Revista Rua


Vagabmundear pensamentos - ciência e loucura e arte
Vagabond thinking - science and art and madness

Susana Oliveira Dias

Cena 1 – Narradores de Javé – eliane caffé (2003)
 
           
Aconteceu no Vale do Javé…
            Era uma vez um Papel em que se agitavam Riscos, Luzes, Cores e Sons como partículas de poeira dançantes. Queria que fosse só isso. Mas havia uma grande obsessão. Era preciso produzir O sentido. Inventar A grande história e derramá-la sobre a superfície do tempo, criando uma mancha sedentária. A síndrome do patrimônio da humanidade acometia o vale. Escrita deveria criar uma tatuagem na pele da Memória e encenar e acenar com um testemunho-Salvação.
            Mas Escrita perde o barco. Decepciona. Prefere não. Era muito falsa. Criava cartas sem correspondência nem conformidade com o mundo visível e vivível. “Não havia... suficientemente irreal que lhe servisse de modelo”, diria marguerite youcenar (1996) se a encontrasse. Entre ela e o mundo havia uma disjunção, uma fenda, uma fresta. Em vez de divulgar as verdades, divagava em ficções. Palavras bêbadas, abandonadas, sujas, mal rebocadas, descascadas, que, para Ciência, a nada levavam, só queriam encher linguiça, florear os acontecidos. Escrita traía. Não dava para confiar naquilo que nasce depois de morrer. Era uma louca que precisava ser domada e controlada para ser útil, para servir aos propósitos.
            Um dia, agarraram-na pelos braços e a arrastaram pela vila, levando-a à presença da Verdade, da Memória e da Razão… “Cortem-lhe a cabeça” gritaria satisfeita a rainha de copas (CARROL, 2009) nesse momento, se por lá perambulasse assim, como quem não quer nada. Foi julgada, condenada e ameaçada de ser escorraçada se não cumprisse