Revista Rua


Você gosta de livro? Você é um intelectuário? Você é uma traça? Então aqui não tem nada da sua conta.
Do you like books? Are you an intellectual? Are you a bookworm? Then, that?s not your business anyway

Luisa Dias Brito

Aprender está para o rato no labirinto, está para o cão que escava seu buraco, está para alguém que procura, mesmo que não saiba o que e para alguém que encontra, mesmo que seja algo que não tenha sido procurado. E, neste aspecto, a aprendizagem coloca-se para além de qualquer controle (GALLO, 2008, p.66).
 
Por vezes, os movimentos são pequenos, os deslocamentos são quase imperceptíveis, mas, nem por isso, menos potentes: “é aquele momento em que você diz a si mesmo entre um suspiro e outro “nunca esquecerei esse momento”. Nessa pausa é possível lamber a vida e seus sulcos de claridade que antecedem tal fala e pensamento (...)” (MALASPINA, 2011b). Como colocar em palavras essas pequenas, quase imperceptíveis, revoluções pelas quais se passa ao entrar em contato com uma obra, mas que nos transforma por completo?Não é mais possível pensar/sentir do mesmo jeito, a realidade não é mais a mesma: tecem-se outras possibilidades de ser e de existir. “De tal maneira tudo na sua boca ficava bonito, transmudado em brilho, pérola de água em folha de taioba. Seu Donga parece que come lagarta e arrota borboleta, um mais imaginoso dizia”(DOURADO, 2000, p.8)
 
“Você é um intelectuário?”
Vale do Javé, povo Javélico, histórias contadas e recontadas. “E um dia elas vieram... as águas”. Águas que varrem, que correm, que produzem lembranças, e lavam esquecimentos. O progresso engole as terras adquiridas nas divisas cantadas. As águas afogam a terra apalavrada. A energia elétrica se faz necessária.
– Os engenheiros abriram os mapas na nossa frente e explicaram tudinho nos pormenor. Tudo com os número, os fato, um tantão deles! E explicaram pra gente os ganho e os progresso que a usina vai trazer. Vão ter que sacrificar uns tantos pra beneficiar a maioria. A maioria eu não sei quem são, mas nóis é que somos os tanto do sacrifício, né não, Zaqueu?
– Os homens disseram que só não inundam quando a cidade tem alguma coisa importante, história grande. Quando é coisa de tombamento, e aí vira patrimônio. Aí ele não mexe nela.
– Ih, porra! Então, danou-se! Esse lugar velho não vale o que o gato enterra.[3]
 
Enredada e acompanhada pelos habitantes dessa terra longínqua, convido o leitor para, junto a outras obras, viajar, perambular e escavar possibilidades para (re)pensarmos a condição de ser humano e as relações estabelecidas com a natureza.


[3] Diálogo extraído do filme Narradores de Javé (2003).