Vale observar que, nessa perspectiva, a fragmentação sugerida pelas tomadas externas iniciais, que retratam o cotidiano da favela, e as sequências do camarim, vai ser retomada, de forma invertida na sequência final do clipe, quando a viela será novamente mostrada. O gari leva a lixeira nas costas, os cachorros latem e vozes ecoam na distância. O efeito de sentido obtido no corte abrupto na montagem do vídeo, tanto no início, quanto no final, sugere a irrupção de um acontecimento extraordinário, talvez um sonho, que chega ao fim depois de interromper e congelar no tempo o cotidiano e o vaie vem dos moradores.
Concluindo
No vídeo que examinamos, a janela de que se olha a favela se abre para se dar a conhecer a quem não está nela. O verbal, o imagético e a melodia do samba operando na incompletude que lhes é constitutiva compõem, na imbricação de suas materialidades, um discurso marcado pela contradição, pelo equívoco. A favela é ressignificada para um outro olhar, o olhar de quem está de fora. Orientado por uma visão configurada ideológica e politicamente, o clipe transforma em espaço de convivência, cultura, lazer e consumo lugares pré-configurados nos mapas do imaginário do asfalto como espaços de pobreza, privação e criminalidade. Mesmo havendo um deslocamento nessa reconfiguração do imaginário urbano, o clipe não repete o discurso da inclusão e da integração nem procura a adequação às formas dominantes da cultura. Pelo contrário, embora os efeitos de evidência sugiram esta adequação, o funcionamento do processo discursivo e os efeitos de sentido dele derivados são marcados pela resistência à cultura dominante.
Referências Bibliográficas
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