Revista Rua


Cidade Maravilhosa e Cidade Partida: notas sobre a manipulação de uma cidade deteriorada
Wonderful City and Divided City: Notes on the Management of Spoiled City

Aline Gama de Almeida, Alberto Lopes Najar

interessante modelava–o ante a imaginação daquelas gentes simples como o primeiro degrau, amplíssimo e alto, para os céus...” (CUNHA, 2000, p.92).
             A imagem da favela apresentada em “Os Sertões” começa a ser atribuída à ocupação em morros e ganha adesão por cronistas, músicos e jornalistas do início do século XX. Aos poucos os termos “morro” e “comunidade” são associados à favela, como nomes que também definem o tipo de ocupação do espaço pela habitação popular.
No entanto, as imagens fotográficas de Augusto Malta[6], fotógrafo do prefeito Pereira Passos, mostram que a favela do início do século XX não contrastava em nada com o restante da paisagem. A cidade ainda é a São Sebastião do Rio de Janeiro, herdada dos tempos coloniais. As ruas são estreitas, barrentas e entulhadas de carroças. A circulação de mercadorias e pessoas ainda é desordenada. As edificações são escassas e inadequadas às novas necessidades de moradia da população em crescimento. A proliferação de doenças relacionava–se diretamente às catastróficas condições de higiene, às quais grande parte da população estava submetida. O papel dos médicos junto ao poder público foi determinante para que mudanças fossem feitas. Influenciados pelas teorias médicas francesas, os médicos estabeleceram medidas de cuidados com a cidade, que implicaram em desinfecção de locais públicos, drenagem dos pântanos e intervenção sobre as habitações consideradas anti–higiênicas.  
Os cortiços do Rio de Janeiro, mais do que as favelas, eram o motivo de preocupação na época e podem ser considerados o “germe” da favela. Valladares (2005) e Abreu (1998) estabelecem uma relação entre as demolições dos cortiços do Centro e a ocupação ilegal dos morros no início do século XX.
Outra fonte literária importante é a obra “O Cortiço”, de Aluísio de Azevedo (2000), publicado em 1890, com descrições do modo de habitar e da autoconstrução de moradias populares no Rio de Janeiro.
 
Tábuas, tijolos, telhas, sacos de cal”– adquiridos em pequenos furtos de obras – “Hoje quatro braças de terra, amanhã seis, depois mais outras, ia o vendeiro conquistando todo o terreno que se estendia pelos fundos da sua bodega; e, à proporção que o conquistava, reproduziam-se os quartos e o número de moradores (AZEVEDO, 2000, p.3).
 
Assim descreveu Aluísio de Azevedo outro modo de viver e habitar o Rio de Janeiro pelos trabalhadores de baixa renda. O número grande de moradores e o aspecto


[6] Parte do acervo de Augusto Malta está no site: http://portalaugustomalta.rio.rj.gov.br/ . Outra parte está em processo de digitalização fotográfica do Museu da Imagem e do Som.