Revista Rua


A periferia de São Paulo: revendo discursos, atualizando o debate
The periphery of São Paulo: resells discourses, updating the debate

Érica Peçanha do Nascimento

operacional ou relacional, buscando fugir de generalizações que o empreguem como sinônimo de segregação espacial, social ou econômica.
Novamente segundo Frúgoli Jr., torna-se necessário pensar novas perspectivas teóricas e recortes analíticos que ajudem a explicar não só a produção socioespacial, mas também o processo que nela culminou, sem desconsiderar, entretanto, a atuação de movimentos culturais juvenis – como o hip hop –, que “por meio de elaborações estéticas articulam uma espécie de singularização da periferia cuja novidade consiste na representação local ou nativa, e não ‘de fora para dentro’” (2005, p. 114).
Há mais de vinte anos mesclando produção cultural e engajamento político, os artistas ligados ao hip hop despertaram o interesse acadêmico por terem sido pioneiros em produzir, coletivamente, discursos[2] sobre a periferia a partir de interpretações dos mecanismos de marginalidade social e imprimi-los nas artes plásticas, na dança e na música. Portanto, ao mesmo tempo em que essa estetização do espaço e cotidiano periféricos resultou em um discurso homogeneizante sobre práticas e problemas sociais que se traduziu na máxima “periferia é periferia em qualquer lugar[3]”, também trouxe à tona “certa visão propositiva segundo a qual ‘ser da periferia’ significa participar de certo ethos que inclui tanto uma capacidade para enfrentar as duras condições de vida, quanto pertencer a redes de sociabilidade, a compartilhar certos gostos e valores” (MAGNANI, 2006, p. 39).
Mas para além do hip hop, desde o início desde o final dos anos 1990 multiplicaram-se no espaço urbano brasileiro diferentes artistas, movimentos e grupos articulados em torno da periferia ou da favela, protagonizadas por sujeitos, jovens ou não, que relacionam sua atuação e produtos artísticos a tais espaços e procuram explorar diferentes linguagens artísticas (como a música, o teatro, o cinema, as artes plásticas e a literatura). Ou ainda, tal como afirmam Hollanda (2004) e Vianna (2006), dentre as tendências culturais emergentes na década de 2000, a afirmação das vozes da periferia, com sua beleza, inserção mercadológica e alto poder agregador, destaca-se como principal fenômeno.


[2] Os discursos são entendidos aqui nos termos de Foucault, isto é, “como práticas que formam sistematicamente os objetos de que falam” (1986, p.56). O interesse do autor recai sobre o contexto em que os discursos são produzidos, ou seja, os regimes de representação dentro dos quais o discurso adquire significação, torna-se plausível e assume eficácia prática, não interessando o seu teor de verdade.
[3] Expressão criada por GOG e popularizada em “Brasília periferia”; que, posteriormente, foi reproduzida por Mano Brown e Edy Rock, dos Racionais MC´s, em outro rap intitulado “Periferia é periferia”.