto com normalidade por grande parte das pessoas. Também é legitimado por propagandas e formadores de opinião (!) equivocados, que confundem as relações românticas naturais humanas com a violência e agressividade do assédio sexual. No carnaval, caia na farra, mas não caia nessa. E respeite as mulheres.
O homem que lê a VIP pode cair na farra, pode divertir-se no carnaval, todavia, não pode violentar as mulheres. Mais uma vez o discurso da interdição produzindo efeitos. A ruptura nos posts está em elaborar discursos que não interditam a mulher, mas sim o homem. Nesses posts sobre o carnaval, não é a mulher que não pode fazer certas