Revista Rua


Consumo, Espaço e Memória
Consumption, public space and memory

Guilherme Carrozza e Andrea S. Domingues

 

possibilitam pensar num movimento que metaforiza o crescimento daquele povoado, que se dá num espaço de tempo de 50 anos, até atingir o estatuto de “cidade”. Assim, não só estes fatos anteriores, mas, principalmente, o que se segue a partir da sua emancipação política, constituem um tecido de dizeres que veio produzindo um determinado sentido para a cidade de Pouso Alegre e sua avenida principal, em particular.
O corpus desta pesquisa é constituído de alguns documentos históricos, fotos e matérias de jornais e revistas que nos apontam para enunciados que, pela repetição, produzem um efeito de série (PÊCHEUX, 1999) que inicia uma “regularização” (cf. ACHARD, 1999). Vale lembrar que tanto Pêcheux, quanto Achard, ao se referirem às noções de “efeito de série” e de “regularização” estão pensando na questão da memória e dos implícitos – os pré-construídos, elementos citados e relatados, discursos-transversos etc. – ou seja, na “condição do legível em relação ao próprio legível” (PÊCHEUX, idem). E é Pêcheux quem ainda chama a atenção para o fato de que essa regularização discursiva “é sempre suscetível de ruir sob o peso do acontecimento discursivo novo, que vem perturbar a memória.” (p. 52). Para ele, no acontecimento, há sempre o jogo da memória, ou produzindo a manutenção da regularização pré-existente com os implícitos que ela veicula”, ou seja, numa espécie de “negociação” da integração do acontecimento, ou trabalhando numa “desregulação” que vem “perturbar a rede de implícitos” (p. 53).
Gostaríamos de mobilizar tais afirmações de Pêcheux face a uma questão que tem a ver com o espaço e com aquilo que pode caracterizar uma relação dos sujeitos de uma determinada cidade com o que poderia ser considerado seu “centro”. Nosso foco está na compreensão de como, pela história de acontecimentos, um determinado espaço se constitui como o “local onde tudo se encontra”, “onde tudo acontece”.
Antes, porém, é importante destacar que o trabalho com arquivos históricos possibilita-nos a construção de um arquivo – no sentido em que o entendemos na Análise de Discurso – sobre a cidade de Pouso Alegre, que nos permite uma leitura calcada na materialidade dos acontecimentos que a constituíram em determinado modo. Trata-se de pensar, como já foi demonstrado por Guilhamou e Maldidier (1997), na forma como se pode distinguir “o horizonte de expectativas – o conjunto de possibilidades atestadas em uma situação histórica dada – e o acontecimento discursivo que realiza uma dessas possibilidades, inscrito o tema em posição referencial.”(p. 165-166)