Revista Rua


Sentidos do/no corpo interpelado pelo câncer de mama
Senses of / in nobody challenged by breast cancer

Lívia Fabiana Saço e Eliana Lúcia Ferreira

As cicatrizes transpostas aos corpos nesse percurso poderão ser minimizadas com medidas sociais de educação e acesso a informações, além de esclarecimentos sobre a doença, conhecimento do corpo e acesso às redes de saúde, onde as mulheres poderão buscar atendimento.
Para tal, é preciso, a todo momento, questionar os efeitos sociais presentes na discursividade histórica do câncer. Desse modo, perante essa desorganização, a fim de criar novos movimentos, tanto no sujeito com câncer quanto naqueles que o cercam, é necessário criar nessa relação laços de identificação.
É preciso que o sujeito com câncer de mama se posicione como sujeito no momento vivenciado em razão da doença e que o outro estabeleça com ele uma relação de identificação tal que permita vê-lo não restritivamente como alguém que carrega uma doença, mas como um sujeito com singularidades como todos têm e são, deixando de ser significado apenas pela doença que nesse caso específico se marca no corpo, se expõe.  
Socialmente, a mulher é vista como um ser determinado a cuidar dos outros, pois, geralmente, é a pessoa designada para cuidar dos filhos, porque é ela quem os gera. A mulher passa a ter uma determinação social de guardiã passiva do bem-estar familiar e, às vezes, esquece-se de si mesma (FABRO; MONTRONE; SANTOS, 2008), conforme se pode verificar nos seguintes relatos:
Tô preocupada por causa do filho que ficou em casa, meu esposo está passando mal também, tô meio tensa, tô preocupada .... mais preocupada com eles (S1);
 
Mediante ao tratamento que me foi disponível, minha preocupação maior é com o filho menor que é adotado (S2);
 
Nesse período da quimioterapia eu já conscientizei mais, pois eu quero saúde e vida porque assim...por causa do meu filho , por causa de mim... né (S2);
(...) mas de me impedir de viver, curtir meus filhos. Fico muito assustada. (S21)
 
Essa determinação social, mesmo no embate que a resiste, é fortemente verificada no recorte seguinte de (S2):

(...) eu me mantinha de pé até a hora que ele ia prá escola, entendeu?! deitava depois; e (...) eu não tava saindo muito por causa que perdi a sensibilidade nos pés e nas mãos então tava dificultando eu andar (...) ele falou assim (...) oh, mãe, eu tô tão feliz, tão feliz, sabe por quê? Porque você tá podendo sair comigo (...). Eu tento reagir por mim mesma. Um ano atrás também tive que cuidar do meu irmão que também estava com câncer, então eu abracei a causa. Por um lado, também foi uma reciclagem na minha vida totalmente diferente (...) pois comecei a cuidar mais de mim (...) antes eu cuidava só dos outros.