Revista Rua


Cidade narrada, tempo vivido: estudos de etnografias da duração
City told, Time lived: Studies in Ethnography of the Duration

Ana Luiza Carvalho da Rocha, Cornelia Eckert

ousaríamos então finalmente fazer uma verdade. Sem harmonia, sem dialética regulada, sem ritmo, nenhuma vida, nenhum pensamento pode ser estável e seguro: o repouso é uma vibração feliz. (Bachelard, 1988: 9).
 
 
Podemos agora argumentar que adotamos como chave interpretativa o ponto de vista da cidade como objeto temporal em suas modalidades narrativas. Ou seja, consideramos que a cidade e seus arranjos da vida social, no contexto das atuais modernas sociedades complexas, devem ser pensados desde a perspectiva das durações de instantes descontínuos que orientam a experiência humana de seus habitantes, os quais, além de serem atores e autores, também assumem o lugar de personagens da vida urbana. Mas trata-se de personagens com qualidade narrativa, ou seja, personagens-narradores da vida urbana.
Cada experiência etnográfica consiste para o antropólogo em seu ofício em observar, escutar e escrever sobre um vínculo que se estabelece entre o pesquisador e seu universo de pesquisa de forma que haja reconhecimento deste trabalho, consentimento informado e interlocução no processo, permitindo não apenas a leitura da cidade por parte do pesquisador, familiarizado com o contexto urbano, mas de um contrato de interlocução com os habitantes como um jogo de reciprocidades (solidária ou agonística) que se estabelece no tempo do convívio da pesquisa.
As pesquisas de campo implicam engajamento dos pesquisadores nas rotinas urbanas de pessoas, grupos e acontecimentos ora banais, ora extraordinários, ora públicos ou mais privados ao mundo doméstico. Situações diversas que implicam inserção dos pesquisadores nos processos de interação que configuram as formas da vida social, como nos ensina Georg Simmel no conjunto de sua obra. Trazemos por exemplos os exercícios etnográficos no projeto de pesquisa BIEV (1997-2009) no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (IFCH e ILEA, UFRGS), coordenado pelas autoras. São os dados desse projeto compartilhado, vários entre eles na forma de documentários fílmicos, que selecionamos para exemplificar neste artigo
O trabalho de mestrado de Lucas Graeff, por nós orientado, apresenta um capítulo em imagens a partir da edição de narrativas fotográficas e do som das entrevistas. Lucas desenvolveu um estudo antropológico sobre memória social e cotidiano de velhos no Asilo Padre Cacique, em Porto Alegre. Nessa pesquisa etnográfica realizadaentre agosto de 2004