Revista Rua


A produção dos sentidos da nacionalidade: um estudo sobre práticas discursivas na Primeira República
The production of the nationality senses: a study about discoursive practices in Brazilian First Republic

André Luiz Joanilho, Mariângela Peccioli Galli Joanilho

A individualização de uma entidade vivente
 
Essas modificações no campo da biologia, isto é, na compreensão da transmissão da doença, a identificação do seu vetor, e na compreensão da reprodução do micróbio, trazem profundas alterações na concepção de sujeito. Lembro que trabalhamos com uma compreensão de indivíduo que não é apenas jurídica, e sim numa compreensão mais ampla que abarca definições biológicas, e “de facto, não se pode definir a individualidade biológica sem definir a vida [...]. Para definir o que é uma entidade vivente, é preciso uma caracterização da sua organização e não da sua estrutura. O facto de sermos capazes de falar de bactérias e de cães como se fossem seres vivos mostra que se pode descrever uma organização dessas”(VARELA, 1988, p.106). 
Partindo desta concepção, a de individualização de uma entidade vivente, entendemos que a biologia compreende como individualidade biológica o ser humano, logo, numa formação discursiva, como a que estamos abordando, não se isola o indivíduo dum meio, sendo este veículo para a ação da entidade biológica, no caso, o ser humano, ou ainda, a compreensão de um micróbio.
Daqui podemos compreender as profundas transformações por que passam as concepções biológicas na virada do século. Elas trazem uma nova leitura do indivíduo, pois o compreendem não como uma entidade jurídico social, e sim como uma entidade biológica. De um ser configurado pelo ambiente, a um ser utilizando o ambiente como meio para a sua ação. É no início deste século que: “novos conceitos e práticas médicas serão colocados em vigor. A epidemiologia e a profilaxia serão tratadas sob outros prismas e com isto a administração dos problemas de saúde envolverá outros agentes” (LUZ, 1982, p. 85).
Então, passa-se rapidamente:
 
de uma medicina social em sua vertente urbana, voltada ao controle do contato desordenado que o caos da vida na cidade propiciava, substituída pelo controle do vetor da febre amarela. Abandonavam-se os resquícios da teoria dos miasmas que ainda haviam no modelo de intervenção sanitária [...], e em lugar de um complexo de medidas de saneamento urbano, para o controle da circulação do ar e da água, e da quarentena dos doentes, com seu isolamento nos lazaretos, adotava-se em sua plenitude o modelo bacteriológico(TELAROLLI JÚNIOR, 1996, p. 119).