Revista Rua


Poesia: línguas, sentidos, prazeres
Poetry: languages, senses, pleasures

Thalita Miranda Gonçalves Sampaio

É nesse aspecto que tomamos a noção de metáfora, como um deslizamento de sentidos que se dá não por mera substituição de uma palavra por outra, mas sim, por sentidos que se formam a partir de outra materialidade simbólica, que não são os mesmos produzidos pelos significantes anteriores.
Segundo Pêcheux (1990), “todo enunciado é intrinsecamente suscetível de tornar-se outro, diferente de si mesmo, ao deslocar discursivamente de seu sentido para derivar para um outro” (PÊCHEUX apud MARIANI, 2007, p. 15). Para Mariani (2007), “É nisso que consiste o processo metafórico, é nessa possibilidade de haver deslocamento dos sentidos. Falar sobre metáfora, então, é falar sobre deslocamento e sobre sentido. Os sentidos existem nas relações de metáfora”. Desse modo, podemos perceber que a metáfora se dá pela possibilidade da polissemia.
As composições de Zeca Baleiro dão visibilidade à metáfora, mobilizando simultaneamente sistemas lingüísticos distintos. Nesta injunção de sentidos, entre os diferentes sistemas simbólicos, é possível compreender o jogo significante, como retratado na 6ª estrofe da música Babylon (2000):
 
(...) De tudo provar/ Champanhe, caviar/ Scotch, escargot, rayban/ Bye, bye misere/ Kaya now to me/ O céu seja aqui/ Minha religião é o prazer...(...)
 
            Esta estrofe mobiliza um jogo de fonemas na palavra Kaya, presente no verso Kaya now to me, não apresentando, tal palavra, tradução do inglês para o português. No entanto, produz sentido não pela tradução do termo. O verso /Kaya now to me/ juntamente com o verso subseqüente /O céu seja aqui/ põe a palavra kaya como um convite para ir ao céu /Kaya now to me/ O céu seja aqui/e pode ser lido como: /caia agora em mim porque o céu é aqui/. Esse tipo de jogo com as palavras se dá porque a língua constitui-se do poético pelo jogo metafórico, fazendo com que o signo apresente-se arbitrariamente, em relação ao significado e ultrapassando os sentidos convencionais da relação significante/significado.
O verso /kaya now to me/, no modo como é pronunciado articula o termo Kaya com o subseqüente now, que formarão a fonética da palavra anal. Esta estrofe faz jogo com as palavras que instituem lugar de prazer /Kaya now to me/ O céu seja aqui/ Minha religião é o prazer/, visto que os sentidos na música apontam para uma desconstrução daquilo que é historicamente já dado. Essa composição mobiliza um novo modo de significar a língua poética no jogo da relação entre a paráfrase e a polissemia.