Revista Rua


Cidade narrada, tempo vivido: estudos de etnografias da duração
City told, Time lived: Studies in Ethnography of the Duration

Ana Luiza Carvalho da Rocha, Cornelia Eckert

Esta sensibilidade para a captura da imagem da forma para o ato de compreensão de viver o contexto citadino, no remete aos comentários que nos faz Georg Simmel (1981: 235) em sua “sociologia dos sentidos”, sobre o princípio contraditorial que reúne o olhar e a escuta. Para o autor, o olhar, diferentemente do ouvir (egoísta em sua natureza), não pode se apropriar do sentido daquilo que por ele é visto se não for entregando-se a imagem – não se pode possuir o visível, pode-se, sim, compartilhá-lo (neste ponto o olhar é disponível ao encontro, a partilha de sentidos). Entretanto, mais do que pensá-los (olho e ouvido) como antagônicos, Georg Simmel nos permite pensar que os gestos que deles derivam – de ver e de ouvir –, são partes de um todo, permitindo-nos, neste ponto, aperfeiçoar a prática da etnografia da duração na confluência de ambos, seguindo-se, assim, o princípio interno e precário de (con)figuração da vida no social, na polaridade entre vida objetiva e vida subjetiva.
Com Simmel, podemos tratar a etnografia da duração sob o ponto de vista das figurações da forma do ser do social tecida nas narrativas biográficas e nos itinerários urbanos de nossos sujeitos de pesquisa. Figurações de formas contempladas no ato de narrar por meio do qual podemos pensar a imagem substancial do ser do social numa grande metrópole como o sedimento de uma multiplicidade de tempos passados, consolidados, no presente, numa duração. Isto é, a vida urbana transcorre diante dos olhos e ouvidos atentos do etnógrafo como a figuração de uma sucessão de atos de uma vida inteira.
Em seus comentários sobre os traços figurativos, e o órgão visual, para a construção da unidade estável da alma de unidade coletiva, este autor, entretanto, nos brinda com uma importante derivação do assunto para o que estamos refletindo aqui, sobre a dialética da duração e seus estreitos laços com os estudos do imaginário. Ao tratar, especificamente, das relações entre a visibilidade/visualidade da forma do ser social para o caso das categorias de entendimento da cultura, Georg Simmel (1981: 230) se confronta com o tema do cego e da cegueira. Nesse ínterim, a forma do ser não se dá a ver em sua dimensão figurativa. Uma complexidade que remete, segundo este autor, ao caráter enigmático de devaneio que toda forma contempla. O que lhe permite concluir, em sua sociologia dos sentidos, que o conhecimento do ser do social exige o desapego do cientista social da camada superficial do tecido por meio do qual todo o corpo social se apresenta. Numa metáfora, trata-se de