Revista Rua


O inglês na rua, na avenida, na cidade. Uma análise discursiva sobre a língua inglesa no espaço urbano brasileiro
English on the street, on the avenue, in the city. A discoursive analysis on the English language in the urban Brazilian space

Ilka de Oliveira Mota

Para corroborar esse sentido, lê-se, na parte superior, à direita do outdoor, o seguinte enunciado sobreposto ao desenho de uma estrela: “O mundo recebe você melhor”.
Vale perguntar: que mundo é esse que identifica o sujeito pela língua que fala? Quem pertence a ele? Quem fica de fora dele, ou melhor, quem é melhor/pior recebido? Assim, desse enunciado pode-se depreender o seguinte gesto de interpretação, qual seja, só se é bem recebido o sujeito que tem o conhecimento do Inglês ou, invertendo a lógica do enunciado, a falta de conhecimento desta língua não permite que o sujeito seja bem recebido em seu próprio país.
Trata-se de um mundo em que não há espaço para quem não fala Inglês. Um mundo para o qual só se é reconhecido pela língua inglesa. Reiteramos, pelo Inglês, não pela língua oficial, no caso a língua portuguesa. Somente a partir da língua do outro (o Inglês), é possível ser reconhecido dentro de seu próprio país, em sua rua, na avenida por qual passa.
Não há igual direito e/ou tratamento ao sujeito que fala e ao sujeito que não fala. Isto é, falar o Inglês ou não falá-lo é estar afetado pelas divisões que caracterizam o espaço de enunciação da língua inglesa. Divisão esta que distribui desigualmente os falantes segundo os níveis de conhecimento desta língua.
Noutros termos, para ser reconhecido é preciso, pois, que o sujeito enuncie do lugar da língua inglesa, língua esta legítima e autorizada. Assim, embora todos “sejam iguais” perante o discurso da igualdade, o sujeito que não fala o Inglês não tem o mesmo direito de ocupar o mesmo espaço que aquele que fala. Trata-se de espaços diferentes que esta ou aquela língua podem permitir, espaços de reconhecimento e não reconhecimento. Portanto, como bem formula Pfeiffer (2001, p. 32), “não basta estar na rua para se ocupar um espaço, bem como não basta estar na língua para se estar autorizado a falar e ser significado como autor daquilo que fala”. Em nosso caso, falar a língua portuguesa não basta para tornar o sujeito reconhecido. A posição autorizada para se produzir a visibilidade de sua ocupação é estar na língua autorizada, qual seja, a língua inglesa.
Dentro desse gesto de interpretação que significa a língua inglesa como lugar do reconhecimento, da legitimidade, pode-se afirmar que o sujeito que não se encontra inscrito na discursividade do Inglês é significado no lugar da ilegitimidade, do erro, do atraso, enfim, daquilo que pode estar subsumido no sentido de ignorância. Portanto, falta de conhecimento ou não falar o Inglês ressoa em atraso, desprestígio, deslegitimização.