Revista Rua


A ironia exacerbada vira nada. Nada? Incômodos com Narradores de Javé
The extreme irony becomes nothing. Nothing?Troubles with Narradores de Javé

Wenceslao Machado de Oliveira Jr

Um bufão que rivaliza com a escrita como marco de poder. Quem escreve é ele, um homem sem credibilidade alguma. Mas quem (o que) deve (se) escrever por meio dele é a ciência. A escrita prescrita como científica regularia a escrita desembestada e alegre de Antonio Biá. “Tudo deve ser científico”, diz um personagem. Para tanto, os fatos devem ser rememorados e confirmados pelas histórias contadas pelo povo. Um por um deve contar a sua versão para que os traços do passado sejam ali descobertos, intuídos pela inventividade e esperteza daquele que escuta e registra.
Um bufão que, enquanto os donos do poder em Javé buscam compor a história da fundação do lugar colocando o fundador Indalécio como seu parente distante, ironiza estes narradores e o próprio fundador do lugar, fazendo o povo – personagens e espectadores – rir. Riem eles, personagens, e rimos nós, espectadores, dos donos do poder não poderem garantir a sua verdade, não poderem instituir a sua realidade de glória por descender do fundador. No entanto, o bufão que nos faz rir não ri de si mesmo, nem da escrita que faz, tanto que não escreve o que acha banal. E o que considera importante não escreve em papel, mas nas paredes, matéria mais durável...
Um falador inveterado que impede os silêncios de se manifestarem entre as pessoas e nas pessoas. Não há esquecimentos naquelas pessoas, só há lembranças vívidas e comprovadas por objetos e marcas corporais. Provas científicas dos ditos de cada um, da glória de cada narrador. Não há silêncios, nem sobre o que já se foi e nem sobre o que ainda virá. No entanto, em meio ao falatório continuado, não há nada mais que aqueles traços registrados no livro que permanecerá vazio de palavras.
Um bufão que registra as versões em formas miméticas a elas mesmas: ouvir aquelas histórias é o mesmo que seguir uma formiga pela folha em branco... um traçado aleatório. Ou aquele conjunto de rabiscos, inarticulados como linguagem compreensível pelo raciocínio linguístico, tem potência provocativa de possibilidades poéticas se a mirada para a folha branca cheia de linhas e traçados for de um pintor ou gravurista? As formas dispersas no espaço do quadro-folha seriam grafias de sensações e percepções captadas na fala imaginativa e autoritária de cada um dos que conta a história que quer ter registrada? Mas esta possibilidade poética não se dá no filme, pois neste o registro do traçado aleatório da formiga sobre o papel é apenas a maneira de registrar o desdém de quem escreve por aqueles que não saber ler.
Um desdenhoso inteligente que aproveita aquela dependência dos seus desafetos ao seu domínio de conhecedor da grafia das letras para retornar à vida de amor que tinha com Ritinha e à cachaça que tomava com gosto. Para ele, aquela empreitada era