Revista Rua


Cidade Maravilhosa e Cidade Partida: notas sobre a manipulação de uma cidade deteriorada
Wonderful City and Divided City: Notes on the Management of Spoiled City

Aline Gama de Almeida, Alberto Lopes Najar

Favela: entre Maravilhosa e Partida
 
Historicamente, a ocupação de morro por habitações populares não foi desde sempre chamada de favela. Estudos sobre a cidade mostram que as primeiras construções em morros no Rio de Janeiro datam do ano de 1881. Imigrantes portugueses, espanhóis e italianos povoaram a Quinta do Caju, a Serra Morena e a Mangueira, que ficava na encosta do Túnel Velho do lado de Botafogo (ABREU, 1994).
As transformações ocorridas na cidade na segunda metade do século XIX devem-se ao declínio da atividade cafeeira, fim do sistema escravista, surto de industrialização e à vinda de imigrantes estrangeiros. Tais mudanças tiveram como algumas de suas consequências o aumento populacional e a questão da habitação. Na comparação entre os censos de 1872 e 1890, observa–se um aumento de 90% da população residente que passa de 274.972 para 522.651 (ABREU, 1987).
 O nome “favela” surge nessa época e teve sua origem no Morro da Favella, onde soldados da Guerra de Canudos se instalaram com suas famílias, em 1897, com a permissão do Ministério da Guerra. Os soldados vieram para o Rio de Janeiro, então capital federal, em busca de seus honorários (ABREU, 1987 e VALLADARES, 2005 e 2000). São duas as explicações para essa denominação do Morro da Providência. A primeira é a existência neste morro da mesma vegetação que cobria o morro da Favella no Município de Monte Santo, na Bahia. A segunda relaciona o papel de resistência representado na Guerra de Canudos pelo morro da Favella de Monte Santo, que retardou o avanço final do exército da República sobre o Arraial.
Abreu (1998) e Valladares (2005) atribuem a importância da Guerra de Canudos ao livro “Os Sertões”, de Euclides da Cunha (2000). Grande parte dos intelectuais brasileiros do início do século XX leu a obra, que foi considerada por muito tempo o livro “número um” do Brasil, com mais de 30 edições em português que se sucederam desde a primeira, em 1902, pela Editora Laemmert.
“Os Sertões”foi responsável pela Guerra de Canudos não ter caído no esquecimento na história da Primeira República, como também pela primeira construção da representação de um tipo de habitação que começa a ser conhecida e chamada por favela. Além de diversas vezes descrever os trâmites da guerra ao redor da Favela de Monte Santo, ocupada pelo acampamento de soldados, Euclides da Cunha como narrador primoroso atribui valores ao lugar: “era o lugar sagrado, cingido de montanhas, onde não penetraria a ação do governo maldito. A sua topografia