Revista Rua


Do Repetível ao Historicizado: Notas Sobre uma Prática de Sentidos
(From the Repeatable to the Historicized: Notes About a Practice Of Senses)

Rejane Maria Arce Vargas

importância ímpar para os sujeitos autores dos textos, uma vez que faz a ligação entre duas vilas e possibilita o acesso à escola. A melhoria da ponte, outrora de madeira e em tal mau estado que impossibilitava o tráfego de ônibus, foi objeto de reivindicações, da qual esses sujeitos participaram ativamente, marcando essa atuação por meio de sua escritura. Este referente está atrelado à luta por sua efetivação e, nesse sentido, aparece como objeto de ações: passeatas, protestos, mutirão, abaixo-assinados etc. Tais nomeações reivindicam uma tomada de posição dos sujeitos, asseveram um comprometimento com o dizer, o que ganha mais ênfase quando analisadas em relação aos verbos a que estão atreladas. Os verbos fazer, conseguir, lutar, participar circundam ações nas quais os sujeitos insistem em se fazer agentes, ao comprometerem seu dizer com sua práxis, por meio de um fazer que encontra efetividade no social e se inscreve na língua. Desse modo, podemos vislumbrar nessa discursividade a injunção ação (em nível simbólico) – discurso, de tal forma a sublinhar que a ação precisa do discurso para que o sujeito se insira nessa prática[1], tome a palavra, legitimando sua ética, marcando sua entrada no simbólico.  O sujeito não tem controle sobre o modo pelo qual a língua tece seus efeitos sobre ele, contudo, há sempre possibilidades de resistência. E, nesse hiato, a categoria pronominal ‘eu’ vem a refratar a sobredeterminação dos sentidos que poderiam engendrar um apagamento do sujeito, ao passo que ‘nós’ pode vir tanto a referendar o caráter de coletividade e uma ética do comunitarismo (por meio de um eu plural), como também, inversamente, pode vir a anular a singularidade, na medida em que o ‘nós’ são ‘todos’ (a comunidade) e o ‘todos’ são ‘nenhum’ (em sua individualidade e possibilidade de singularização).
A repetibilidade da designação ‘ponte’ nos textos é emblemática, bem como a relação eu/eu-plural assoma-se a ela de igual forma, o que nos leva a compreender a escola como lugar privilegiado das ‘pontes’, do desejo de que elas sejam estabelecidas, lugar de embate dos discursos em circulação e lugar da potência do sujeito, do devir, pois diante do já-lá há uma história que se insurge determinante, indicando que há sítios significantes para além da ponte.


[1] Neste trabalho, quando nos referimos à prática, estabelecemos forte vínculo com a ressalva feita por Orlandi (2006: 04): “E guardei rigorosamente a distância teórica que vai da pragmática (interação) e a análise de discurso que pratico e que tem outros princípios. Na análise de discurso o que procuramos entender é a linguagem enquanto prática social simbólica (o que é muito diferente de “interação”)”. Grifo nosso. Orlandi em entrevista a Raquel Goulart Barreto.