Arquitetura das igrejas: gestos metafóricos e metonímicos que materializam desejos inconscientes


resumo resumo

Olimpia Maluf-Souza
Fernanda Surubi Fernandes



morto entre os vivos, quer seja na ressureição ou na reencarnação. Nessa perspectiva, a religião desempenha papel preponderante e a igreja, enquanto espaço de contato da vida terrena com a vida após a morte, é o objeto metonímico do desejo do homem de ser imortal, de lidar com o medo e com os mistérios da morte.

Netto (2014, p. 153) define o corpo das pulsões como “[...] o copo do querer, da falta (aberturas erógenas), do erotismo, do desassossego, mediado pela palavra e pela alteridade, especular e constante na busca do desejo”.

Daí as religiões sobrepujarem ou negarem a ideia de morte, substituindo a decomposição do corpo por uma vida eterna. Um efeito desse funcionamento pode ser visto no cristianismo, quando a noção de pecado acaba sendo instalada como mais forte que a ideia de morte, pois morrer em pecado significa padecer eternamente no fogo do inferno.

Se pensarmos na estrutura das pequenas cidades há sempre uma catedral, uma matriz que origina e que dá a direção, os modos de espacialização e de ocupação urbana pelos sujeitos. Não são triviais os sentidos dicionarizados de ambas as palavras, pois para catedral temos a cátedra episcopal e para matriz a fonte, a origem, a mãe, o útero, o ventre de onde emana a vida[1].

Nessa direção, tomo em análise a arquitetura das igrejas, tentando compreender em que medida estas edificações se instalam como espaço da espiritualidade humana, pois a unidade significante da igreja, marcada, por sua arquitetura, retira o sujeito da urbanidade para conferir-lhe outros e novos sentidos. Assim, por sua arquitetura, a igreja faz instalar a dicotomia entre o humano e o espiritual, entre o sagrado e o profano, entre o terrestre e o celeste, entre a vida e a morte. Não como uma oposição nela mesma, mas como uma totalidade, pois “[...] em todo ato humano [...] [coabita] trabalho e jogo, conhecimento e repouso, esforço e fruição, alegria e dor” (LEFEBVRE, 1999, p. 132).

Wertheim (2001) afirma que a arquitetura, juntamente com a literatura e a pintura, possibilitou ao humano a transcendência à sujeição telúrica a ele constitutivamente imposta. Nesse sentido, a arquitetura, principalmente a das igrejas renascentistas e barrocas, funcionou/funciona como realidades virtuais fazendo fundir dois mundos antitéticos – o da terra e o do céu, o da vida e o da morte.

 

Esse sentido ligado à produção da vida vem das fêmeas matriciais, que ordenam, pela qualidade das suas crias, todo o rebanho.



[1] Esse sentido ligado à produção da vida vem das fêmeas matriciais, que ordenam, pela qualidade das suas crias, todo o rebanho.