Análise do discurso da arqueologia preventiva na Folha de S. Paulo: A Casa Bandeirista do Itaim


resumo resumo

Glória Tega
Rodrigo Bastos Cunha



(...) o denominado Sítio Itaim, que contém a Casa do Itaim-Bibi, imóvel bandeirista é um sitio arqueológico tombado pelo CONDEPHAT e CONPRESP, órgãos estadual e municipal de patrimônio histórico.(...) o imóvel objeto desta ação configura monumento arqueológico , nos termos dos artigos 2º e 3º, ambos da Lei nº 3.924/61 (...)

 

Além do repórter se apoiar no documento oficial emitido por órgão federal para construir seu discurso, os discursos citados presentes no texto são de membros da construtora responsável pela obra e o jornalista opta por eles para dar voz ao outro lado da notícia, medida recomendada no manual da Folha.

Desse modo, o texto “Construtora afirma que projeto é legal”, box da matéria “Justiça barra obra ao lado de ruína histórica”, é construído exatamente por meio desses discursos. Assim, o lugar de onde a pessoa fala, seja uma incorporadora, seja um órgão oficial, está ligado a seus interesses. Naquele texto havia um não especialista sugerindo que a licença poderia ser exigida só para bairros como o centro histórico. Nesse texto, a incorporadora fala que o projeto é legal. Essa afirmação pode ser tanto reflexo de má fé quanto desconhecimento da legislação federal (ou, até mesmo, do que venha a ser patrimônio arqueológico).

Observe o conteúdo do texto do box na íntegra:

A construtora Brascan informou não ter tomado conhecimento oficialmente da decisão que suspendeu as obras. Seus representantes se disseram "surpresos", pois o empreendimento "está completamente legalizado".

"Essa liminar não existe, não tem sentido", disse o diretor superintendente da Brascan, Walter Lafemina. A empresa nega que os 19 mil metros quadrados do terreno sejam alvo de preservação, mas só os 2.000 metros quadrados do Itaim.

Segundo José de Albuquerque, diretor de incorporação da Brascan, a obra começou a ser feita com toda a documentação legal e é acompanhada, disse, por órgãos da prefeitura e de preservação.

A empresa nega que a parte já executada das obras tenha prejudicado o patrimônio arqueológico do entorno do sítio Itaim.

Albuquerque diz que o levantamento do patrimônio arqueológico da área foi pedido em uma reunião com o Iphan e a Procuradoria "há cerca de dez dias", mas que não era condição para que a construção prosseguisse.

"Estávamos pesquisando se um estudo semelhante feito nos anos 80 está disponível no Museu de Arqueologia [da USP]. E, se fosse necessário, iríamos contratar um novo estudo. Era isso que estava combinado." O Ministério Público Federal nega a existência de um acordo.

Albuquerque disse que, com a inclusão da praça, esse será "um projeto com fins culturais, que irá valorizar o sítio [Itaim]".

 

Várias vozes são percebidas no texto: a voz do próprio jornalista, a voz da construtora Brascan, representada por seus diretores Walter Lafemina e José de Albuquerque, e a voz do Ministério Público Federal. O enunciador, o jornalista, é responsável pela situação de enunciação, mas se exime de responsabilidade quando coloca os discursos diretos em seu texto ou quando usa a modalização do discurso do outro, com os modalizadores “segundo” (José de Albuquerque) e “disse que”.