Revista Rua


Consumo, Espaço e Memória
Consumption, public space and memory

Guilherme Carrozza e Andrea S. Domingues

 

É interessante perceber essa “vocação[6]” da cidade para o crescimento e progresso, já no ano de 1900. E quando falamos aqui em vocação, pensamos num efeito de sentido produzido por um dizer sobre a cidade, como que “destinada” já a se tornar grande, seja por suas “riquezas naturais”, seja porque cresce “de ano a ano”.
Os recortes apresentados apontam para a cidade de Pouso Alegre como aquela que, pelas suas características, está preparada para receber “o elemento estrangeiro”. Esse sujeito de fora, porém, não viria de qualquer modo. Viria por que lá havia um ambiente favorável para que ali se instalasse e prosperasse.  Há, dessa forma, uma “naturalização” do “destino” da cidade, como a que terá, um dia, sua época de prosperidade. Esse ambiente favorável se constituiria, portanto, na possibilidade da produção e do consumo e comercialização daquilo que seria produzido.
 
_ Cultiva-se na frequezia da cidade a canna, o fumo, o café e toda especie  de cereaes; exporta-se, além destes productos, polvilhos, farinha,, queijos, gallinhas, gado e cevados.” (Alamanack, p. 93, 94)
O commercio de Pouso Alegre é bastante animado, e gosa de muito conceito na praça do Rio de Janeiro e na de S. Paulo, com as quaes tem suas transacções mais importantes.” (Almanack, p. 94)
(...) Anterior à chegada da ferrovia, a comunicação entre Pouso Alegre e centros mais adiantados era feita por duas velhas estradas, onde viajantes cruzavam as distâncias a cavalo, tropas de burro, trole, carroça ou carro de boi, levando passageiros ou cargas. A cidade vivia praticamente isolada e longe do progresso. A construção da ferrovia em 1895 marcou uma nova era para a história, trazendo novas perspectivas para Pouso Alegre e região. (Painel do Museu Histórico Tuany Toledo) (grifos nossos)
 
Dos recortes analisados, podemos perceber uma série se formando em torno do crescimento e da prosperidade que estabelecem, de forma indireta, correlações entre a produção e o consumo da cidade.
a)   Crescimento se liga a “comércio”, à própria cidade e a outras, como São Paulo e Rio de Janeiro;
b)     Prosperidade se liga a “elemento estrangeiro”, “industrial (produção)”;
c)     Progresso se liga a “comunicação”, “centros mais adiantados”, “novas perspectivas”.
A estação de trem, construída em 1895, parece representar um acontecimento marcante na história da cidade, produzindo um efeito de abertura de fronteiras, que viria possibilitar de forma eficaz o progresso da cidade, já que antes disso, ela se encontrava “isolada e longe dele”. Podemos pensar que esse acontecimento inaugura novas


[6] Estamos utilizando o termo “vocação” aqui, procurando mesmo fazer um jogo com os sentidos, seja de no sentido de “estar destinado a”, seja no sentido de que “alguém chama”.